quarta-feira, 31 de agosto de 2011

PORTAGENS AFASTAM TRÁFEGO

A cobrança de portagens nas antigas SCUT é feita desde 15 de Outubro de 2010.
Segundo dados vindos a público há dois dias, estas vias perderam, num ano, em alguns casos, até 50% do tráfego que tinham no primeiro trimestre de 2010. É o caso da A25 e da A29 que registaram, no espaço de um ano, uma quebra total de 52% no tráfego. Há outros exemplos em que os valores não são tão altos mas, na generalidade, verifica-se que os utentes das ex-SCUT recusam despender valores tão elevados como os que estão a ser exigidos para as portagens. Torna-se incomportável para quem necessita utilizar aquelas vias diariamente ter mais uma despesa fixa.
De qualquer maneira, pelo que se vê, a introdução de portagens nas ex-SCUT acaba por ser um semi-fiasco para os que defendem esta solução. A galinha dos ovos de ouro não funciona como esperavam…
Se tivermos em conta o desgaste dos veículos, o aumento do gasto de combustível, o crescimento do número de acidentes e as perdas de tempo com a utilização das estradas normais, é o país que fica a perder.
Esta notícia que agora chega até nós vem acrescentar razão àqueles que lutam contra a introdução de portagens na Via do Infante. Quem necessita de a utilizar diariamente vai sofrer mais um rombo na carteira se não quiser arriscar meter-se no inferno em que vai tornar-se a 125.
A alternativa é usar todas as formas de luta legais para impedir que os algarvios e todos os que visitam o Algarve sejam alvos de mais um imposto injusto. Aliás, é bom não esquecer que a construção da Via do Infante foi financiada de forma diferente da das restantes SCUT, como não é demais repetir.

Luís Moleiro

terça-feira, 30 de agosto de 2011

JUSTIÇA FISCAL A SÉRIO

A proposta de um imposto sobre as grandes fortunas é uma velha causa das forças partidárias à esquerda do PS. Tão velha que acabou por ser metida na gaveta a aguardar melhores dias, depois de ser violentamente atacada por todos os defensores da doutrina neoliberal vigente (infelizmente não cabem aqui apenas os partidos da direita clássica).
Eis que, contra todas as expectativas, aparece um dos homens mais ricos do mundo, Warren Buffett, a reconhecer, talvez de uma forma hipócrita, que não há razão para os muito ricos pagarem impostos mais reduzidos que a classe média e os mais pobres. É uma situação de tremenda injustiça social que vem sendo alimentada com desculpas pífias dos mais ferozes adeptos do neoliberalismo.
De qualquer maneira, depois de alguma estupefacção, numa manobra de puro marketing político, aparece em França um grupo de multimilionários disponível para pagar uma “contribuição excepcional” que ajude o Estado a ultrapassar as actuais dificuldades financeiras.
Só que, o que se pretende não é uma esmola para o Estado, por uma vez, sem exemplo, mas, uma verdadeira justiça fiscal.
A direita sente muitas dificuldades em argumentar em defesa dos milionários. Então, agarra-se à alegação de que o que a esquerda pretende é castigar os ricos, apesar de estes terem atingido os píncaros por mérito exclusivo. Ora, todos sabemos que muita riqueza é adquirida à custa da mais variada “batota” e é essa “batota” que tem de ser banida através de regras fiscais claras e justas que, como afirma hoje no “Público” José Vítor Malheiros “visem criar aquele level playing field de que os ricos falam mas que abominam acima de tudo porque estão habituados a ser tratados com mimos, a ser beneficiados nos negócios, a ser privilegiados pelos governos, obedecidos pelos legisladores, perdoados pelos tribunais, a comprar mais barato que os pobres, a comprar os favores que não lhes são oferecidos, a pagar menos impostos, a que lhes ofereçam os terrenos públicos para construir as suas empresas, a que lhes perdoem as dívidas, que lhes facilitem uns concursos públicos, que se abram excepções na lei para lhes permitir enriquecer mais ainda, que lhes urbanizem uns terrenos rurais, que lhes facilitem uns trâmites. O que nos irrita nos ricos é a batota. Que não cumpram as regras que querem impor aos pobres. Que fujam ao fisco, que finjam que as suas empresas são holandesas, que jurem que não têm contas na Suíça. O que nos desagrada nos ricos é que roubem. Que nos roubem os impostos, os recursos públicos, o Estado. Não queremos empobrecer os ricos. Queremos é fazer deles pessoas honestas.”
Será assim tão difícil?

Luís Moleiro

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

GRANDE TORMENTA

A BARCA DO EURO NAVEGA EM MARES AGITADOS. RESTA SABER QUEM SE AFUNDARÁ PRIMEIRO: OS EUA, OS PAÍSES MAIS EXPOSTOS DA UE OU A PRÓPRIA MOEDA COMUNITÁRIA.

O ABUSO TEM LIMITES

O artigo de opinião que São José Almeida assina na edição impressa do “Público” de ontem – e que a seguir transcrevemos – merece a mais ampla divulgação e uma leitura atenta porque refere e comenta de forma desassombrada a reflexão de um jornalista assumidamente conservador “sobre o estado a que chegaram a política e a sociedade ocidental”. Ele tem consciência de que, um dia destes, o povo, farto de ser enganado e espoliado, vai pedir contas aos “donos do mundo” sobre os criminosos níveis de injustiça social que estamos a atingir. O que vier a seguir ninguém imagina.

