quarta-feira, 3 de julho de 2024

CITÇÕES À QUARTA (110)

 
Há cem anos, a política de fronteiras abertas (e os resquícios do trabalho escravo, mas isso é uma outra história) alimentou a pujança do império norte-americano em crescimento.

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Em 1950, entravam nos EUA, vindos do México, 450 mil trabalhadores temporários e 50 mil imigrantes permanentes.

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[Com o fim da imigração regular] disparou a entrada clandestina, indocumentada e precária.

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O ultraliberal Ronald Reagan, presidente nos anos 1980, falou de “ameaça à segurança nacional” e “invasores comunistas”.

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Quanto mais mexicanos pobres eram presos ao dar o salto, mais definitiva era a prova do crime. Mas continuaram a entrar.

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A política de militarização de fronteiras convive harmoniosamente com a entrada massiva de imigrantes sem documentos. A explicação é simples: a economia precisa deles.

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Milton Friedman, papa ideológico do neoliberalismo, proclamou-o urbi et orbi: “Imigração só é boa se for ilegal” – o Estado a embaratecer o trabalho.

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A ameaça da extradição e a cenoura do greencard são, assim, os elementos disciplinares sobre um exército cuja única “liberdade” é aceitar quaisquer condições.

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Este é o paradoxo das fronteiras fechadas: elas travam a saída quando o trabalho escasseia.

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Se há coisa que nós, portugueses, sabemos, é que ninguém atravessa duas ditaduras a pé para depois voltar para trás.

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Mesmo que sejamos impedidos de alugar um apartamento, humilhados pelo chauvinismo e perpetuamente destinados a serventes e porteiras.

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“Imigração ilegal” é o que acontece quando o Estado recusa acolher as pessoas que a economia convocou. 

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Luís Montenegro preferiu quebrar a regra de humanidade elementar que sustinha a lei portuguesa: quem cá vive e trabalha deve ser incluído na comunidade.

Mariana Mortágua, “Público” (sem link)

 

Foi no Alentejo, à conversa com um amigo, que ouvi o Fausto pela primeira vez.

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Fiquei instantaneamente devoto. Na cara do meu amigo notava-se aquele esgaçar malandro que surge inocente quando acertamos na muche.

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Morreu o criador de todas estas músicas, trilhas sonoras destas emoções e memórias que guardo com muitíssimo cuidado.

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Ontem, estas memórias fizeram questão em chegar todas de uma vez (sacanas), quando como em gesto de homenagem, passei o dia a circular os álbuns do alquimista musical que foi Fausto Bordalo Dias.

Tomás Palmeiro, “Público” (sem link)

 

O Governo prepara-se para alterar as regras do subsídio de desemprego

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Entre as razões de fundo para a mudança parece estar o temor de que as atuais regras de proteção contra o risco de desemprego incentivam o desemprego voluntário.

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Assenta numa distinção perigosa entre "bons" e "maus" desempregados.

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Historicamente, o desemprego tem sido pensado e construído enquanto categoria enraizada nas sociedades modernas, abrindo caminho para direitos.

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Nem todos os desempregados – muito longe disso – estão cobertos por qualquer subsídio de desemprego (…) como é o caso de muitos trabalhadores temporários, precários ou informais.

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Ciclicamente, alguns governos tendem a prestar maior atenção ao desincentivo ao trabalho, supostamente em resultado da concessão de um rendimento de substituição a quem está desempregado.

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Daí até a mudanças destinadas a reforçar as sanções contra os desempregados vai um pequeno passo.

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Olhando para as condições de elegibilidade, cobertura, duração e montantes (taxa de substituição face ao salário perdido), a verdade é que o nosso sistema não é excessivamente protetor.

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Contratar alguém cuja única ideia é sair o mais rapidamente possível para encontrar um emprego melhor e mais bem remunerado não é uma situação que se possa desejar.

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É importante um justo equilíbrio que não empurre os desempregados, em particular os de longa duração, para empregos sem qualidade, baixos salários, enfim, para qualquer emprego.

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Em certo sentido a seletividade do mercado de trabalho entra em contradição com a ideia de que todos os candidatos a emprego podem encontrar um emprego rapidamente.

Jorge Caleiras, “Público” (sem link)

 

É difícil pensar no pensamento jurídico e progressista nos EUA e não tropeçar no nome de Ruth Ginsburg. 

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Ginsburg ajudou a moldar o quadro legal e a visão cultural em matérias como igualdade de género, aborto, discriminação positiva e todo um sem número de direitos civis. 

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Mas o seu legado acabou manchado pela forma como abriu caminho a uma esmagadora maioria de conservadores.

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Impediu a nomeação de um juiz mais liberal e permitiu as três nomeações de Donald Trump.

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Se há lição que Ruth Ginsburg deixou evidente é que há um tempo para sair. 

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A primeira república da era moderna passou a ter, desde esta semana, um “rei acima da lei”.

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Esta decisão é consequência da teimosia de alguém a quem se deve muito, mas não soube que era tempo de dar lugar a outros.

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O que assistimos na última quinta-feira, no debate entre Biden e Trump, também.

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 Como é possível que (…) a maior potência mundial tenha de escolher entre aqueles dois candidatos?

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Na quinta-feira, assistimos a um debate entre um idoso sério e frágil e uma criança maldosa e mentirosa.

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Donald Trump rebentou com o polígrafo. A CNN detetou, só naquele debate, 30 alegações falsas. 

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O debate teve o nível de sofisticação de uma conversa dirigida a crianças de seis anos.

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Para quem viu o debate, por mais doloroso e cruel, por mais que o confronto fosse entre um canalha e um Presidente, ficou difícil acreditar que Joe Biden conseguirá fazer uma campanha inteira, quanto mais um mandato. 

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De tal forma, a poucos meses das eleições, se começou a perguntar se Biden devia desistir.

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O problema já não é apenas a catástrofe que leva à pergunta, mas a própria pergunta.

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Trump nem teria de fazer campanha. 

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[A substituição de Biden] conseguiria um feito: transformar Trump num símbolo de estabilidade.

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A questão é como é que os democratas não perceberam há mais tempo que a recandidatura de um homem de 81 anos muitíssimo fragilizado era um risco brutal.

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E bastava ter dito a Biden que o seu tempo tinha passado.

Daniel Oliveira, “Expresso” online (sem link)


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