terça-feira, 16 de outubro de 2018

A PLURALIDADE TRAZ MAIS BENEFÍCIOS QUE A MAIORIA ABSOLUTA


A apresentação do Orçamento do Estado (OE) para cada ano constitui sempre um momento por excelência para comentários à medida de todos os gostos e o OE para 2019 não foge à regra.
Tendo em atenção que 2019 é um ano de eleições e, à falta de melhor crítica, a direita lança mão da mais fácil que é ser um OE eleitoralista. Pedro Filipe Soares (PFS), líder da bancada parlamentar do BE, parte deste tema para escrever um artigo de opinião que assina no “Público” de hoje mas também tece algumas críticas nomeadamente quando afirma que “este é o Orçamento de Bruxelas na parte em que o PS rejeitou libertar o país do peso da dívida e dos tratados que sufocam o Estado Social e a economia”. Leia-se pois, com atenção, o texto de PFS que transcrevemos do “Público”.

O Orçamento do Estado para 2019 é eleitoralista, diz-nos a direita em uníssono. O oráculo do país, Marques Mendes, anunciou numa das suas preleções semanais que este Orçamento “é o mais eleitoralista possível”. Rui Rio disse ter “temores que o Orçamento possa ter um perfil eleitoralista”. No Observador, os spin doctors do CDS são taxativos: “é eleitoralista, da mesma forma que o são todos os orçamentos de final de ciclo político”. Não há como escapar, se há algo que une a direita nos dias de hoje é o dedo em riste e o grito “eleitoralismo”.
O que entende a direita por eleitoralismo? O aumento das pensões que estiveram congeladas no tempo em que PSD e CDS estiveram no poder? Será a redução da fatura da eletricidade, no país que tem da energia mais cara da Europa? Serão os descongelamentos da administração pública após mais de uma década de perda salarial? Será a dignidade de acabar com a dupla penalização na antecipação da reforma para quem tem longas carreiras contributivas? Será a redução do valor máximo das propinas que, desde os tempos de Ferreira Leite, nunca tinham baixado sequer um cêntimo? É o aumento do salário mínimo nacional para 600 euros? São os passes que dão às famílias um verdadeiro acesso aos transportes públicos?
Podia continuar, mas a conclusão está à vista: a direita está em crise e sem projeto político para o país. PSD e CDS acusam de eleitoralismo qualquer Orçamento que melhore as condições de redistribuição da riqueza nacional porque não têm nenhum programa para além da austeridade perpétua. A troika deixou o país, mas a direita ainda não fez o seu luto. O projeto da direita resume-se ao verbo “cortar” e ao mantra do “vivemos acima das nossas possibilidades”. Por isso, esperavam o diabo em 2016, suspiravam pela pressão europeia em 2017 e desesperam com o desempenho da economia em 2018. Acima de tudo, temem chegar a 2019 com a realidade a provar que não era inevitável que os nossos filhos tivessem uma vida pior do que a nossa.
Mas há outras contas a fazer, particularmente na subserviência do PS às metas europeias de défice. É aqui que Pacheco Pereira tem razão quando nos diz manietados por Bruxelas e pela Comissão Europeia. Este é o Orçamento de Bruxelas na parte em que o PS rejeitou libertar o país do peso da dívida e dos tratados que sufocam o Estado Social e a economia. Mas há uma parte do Orçamento que resiste e afronta a burocracia europeia quando aumenta o salário mínimo nacional, reduz o preço da eletricidade, descongela carreiras, aumenta pensões, reduz o valor das propinas ou apoia desempregados de longa duração. No fundo, a parte em que o PS é obrigado a negociar e a ceder à esquerda.
O caminho feito desde 2015 demonstra que é possível redistribuir a riqueza, recuperar rendimentos do trabalho e combater a pobreza. No entanto, como já foi identificado, há fragilidades estruturais que se mantêm. A começar pela recuperação urgente dos serviços públicos. A obsessão do PS pelas regras europeias e as suas metas de défice travaram o investimento público que se afigura necessário em setores chave como a saúde, os transportes públicos ou a educação. Mas, olhando para o saldo final, a atual solução política resgatou a confiança no futuro, no progresso e isso não é coisa pouca. Em parte, isso explica o insucesso da extrema-direita no nosso país. Quando há esperança no futuro e espaço para o progresso social, a insegurança, a instabilidade e o medo recuam – o caldo de onde se faz o biótopo do radicalismo de direita.
No último Orçamento da legislatura há a tentação de nomear “quem teve as vitórias políticas mais importantes”. Para mim, a resposta é clara: foi o povo português. Que teve a coragem de não ceder a chantagens. Mostrou que todos os votos são úteis e que podem fazer a diferença na definição das políticas públicas. Provou-se que a pluralidade traz mais benefícios do que qualquer maioria absoluta. Uma lição que deve ser inscrita na história do país.

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