Silêncios lamentáveis
"Levei mais de 30 anos a colocar-me esta questão, mas esta semana entendo que tenho de o fazer: Terá a esquerda razão, apesar de tudo? Vejamos: um dos grandes argumentos da esquerda é que aquilo a que a direita chama "mercado livre" é actualmente uma armadilha.
Os ricos dirigem um sistema global que lhes permite acumular capital e pagar o preço mais baixo possível pelo trabalho. A liberdade que daí resulta aplica-se apenas a eles. A maioria tem de trabalhar mais, em condições cada vez mais inseguras, para enriquecer a minoria. A política democrática que se propunha enriquecer o maior número possível está agora no bolso dos banqueiros, dos barões da comunicação social e outros magnates que dirigem e possuem tudo."
Os dois parágrafos que acabam de ler são, como indicam as aspas, uma citação. São o arranque de um texto de opinião de Charles Moore, prestigiado jornalista britânico e biógrafo oficial de Margaret Thatcher, que foi editor do The Spectator (1984-90), do The Sunday Telegraph (1992-95) e do The Daily Telegraph (1995-2003), publicado no seu Telegraph online a 22 de Julho, na sequência do escândalo das escutas do News of the World, de Rupert Murdoch. (http://www.telegraph.co.uk/news/politics/8655106/Im-starting-to-think-that-the-Left-might-actually-be-right.html)
São um arranque de uma importante reflexão sobre o estado a que chegaram a política e a sociedade ocidental. Uma análise crua da situação que se vive no momento de crise financeira e económica, que resulta da forma como têm sido guiadas politicamente as sociedades, com o objectivo assumido de satisfazer os interesses "dos banqueiros, dos barões da comunicação social e outros magnates que dirigem e possuem tudo", como refere Charles Moore.
É o insuspeito e conservador declarado Charles Moore quem faz o retrato do sistema: "E quando os bancos, que cuidam do nosso dinheiro, o levam, o perdem e, devido às garantias do Governo, não são punidos, algo de pior acontece. Fica evidente que - como a esquerda sempre afirmou - um sistema que se propunha servir a maioria foi pervertido para enriquecer alguns. O sistema bancário global é um recreio aventureiro para os seus participantes, com seguros pavimentos esponjosos, para que eles recuperem, quando caem. O papel dos restantes, tal como nós, é simplesmente pagar."
E congratulando-se por os estragos dos abusos dos "donos do mundo" não terem sido até agora piores, Charles Moore não deixa de alertar para os riscos que a democracia corre: "Uma das coisas que estão diferentes é que as pessoas em geral perderam fé na liberdade de mercado e na ordem democrática ocidental. Graças a Deus, ainda não transferiram a sua fé, como aconteceu nos anos trinta, para o totalitarismo. Apenas se sentem sombrios e desconfiados. E fazem a pergunta simples: "O que há para mim?", e não ouvem uma boa resposta."
A importância central deste artigo de Charles Moore, desta crítica ao sistema dominante - hegemonizado pelas teses neoliberais de sagração da chamada "liberdade de mercado" que tudo subjuga -, feita por um seu prestigiado defensor ao longo dos anos, espelha o escândalo que o estado do mundo ocidental causa a quem ousa pensar com autonomia e liberdade. É escandaloso o modo como os políticos eleitos pelas populações em eleições democráticas se submetem à satisfação dos interesses dos "donos do mundo" e aceitaram perverter as regras básicas da democracia e de uma sociedade baseada na prossecução do difícil equilíbrio da justiça social e o bem-estar de todos.
Mas esta reflexão torna-se tanto mais pertinente quanto até já "donos do mundo" - e não apenas a esquerda - defendem a tributação dos mais ricos. Depois de Warren Buffett ter defendido a ideia, a Itália anunciou a criação de um imposto. Alguns multimilionários franceses apoiaram as palavras de Buffett e o Governo liderado pelo Presidente Nicolas Sarkozy já anunciou, no âmbito do plano de austeridade contra a crise, a instituição em França de um imposto extraordinário que vai taxar em três por cento as fortunas acima de 500 mil euros.
É significativo que dentro do próprio sistema, da própria elite, surjam críticas ao desequilíbrio e à injustiça social inerente à aplicação do modelo neoliberal que se foi instalando na Europa e nos EUA. E é significativo porque é uma demonstração do nível escandaloso de desigualdade criada. Para o combater, basta reintroduzir o tipo de impostos sobre mais-valias e património que existia há trinta anos. E, já agora, para quando o fim das off-shores?
O insólito desta situação é tanto maior quanto ela mostra como os Governos dos países europeus são reverentes ao poder económico. À Itália e a França só avançaram para esta taxação extraordinária dos mais ricos depois de os próprios pedirem. A ordem parece agora ir ser seguida em Espanha e em Portugal. De repente, todos os partidos parlamentares concordam com o que o PCP e o BE defendem há anos. Só porque Buffett disse o óbvio.
A discussão sobre taxação dos mais ricos é ainda uma demonstração de que os riscos que tais níveis de injustiça social podem criar são imensos. E de que, entre os próprios "donos do mundo", há quem tenha consciência de que, um dia destes, o povo pode bater-lhes à porta. E não porque o povo seja "uma cambada de criminosos" ou queira comer brioches. Mas simplesmente porque há limites para o abuso e para a indignidade.
O texto de Charles Moore tornou-se gritante esta semana como demonstração da diferença entre a liberdade de pensamento democrático que existe numa sociedade como a inglesa, com séculos de vida democrática, e outra em que a democracia tem menos de quatro décadas, como a portuguesa. É lamentável que haja em Portugal tão pouca autonomia e liberdade de pensamento entre os publicistas e que isso não permita uma atitude idêntica à que este artigo representa: uma crítica violentíssima feita por um proeminente publicista conservador britânico ao sistema neoliberal. Uma ausência de massa crítica e uma obediência cega à ortodoxia, que se estende também a parte da esquerda portuguesa, sobretudo ao silencioso PS. Ou será que temos de classificar o PS como de direita, à semelhança do que faz Charles Moore neste artigo, em que classifica como de direita o Partido Trabalhista liderado por Tony Blair e por Gordon Brown?
Deve ser elogiado o Presidente da República, Cavaco Silva, por ter saído a terreiro para rejeitar a proposta de inscrição nas Constituições dos países membros da União Europeia de uma norma-travão ao défice e ao endividamento. É certo que Cavaco Silva sabe, como todas as pessoas minimamente informadas sabem, que a soberania não é hoje plena nos países da União Europeia. E que a soberania financeira não existe nos países da zona euro. Bem como que essa perda de soberania ficou inscrita no Tratado de Maastricht, assinado, aliás, pelo próprio Cavaco Silva.
Igualmente confrangedor é que, perante tal proposta franco-alemã, o PS permanecesse calado sobre este assunto. Perante o deserto, a posição de Cavaco tornou mais evidente o unanimismo podre em que vive a política portuguesa. Um clima de paralisia e submissão, em que apenas o Presidente da República teve coragem de assumir o não a Ângela Merkel e Nicolas Sarkozy. Parco nas palavras, Cavaco foi directo na crítica: "Constitucionalizar uma variável endógena como o défice orçamental - isto é, uma variável não directamente controlada pelas autoridades - é teoricamente muito estranho. Reflecte uma enorme desconfiança dos decisores políticos em relação à sua própria capacidade de conduzir políticas orçamentais correctas."
Cavaco Silva sabe, de forma cristalina, aquilo que é uma evidência: que o controlo do défice e da dívida são instrumentos de governação e que são erguidos em paradigma pela doutrina neoliberal. Até porque uma coisa é obedecer-lhes e segui-los enquanto política de governação, que têm inscrição legal em tratados internacionais e leis nacionais; outra coisa é colocar estes princípios doutrinários de governação neoliberal na Constituição, o texto fundamental em que está inscrito o funcionamento do sistema político de um país, o edifício de poderes do regime. No dia em que tal acontecer será a consagração simbólica máxima do neoliberalismo como regime.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

BOM FIM-DE-SEMANA

OS TRABALHADORES DESTE BLOG SÓ VOLTAM AO TRABALHO NA PRÓXIMA SEGUNDA-FEIRA

EFEMÉRIDE: DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO



A ASSEMBLEIA NACIONAL CONSTITUINTE DA FRANÇA REVOLUCIONÁRIA APROVOU EM 26 DE AGOSTO DE 1789 E VOTOU DEFINITIVAMENTE A 2 DE OUTUBRO DO MESMO ANO A DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO. PELA PRIMEIRA VEZ SÃO PROCLAMADOS AS LIBERDADES E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO HOMEM (OU DO HOMEM MODERNO, O HOMEM SEGUNDO A BURGUESIA) DE FORMA ECUMÉNICA, VISANDO ABARCAR TODA A HUMANIDADE. PARA ALÉM DE SERVIR DE INSPIRAÇÃO PARA AS CONSTITUIÇÕES FRANCESAS DE 1848 E PARA A ACTUAL, TAMBÉM FOI A BASE DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS PROMULGADA PELA ONU EM 10 DE DEZEMBRO DE 1948.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

OBVIAMENTE O PETRÓLEO

O texto seguinte foi transcrito da edição de há uma semana da Revista Sábado. O seu autor é José Pacheco Pereira, não propriamente um esquerdista. Sendo que a previsível queda de Kadhafi já se concretizou, o resto do texto acerta em cheio na realidade faltando apenas referir que a razão da hipocrisia ocidental tem um nome: petróleo. Ajudar a derrubar um facínora, não para instaurar uma democracia mas, para controlar uma fonte do chamado ouro negro. Neste como noutros casos, a democracia e a liberdade são factores secundários. Como se pode comprovar na Síria onde não há petróleo…

Um monumento à hipocrisia ocidental: os aviões da NATO não voarão sobre Damasco
"Com as forças da NATO do lado dos revoltosos, que recebem hoje todos os apoios necessários, consultores no terreno, armas, logística, suporte diplomático, tudo isto complementado pela melhor força aérea do mundo, é natural que a queda de Kadhafi seja uma questão de tempo. Não deixará saudades, mas o modo como foi derrubado – por uma decisão política de regime change europeia – permanecerá como um monumento à hipocrisia ocidental.
Basta ler o texto da resolução das Nações Unidas para saber que a intervenção da NATO vai muito além dos termos internacionalmente acordados. Basta compreender o terreno para se perceber que, diferentemente do que aconteceu em muitos países árabes, não há uma insurreição vagamente democrática, mas uma guerra civil tribal. Basta olhar para a diferença com que a comunidade internacional actua com a Síria, para se perceber que, se se estiver noutra geografia e noutra geopolítica, se pode “atacar o seu próprio povo”, de forma violenta, continuada, sangrenta, muito mais sangrenta do que Kadhafi fez antes da intervenção ocidental, sem nenhumas consequências. Os aviões da NATO não voarão sobre Damasco."

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

SILLY SEASON DOS RICOS I

Há muito tempo que tamanha injustiça não se praticava em Portugal: entre 2000 e 2011 a taxa de IRS para os muito ricos subiu de 40% para 46,5%. Foi mesmo o único país da zona euro em que a taxa máxima aumentou naquele período.
Não é, pois, de admirar que os milionários portugueses não queiram ouvir falar em sacrifícios numa altura em que se tornou politicamente correcto os mais ricos do planeta apelarem à subida dos seus impostos.
Segundo dados de 2009, há em Portugal 150 famílias com rendimentos superiores a um milhão de euros por ano. Américo Amorim que lidera a lista dos milionários (Revista Exame) há 4 anos consecutivos com mais de 2,5 milhões de euros (mais 18% que em 2010) não se considera rico. «Sou trabalhador» respondeu ele ao Jornal de Negócios quando questionado sobre a sua situação financeira, sem acrescentar mais uma palavra que fosse.
Imagina-se que este homem trabalhou para acumular tamanha fortuna… Aliás, os dias de trabalho de qualquer milionário devem ter, como facilmente se percebe, centenas ou mesmo milhares de horas. Um trabalho com afinco, tendo como única finalidade o interesse colectivo como muito bem sabemos todos!

Luís Moleiro

SILLY SEASON DOS RICOS II

A cena dos multimilionários americanos reclamando que lhes seja permitido dar o seu apoio às finanças do país, através do aumento dos impostos, chegou a França. Parece que os super-ricos franceses acharam graça à rábula dos seus parceiros do outro lado do Atlântico. Mas não nos iludamos em relação a qualquer rebate de consciência desta gente em relação à falta de justiça social. O tempo é que nos vai dizer o que, de facto, pretendem.
O fosso que, por todo o lado, a doutrina neoliberal cavou entre ricos e pobres, pode estar a aconselhar aqueles no sentido de cederem umas migalhas para que tudo fique na mesma. Afinal, mais milhão menos milhão, nada se altera na vida de um multimilionário. A Revolução Francesa (1789) é um bom exemplo das consequências a que pode levar a ganância desmedida quando o povo perde a paciência perante injustiças colossais.
O escritor António Pina aborda esta rábula num pequeno texto, atravessado de fina ironia, que hoje assina no JN.
Começa assim:
«A ganância dos ricos não tem limites. Agora cobiçam até o pouco que os pobres têm, a servidão fiscal, e exigem pagar, como eles, impostos.»

Luís Moleiro

terça-feira, 23 de agosto de 2011

CAMPEONATO DA BANCARROTA...

O nosso desempenho permitiu subirmos, de novo, um lugar. Estamos em 2º mas o campeonato ainda não terminou. Continuamos a ter hipóteses de alcançar o lugar mais elevado do pódio embora o adversário que lá se encontra não dê tréguas. Não devemos desanimar porque os nossos representantes estão a dar tudo por tudo e o seleccionador é de primeira água. A vitória é difícil mas pode ser nossa!

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

OPÇÕES POLÍTICAS

Foi uma notícia pouco divulgada no último fim-de-semana, aquela que refere as críticas de D. José Policarpo, Patriarca de Lisboa, aos que contestam as medidas impostas pela troika. O discurso do Cardeal dirigia-se, em especial, aos sindicatos que, segundo ele, pertencem ao grupo que coloca o interesse individual acima do interesse nacional. «Está a fazer-me muita confusão ver, neste anúncio das medidas difíceis que até nos foram impostas por quem nos emprestou dinheiro, que os grupos estejam a fazer reivindicações grupais, de classe, não gosto», afirmou numa homilia celebrada em Alvorninha, Caldas da Rainha.
Convém aqui recordar também afirmações de D. José Policarpo, logo após o anúncio do primeiro-ministro da adopção de um imposto extraordinário em sede de IRS, equivalente a 50% do subsídio de Natal no excedente do salário mínimo nacional. «Todos nós devemos estar preparados para as medidas equilibradas que nos forem apresentadas para recuperar Portugal. Temos de colaborar com o Governo para que seja possível cumprir os nossos compromissos externos e possamos pôr Portugal a funcionar com esperança, vitalidade e genica», argumentou. E, para que não restassem dúvidas ao apoio a tão agressiva medida para os portugueses, fez questão de classificar a medida como «equilibrada».
Às tomadas de posição do cardeal somos levados a juntar o «apelo especial» dirigido por Passos Coelho aos sindicados no sentido de estes calarem a contestação à multidão de medidas gravosas que atingem, de um modo particular, as classes mais desfavorecidas. Quem disse que não há coincidências?...
Ao ignorar o aumento do desemprego, da precariedade, das desigualdades sociais e da redução do salário que se traduz no crescimento do fosso entre ricos e pobres, a Igreja, pela voz do seu principal representante em Portugal, faz a sua opção de classe em favor dos interesses dos grupos privilegiados, dando apoio político claro a medidas de um governo de direita. Como sempre!
Felizmente há muitas excepções a este comportamento, se tivermos em conta os níveis mais baixos da hierarquia católica.

Luís Moleiro

domingo, 21 de agosto de 2011

DIÁLOGO SIM, MONÓLOGO NÃO

Há personalidades e organizações que, por mais juras que façam, sempre vão mostrando dificuldades em lidar com a democracia. É o que se pode depreender do “apelo especial” que Passos Coelho fez aos parceiros sociais, em especial, aos sindicatos no frio discurso que proferiu na Festa do Pontal. O “apelo” foi no sentido de fazer calar as reivindicações das organizações representativas dos trabalhadores numa altura em que estes mais precisam de ter quem lhes dê voz. Numa sociedade democrática, os sindicatos constituem organizações de contrapoder que têm tanta legitimidade quanto o poder constituído. Caso se transformem em “instrumentos de consenso” deixam de ter razão de existir como sucedeu e ainda sucede em muitos países. Se é a paz social que procura, então, o primeiro-ministro não pode pretender que uma das partes, a sua, dite as ordens e a restante sociedade, em especial, a que produz riqueza aceite, sem pestanejar, todas as malfeitorias que lhe queiram fazer.
O texto seguinte, de Marisa Matias, comenta, de forma muito clara o “apelo especial” de Passos Coelho.

Apelo especial
“No início desta semana, Passos Coelho dirigiu-se à sua família partidária para o discurso da já habitual Festa do Pontal. Foram muitas as coisas ditas por Passos Coelho, mas houve uma que me prendeu mais a atenção: o “apelo especial”. Este apelo foi dirigido aos parceiros sociais, em particular os sindicatos, para que estes não enveredassem pelos caminhos da conflitualidade. Pode deduzir-se, portanto, que Passos Coelho está preocupado com a paz social.
Este apelo tem tanto de ilegítimo quanto de contraditório. Vamos por partes. É um apelo ilegítimo porque converter os sindicatos em instrumentos de consenso é retirar-lhes a própria razão de existir. Que espera Passos Coelho deles, afinal? Que calem e não contestem? As revisões sucessivas das leis laborais têm sido feitas contra os trabalhadores. No seu entender, os sindicatos devem calá-las. As medidas até aqui anunciadas pelo governo têm atacado sobretudo os trabalhadores. Mais uma vez, os sindicatos devem calá-las. Esta é a visão de quem entende que o debate, a diferença de opinião e a reivindicação são males da democracia e que o consenso é a raiz de todo o bem. Pois, a resposta para ambos os pressupostos é um rotundo não. É precisamente na diferença de opinião que reside a vitalidade e a força de uma democracia.
É um apelo contraditório porque pede diálogo e oferece monólogo. O desrespeito a que têm sido votadas as reivindicações dos sindicatos nos últimos anos raia agora o desprezo. E continua-se-lhe a chamar “diálogo”. Se o nosso primeiro-ministro está tão interessado em dialogar e almejar a paz social, por que não ouve mais? Ouviu os apelos à criação de emprego? Não, ignorou-os. Ouviu os apelos ao combate à precariedade? Nada o confirma. Ouviu as reivindicações para não atacar os direitos sociais e para não empobrecer mais as famílias? Também não parece que as tenha escutado. Se assim é, como espera Passos Coelho que os sindicatos ouçam o seu “apelo especial” e não contestem nenhuma das suas decisões?
Há muitas formas de procurar a paz social. Fazê-lo à custa do silêncio dos agredidos não é seguramente uma delas.”

Luís Moleiro

HIPOCRISIA OU REBATE DE CONSCIÊNCIA

Warren Buffett, um dos homens mais ricos do mundo deu, há dias, a entender que é injusto os ricos pagarem tão poucos impostos. De facto, nos EUA – o seu país – essa situação é escandalosa. Os que ganham menos são os que pagam mais impostos e não se vê que essa situação se possa alterar a curto ou médio prazo. Na pátria da democracia e da defesa dos direitos humanos o poder trata os ricos com “mimos” e os pobres a pontapé. As declarações de Warren Buffett são, nesta altura, politicamente correctas mas talvez não passem de uma enorme hipocrisia. Se houvesse um mínimo de hipóteses de os ricos virem a pagar impostos justos, de certeza que este sujeito estaria a protestar por isso ou, no mínimo, calado. A única alternativa que se coloca aos pobres é lutarem com os meios que têm ao seu dispor se quiserem que haja alguma justiça social.
E, em Portugal haveria alguma hipótese de um dos nossos multimilionários admitir que os ricos deviam pagar mais impostos? Nem com “rebates de consciência” tardios nem com a mais podre hipocrisia tal seria possível.
O texto seguinte é o excerto de um artigo de opinião publicado no “Diário As beiras” (18/08), intitulado “Miminhos”, onde o autor, partindo das afirmações de Buffet, aborda a situação portuguesa com muito a propósito.

“Um dos homens mais ricos do mundo, Warren Buffett, escreveu no “New York Times” que era altura de aumentar os impostos aos “mega-ricos” como ele. Buffett esclarece que em 2010 pagou 7 milhões de dólares de impostos, pouco mais de 17 por cento dos seus rendimentos, enquanto, diz, isso é uma percentagem menor do que o que paga qualquer dos colaboradores que trabalham no seu escritório, entre 33 e 41 por cento. Coisas de norte-americanos! E rebate de consciência de um confesso “mega-rico”.
Mas Buffett bem podia viver em Portugal. O que afirma para o seu país é no essencial, mais ou menos uns trocos, o que se passa em Portugal. Não me parece que Amorim ou Belmiro concordem, nem tão pouco acredito que os principais banqueiros pensem semelhante coisa. Sei é que a Banca paga impostos mais baixos do que a mercearia ou a tabacaria da minha rua, do que qualquer pequeno comerciante da baixa. Sei é que todos vamos pagar, de igual modo, mais cara a electricidade e o gás, e que nem todos recebemos de igual modo. Sei é que se alguém aufere salários de cento e cinquenta e tal mil euros por ano paga, e justamente, 46,5 por cento de IRS, mas paga o mesmo que alguém que receba um milhão. E também sei que se esse rendimento provir de investimentos só paga 21,5 por cento e que se não paga nada de milhões provenientes de mais-valias bolsistas através de SGPS e investimentos em offshores. E sei também que o imposto extraordinário que roubará grande parte do subsídio de Natal aos portugueses excluirá os rendimentos de capital. Sei, sabemos, e não está certo!
Em tempo de crise, dêmos graças! Afinal “eles” sabem que ainda assim é possível ir dando alguns miminhos…”

Luís Moleiro

sábado, 20 de agosto de 2011

CITAÇÕES

“O que assusta o poder em Portugal e o poder na União Europeia é que as populações reajam de forma violenta à construção em curso de um novo modelo social imposto pelo poder financeiro. (…) O que o poder tem medo é de uma reacção violenta e descontrolada à guerra social e económica que o próprio poder abriu contra as populações europeias para baixar o nível de riqueza que é redistribuída pelo Estado na Europa. Uma guerra que tem como objectivo a concentração da riqueza na elite, nos donos do poder económico e na aristocracia empresarial e política que os serve.” (São José Almeida, jornalista, “Público”)

“Ao vir, em meados de Agosto, anunciar que o IVA na energia, electricidade e gás, ia aumentar de 6% para 23%, o que o dr. Gaspar fez, foi exactamente isto. Cobrar aos pobres e remediados uma parte da dívida da qual os ricos estão isentos. Dividendos não são taxados, viva a especulação, mas aos outros será cobrado este imposto suplementar.” (Clara Ferreira Alves, jornalista, “Expresso”)

“Depois de ter mentido aos portugueses, dizendo que não aumentaria os impostos, o Governo veio antes do tempo cobrar receitas a quem não as tem. Esta obscenidade política, que essa matéria inerte que dá pelo nome de PS veio sancionar pelo silêncio e a cumplicidade, demonstra que o PSD decidiu ir, com se dizia antigamente, roubar ara a estrada. À socapa.” (Clara Ferreira Alves, jornalista, “Expresso”)

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

MARCA ZARA ENVOLVIDA EM TRABALHO ESCRAVO (1)

Como sabemos, a Zara é uma rede de lojas de roupas e acessórios para homens, mulheres e crianças. Pertence ao grupo Inditex que também detém outras marcas como Máximo Dutti, Ohisho, Bershka e Zara Home, para só citarmos as mais conhecidas em Portugal. A primeira loja Zara inaugurada no nosso país data de 1988. Actualmente é fácil encontrarmos lojas do grupo Inditex em qualquer centro comercial.
A marca Zara é conhecida pelos baixos preços que pratica, pelo que o volume de negócios é muito grande. Mas, como diz o povo, “quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vem”.
Acontece que, há 1 ou 2 dias, ficámos a saber que uma fornecedora desta rede espanhola mantinha uma casa na zona norte de S. Paulo (Brasil) com trabalhadores sul-americanos em condições de semi-escravidão. Eles enfrentavam uma jornada de trabalho de mais de 16 horas por dia. Muitas vezes chegavam a 20 horas. Não havia contrato de trabalho assinado e a remuneração paga pela empresa a cada trabalhador não correspondia ao tempo de trabalho. “Não havia salário fixo”, denunciou uma costureira.
O quadro encontrado pelas autoridades brasileiras incluía contratações ilegais, trabalho infantil, condições degradantes, cerceamento da liberdade e jornadas exaustivas. Contou uma agente fiscalizadora que a oficina ilegal “era um local de trabalho com pouca iluminação, sem ventilação, malcheiroso, em que as janelas eram mantidas fechadas, para ninguém saber que havia uma oficina de costura ali”.
De acordo com uma investigação levada a cabo por uma repórter da Agência de Notícias Repórter Brasil, por cada uma das blusas da colecção Primavera-Verão da Zara, os costureiros recebiam 2 reais e o dono da oficina 7. Blusas semelhantes eram vendidas na loja por 139 reais… Não é uma situação inédita!
É claro que a Inditex (detentora da marca Zara) desempenhou o papel que sempre representam as grandes empresas que são apanhadas em situações de grande melindre social, perante a opinião pública. Argumenta que desconhecia completamente o que se estava a passar, que vai reforçar a fiscalização sobre todos os fornecedores para “garantir que casos como este não se repitam”. É claro que só quem acredita no Pai Natal é que se deixa convencer por argumentos já estafados como este. É impossível que uma grande empresa não desconfie da forma de actuação de um fornecedor que lhe proporciona produtos a preços excepcionalmente baixos. Prova disto é o facto de as autoridades brasileiras terem identificado cerca de 35 oficinas que apresentavam a possibilidade de ter trabalho escravo, realizado por bolivianos produzindo roupas com a etiqueta Zara.
Tudo o que aqui foi descrito, de forma resumida, deve estar presente na mente da cada consumidor que pretenda adquirir um produto da marca em apreço. A rejeição das práticas ignóbeis por parte de certas empresas é fácil de levar a cabo pela opinião pública: basta recusar a compra dos seus produtos. É a forma mais eficaz de atingir os visados e a única que eles entendem.

Luís Moleiro

ZARA ENVOLVIDA EM TRABALHO ESCRAVO (2)

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

ALBERTO JOÃO, ELE MESMO

O regime político que se vive no arquipélago da Madeira nem sequer pode ser classificado como democracia de baixa intensidade. É, talvez, uma ditadura perfeita, tão à vontade se sente o seu chefe máximo, qual dono vitalício do cargo que ocupa.
As ameaças, os insultos e os impropérios de Alberto João Jardim há muito que deixaram de ser notícia. O próprio já deve ter dado conta disso e, de cada vez que o acaso o propicia, lá faz um dos seus números, numa tentativa de chamar a atenção do todo nacional, qual menino mal-educado perante os pais que deixaram de ligar aos seus dislates.
Depois do gesto obsceno que fez perante as câmaras de televisão, ainda há poucos dias, veio, agora, Alberto João tentar expulsar de uma igreja uma jornalista que se encontrava em trabalho de reportagem numa festa religiosa. Ameaçou mesmo chamar a polícia. Pelo que se depreende da notícia, nenhuma das autoridades da igreja, presentes na cerimónia, fez qualquer reparo ao energúmeno.
Nem o mais despudorado ditador teria tamanha desfaçatez num local de culto religioso, a menos que a sua sanidade mental já não estivesse nas melhores condições. Daí que tenha todo o cabimento a petição, que já circula na Net, no sentido de ser feita uma avaliação da sanidade mental da grotesca personagem madeirense.
Se a petição chegar à Assembleia da República seria muito interessante ver o sentido de voto do PSD…
Este blog convida todos os seus frequentadores a assiná-la em
http://www.peticaopublica.com/PeticaoVer.aspx?pi=sanidade


Luís Moleiro

terça-feira, 16 de agosto de 2011

VIA DO INFANTE: CONTRA AS PORTAGENS MARCHAR, MARCHAR



NUM DIA MUITO QUENTE (15 AGOSTO), VÁRIAS DEZENAS DE ALGARVIOS PROTESTARAM CONTRA A INTRUDUÇÃO DE PORTAGENS NA VIA DO INFANTE

CAPITAL, TAL QUAL

O capital não tem pátria nem olha a meios para atingir os fins.
A evocação da defesa dos direitos humanos no sistema político que domina o planeta não passa de um blábláblá. Se houvesse um mínimo de decência e respeito pela vida, nunca poderia suceder que a banca investisse em empresas que fabricam bombas de fragmentação – material de guerra proibido.

OS POBREZINHOS...TÃO ENGRAÇADOS

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

OUTRA VEZ "OS POBREZINHOS"

Sem tirar nem pôr, o chamado Programa de Emergência Social (PES) define o carácter ideológico do actual governo. Os cidadãos deixam de ser vistos como iguais perante o Estado, como é normal acontecer numa democracia, para passarem a fazer parte de grupos sociais com direitos diversos. Mas, pior que isso, é vir a aceitar-se essa situação como normal.
No artigo de opinião que a jornalista São José Almeida assina no “Público” do último sábado (13/8), são designados três “exemplos de como o PES serve à introdução de uma nova organização social baseada numa ideologia não igualitária”:
1. Os trabalhadores que recebem subsídio de desemprego têm de estar disponíveis para trabalho voluntário. A medida irá ser enquadrada na modalidade de "trabalho socialmente necessário", já prevista na lei. Mas a forma como está anunciada aponta claramente para a introdução de trabalho compulsivo como condição para receber uma prestação social que é um direito constitucional de quem trabalhou e fez descontos para a Segurança Social, o que pode colocar problemas de constitucionalidade. E acima de tudo choca pela inversão de valores que indicia. Isto porque o subsídio de desemprego não é um favor, uma esmola que o trabalhador tem que merecer e compensar. É um direito que faz parte do Estado Social e da redistribuição da riqueza por si criada enquanto trabalhador.
2. A distribuição gratuita de remédios próximos de expirar o prazo de validade a pessoas de baixos rendimentos. Aqui está a aplicação clara do conceito de esmola ao que é o direito à assistência médica e de saúde pública que a Constituição prevê. Quer seja através da recolha junto dos cidadãos dos medicamentos já não utilizados e perto do fim do prazo, quer sejam as farmacêuticas ou as farmácias a dá-las aos serviços que vão organizar o sistema, trata-se de dar os restos, os remédios que sobram dos ricos e dos remediados e da indústria farmacêutica aos pobres que deles precisam. Já agora, será que a proximidade de fim de prazo não é prejudicial à saúde de quem vai ser assim assistido na sua doença? Ou será que os pobres podem tomar remédios estragados, se entretanto o prazo expirar? Mais uma pergunta: por que não introduzir de facto a unidose dos medicamentos? Será que não há poder político com independência e coragem para fazer frente aos interesses da indústria farmacêutica desde que Leonor Beleza foi demitida por Cavaco Silva precisamente por querer mexer com os interesses das multinacionais farmacêuticas?
3. Para fazer face à fome que assola a sociedade portuguesa vai ser criada uma rede de "cantinas sociais", tudo indica que à imagem do Banco Alimentar contra a Fome que há anos funciona e bem, dirigido por Isabel Jonet. A medida seria excelente, não fora a forma preconceituosa e classista como foi anunciada. Ou seja, vão ser aligeiradas as regras de fiscalização sanitária e de segurança alimentar. Será que em Portugal a nova concepção de justiça social é mesmo a de que os pobres podem comer comida estragada, que os pobres podem apanhar salmonelas?
Está em marcha um processo de regressão social baseado numa visão assistencialista, com a distribuição de esmolas a partes significativas da população que passam a ter um estatuto diferenciado dos restantes.

domingo, 14 de agosto de 2011

A VERDADE CONTRA A PROPAGANDA

A explicação racional dos factos, contra a pura propaganda deve ter um empenhamento permanente daqueles que melhor conhecem as malévolas intenções dos que pretendem controlar, em seu favor, as mentes das populações. É um trabalho hercúleo que nunca está terminado. Nenhum meio lícito deve ser desperdiçado pois, do outro lado há forças poderosíssimas que não olham a meios para atingir os seus fins. Os acontecimentos em Inglaterra estão a ser interpretados pela comunicação do regime de forma a contornar a realidade. Os que vão ao fundo da questão são preteridos em relação à versão oficial e esta é a que parece contar, tão repetida é.
Por isso, não é demais chamar a atenção para um texto de opinião do jornal Guardian que ontem foi publicado no Esquerda.net. Foge da interpretação oficial em direcção a uma explicação mais racional.

LIÇÃO DE SOCIOLOGIA

Sem sombra de dúvida que os jovens que provocaram os distúrbios em Inglaterra são criminosos mas não estamos perante uma “criminalidade pura e simples” como afirmou o Primeiro-Ministro britânico e como nos pretendem fazer crer a quase totalidade dos comentadores que são chamados a depor nos diversos canais televisivos que entram pelas nossas casas adentro. É uma autêntica lavagem ao cérebro dos menos informados, cujo principal objectivo é afastar a responsabilidade das decisões dos dirigentes políticos. A explicação oficial é a que deve ser impingida às pessoas para as manter sob controlo.
O texto que hoje assina no ‘Público’ o prof. Boaventura Sousa Santos, Director do Centro de Estudos Sociais, Laboratório Associado, da Universidade de Coimbra, é uma autêntica lição de sociologia tendo por base os acontecimentos de Inglaterra. Por isso, é muito importante que seja divulgado, lido, relido e reflectido para que o maior número possível de pessoas não se deixe levar pelo engano.

Os limites da ordem
"Os violentos distúrbios na Inglaterra não devem ser vistos como um fenómeno isolado. São um perturbador sinal dos tempos. Está a ser gerado nas sociedades contemporâneas um combustível altamente inflamável que flui nos subterrâneos da vida colectiva sem que se dê conta. Quando vem à superfície, pode provocar um incêndio social de proporções inimagináveis. Este combustível é constituído pela mistura de quatro componentes: a promoção conjunta da desigualdade social e do individualismo, a mercantilização da vida individual e colectiva, a prática do racismo em nome da tolerância, o sequestro da democracia por elites privilegiadas e a consequente transformação da política em administração do roubo "legal" dos cidadãos e do mal-estar que ele provoca. Cada um destes componentes tem uma contradição interna. Quando elas se sobrepõem, qualquer incidente pode provocar uma explosão.
Desigualdade e individualismo. Com o neoliberalismo, o aumento brutal da desigualdade social deixou de ser um problema para passar a ser a solução. A ostentação dos ricos e dos super-ricos transformou-se em prova do êxito de um modelo social que só deixa na miséria a esmagadora maioria dos cidadãos supostamente porque estes não se esforçam o suficiente para terem êxito. Isso só foi possível com a conversão do individualismo em valor absoluto, o qual, contraditoriamente, só pode ser vivido como utopia da igualdade, da possibilidade de todos dispensarem por igual a solidariedade social, quer como agentes dela, quer como seus beneficiários. Para o indivíduo assim construído, a desigualdade só é um problema quando lhe é adversa e quando isso sucede nunca é reconhecida como merecida.
Mercantilização da vida. A sociedade de consumo consiste na substituição das relações entre pessoas por relações entre pessoas e coisas. Os objectos de consumo deixam de satisfazer necessidades para as criar incessantemente e o investimento pessoal neles é tão intenso quando se têm, como quando não se têm. Os centros comerciais são a visão espectral de uma rede de relações sociais que começa e acaba nos objectos. O capital, com a sua sede infinita de rentabilidade, tem vindo a submeter à lógica do mercado bens que sempre pensámos serem demasiado comuns (a água e o ar) ou demasiado pessoais (a intimidade e as convicções políticas) para serem trocados no mercado. Entre acreditar que o dinheiro medeia tudo e acreditar que tudo pode ser feito para o obter vai um passo muito menor do que se pensa. Os poderosos dão esse passo todos os dias sem que nada lhes aconteça. Os despossuídos, que pensam que podem fazer o mesmo, acabam nas prisões.
Racismo da tolerância. Os distúrbios na Inglaterra começaram com uma dimensão racial. O mesmo sucedeu em 1981, e nos distúrbios que abalaram a França em 2005. Não é coincidência; são afloramentos da sociabilidade colonial que continua a dominar as nossas sociedades, décadas depois de terminar o colonialismo político. O racismo é apenas um componente, tanto mais que em todos os distúrbios mencionados se envolveram jovens de várias etnias. Mas é importante, porque junta à exclusão social um elemento de inabarcável corrosão da auto-estima, a inferioridade do ser agravada pela inferioridade do ter. Um jovem negro das nossas cidades vive quotidianamente uma suspeição social que existe independentemente do que ele ou ela seja ou faça. E essa suspeição é tanto mais virulenta quando ocorre numa sociedade distraída pelas políticas oficiais da luta contra a discriminação e pela fachada do multiculturalismo e da benevolência da tolerância.
Sequestro da democracia. O que há de comum entre os distúrbios de Inglaterra e a destruição do bem-estar dos cidadãos provocada pelas políticas de austeridade comandadas pelas agências de notação e os mercados financeiros? São ambos sinais dos limites extremos da ordem democrática. Os jovens amotinados são criminosos, mas não estamos perante uma "criminalidade pura e simples", como afirmou o primeiro-ministro David Cameron. Estamos perante uma denúncia política violenta de um modelo social e político que tem recursos para resgatar bancos e não os tem para resgatar a juventude de uma vida de espera sem esperança, do pesadelo de uma educação cada vez mais cara e mais irrelevante, dado o aumento do desemprego, do completo abandono em comunidades que as políticas públicas anti-sociais transformaram em campos de treino da raiva, da anomia e da revolta.
Entre o poder neoliberal instalado e os amotinados urbanos há uma simetria assustadora. A indiferença social, a arrogância, a distribuição injusta dos sacrifícios estão a semear o caos, a violência e o medo, e os semeadores dirão amanhã, genuinamente ofendidos, que o que semearam nada tem a ver com o caos, a violência e o medo instalados nas ruas das nossas cidades. Os desordeiros estão no poder e poderão em breve ser imitados por aqueles que não têm poder para os pôr na ordem."

sábado, 13 de agosto de 2011

PILHAGENS...


O ‘EXPRESSO’ ENTREVISTOU D. MANUEL MARTINS (EX-BISPO DE SETÚBAL)

Pontos fortes da entrevista:

“Uma das causas desta crise tem a ver com a filosofia económica que estamos a viver, que se implantou no mundo como uma verdadeira divindade.”

“Agora estou convencido – oxalá não seja assim – de que estamos numa situação má, amanhã vamos estar numa situação pior e depois de amanhã vamos estar numa situação péssima.”

“Eu não admito um Estado assistencialista; era como se o Estado fosse o director de um asilo.”

“Agora diminuíram as compensações e o tempo de subsídio e preparam-se para amanhã não dar nada. Isto só vai piorar.”

“Uma das coisas que me torturam mais é o desemprego.”

“É uma Europa esfrangalhada, desorientada, que é a dois e não a 27. Ao fim e ao cabo, fomos associar-nos para engordar mais aqueles cavalheiros e nos minimizarmos a nós. (…) Tudo foi pensado em função deles.”

“A Igreja faz festas muito bonitas e esquece de vir para o meio daqueles que sofrem.”

“A Igreja tem de viver sempre em tensão com o poder. Caso contrário, não cumpre o seu dever, porque tem um ideal de vida que não se pode conformar com nenhum programa de governo.”

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

ESTUDANTES CHILENOS PROTESTAM

IMAGEM DOS PROTESTOS DE HÁ TRÊS DIAS, DOS ESTUDANTES EM SANTIAGO DO CHILE, CONTRA OS CORTES NA EDUCAÇÃO DO GOVERNO DE DIREITA DE SEBASTIAN PIÑERA. LER MAIS

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

MADEIRA, UM CASO DE ESTUDO

É um privilégio dos portugueses terem quase todos os dias à sua disposição num jornal de grande audiência um texto assinado por um escritor com o cariz de Manuel António Pina (MAP). Muitos de nós gostaríamos de ter um décimo do seu talento para escrever.
A prosa da autoria de MAP que hoje vem inserida no JN constitui mais uma denúncia da democracia de baixa intensidade que há décadas se vive na Madeira e que nenhum governo da República tem sido, até agora, capaz de enfrentar. São palavras desenhadas com uma mestria inigualável. Poucas mas de grande significado.

A Lei a Oeste de Pecos
“A Madeira é, com a cumplicidade dos sucessivos governos da República, uma espécie de "offshore" privado do PSD regional e de Alberto João Jardim, o seu Profeta, onde leis e políticas gerais do país pouco ou nada valem e a própria democracia, realizando o velho sonho irónico da dra. Ferreira Leite, se encontra há décadas suspensa.
Enumerar todas as tropelias que fazem da Madeira de Jardim um "study case" ilustrativo da céptica definição de Borges de sistema democrático, o de "arbítrio provido de urnas eleitorais", é mais problemático do que a Hércules foi capturar o Javali de Erimanto. Do mesmo modo, a mítica dívida da Região trepa mais velozmente Orçamento acima, aos saltos de milhões de cada vez, que a Corça de Cornos de Ouro e saneá-la afigura-se trabalho maior que limpar os estábulos de Áugias.
A este 13º trabalho, limpar os estábulos da dívida madeirense ( 963,3 milhões em finais de 2010), se tem inutilmente dedicado o Tribunal de Contas (TC), que descobriu agora que boa parte dos milhões para a reconstrução da ilha na sequência do temporal do ano passado foi afinal ter a "despesas de funcionamento". Já há um mês, o mesmo TC apurara que só 29,5% dos 191,3 milhões arrecadados pela Madeira no âmbito da Lei de Meios foram efectivamente utilizados na reconstrução.
Diz o TC que tudo isso (e não só) "ofende" não sei quantas leis. O TC ignora que, a Oeste de Pecos, é Alberto João Jardim a Lei.”

OPÇÃO DE CLASSE

Segundo a comunicação social, é a banca quem mais benefícios vai ter com a redução da Taxa Social Única. Trata-se de mais um exemplo da opção de classe deste governo. Nada de novo para quem está mais avisado. E, ainda há menos de dois meses que está em funções…

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

CITAÇÃO

“É preciso que as políticas nacionais, mesmo com a austeridade imposta, não venham contribuir para aumentar drasticamente a vulnerabilidade social. Quando se fala nos 20% de portugueses em risco de pobreza (que seriam 40% se não houvesse transferências sociais), estamos a falar de pessoas sem acesso a, pelo menos, um dos seguintes direitos fundamentais: à alimentação, à saúde, ao trabalho, à educação e à habitação.” (Helena Roseta, arquitecta e vereadora da CML)

terça-feira, 9 de agosto de 2011

TRABALHO COLOSSAL DO BE

No primeiro mês e meio de funcionamento do Parlamento, após as eleições de 5 de Junho, o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda foi, de longe, aquele que mais iniciativas legislativas apresentou. Foram 46. Em segundo lugar ficou o PCP com 36.
É curioso que a bancada com menor número de deputados tenha sido a que apresentou mais trabalho. Pelo contrário, os maiores grupos parlamentares parecem ter entrado de férias muito cedo…
Que se desse conta, esta não foi uma notícia que despertasse interesse em qualquer noticiário televisivo. Enfim, nada que não estejamos já habituados. Depois diz-se, com todo o desplante, que “os deputados” trabalham pouco mas não se diz quais. Vão todos para o saco dos preguiçosos para se poder exigir um emagrecimento do Parlamento. A verdade é que seriam os mais mandriões os principais beneficiados pois deixariam de ter à perna aqueles que mais denunciam a sua calaceirice.

Luís Moleiro

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

HÁ TRINTA ANOS: O DIA EM QUE A CLASSE MÉDIA MORREU, POR MICHAEL MOORE

O Esquerda.net publica hoje um importante texto do conhecido cineasta, documentarista e escritor norte-americano, Michael Moore que merece ser lido e relido e servir de tema de reflexão. Vale a pena.
Começa assim:
“De tempos em tempos, alguém com menos de 30 anos vem-me perguntar: “Quando tudo isso começou, a queda da América ladeira abaixo?”. Eles dizem que ouviram falar de um tempo em que o povo trabalhador podia criar uma família e enviar as crianças à faculdade com o rendimento de um só dos pais (e que as faculdades em estados como Califórnia e Nova York eram quase gratuitas). Um tempo em que quem quisesse ter um trabalho remunerado decente o teria; em que as pessoas só trabalhavam cinco dias por semana e oito horas por dia, tinham todo o fim-de-semana de folga e as férias pagas no Verão. Que muitos empregos eram sindicalizados, de empacotadores em supermercados ao homem cara que pintava a sua casa, e isso significava que não importava qual o seu trabalho, pois, por menos qualificado que fosse, dar-lhe-ia as garantias de uma reforma, aumentos ocasionais, seguro de saúde e alguém para defendê-lo se fosse tratado injustamente.”

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FALHANÇO DO SISTEMA

Há notícias que, pela sua importância e significado deviam vir publicadas nas primeiras páginas dos jornais, em letras bem gordas, e abrir todos os telejornais. Também é verdade que há factos que, pela sua gravidade, ao serem revelados, põem em causa o sistema político em que vivemos, mostrando os seus podres e as suas fortes contradições. Obviamente, as forças que controlam a informação tentam esconde-los o mais possível. Por vezes, já é uma sorte podermos encontrar certas notícias mesmo em páginas interiores dos jornais, quase escondidas.
Na terra de todas as oportunidades, pátria da democracia, pregoeira dos direitos humanos (quando convém) mas também berço do neoliberalismo e seu expoente máximo, quinze por cento da sua população vive com ajuda alimentar. De facto, uma notícia quase escondida no “Publico” de hoje dá-nos conta que cerca de 46 milhões de norte-americanos “recebeu ajuda governamental para adquirir comida ao longo deste ano”. Uma ajuda que é “dada através de vales que podem ser trocados por bens alimentares considerados de primeira necessidade” não se dê o caso de os pobres gastarem mal o dinheiro… Para poderem aceder a esta ajuda, as famílias têm de provar não possuírem rendimentos ou poupanças até um determinado montante.
É óbvio que uma notícia deste tipo, com valores tão elevados, é a demonstração do falhanço do capitalismo na sua versão mais radical que agora nos domina. O sistema gera cada vez mais desigualdades como todos os dias constatamos. Se uma situação destas fosse amplamente comentada e debatida em toda a comunicação social iria abrir os olhos dos mais atingidos pela injustiça social. Em vez disso, fornecem-se doses maciças de entorpecentes, de que o futebol é um dos exemplos, para ir entretendo a plebe, desviando a sua atenção dos problemas graves que, de facto, a afectam. Ai dos ricos e poderosos se, um dia os pobres descobrem, de vez, a ponta da meada que os mantêm manietados!

Luís Moleiro

domingo, 7 de agosto de 2011

ATÉ QUANDO?

Sabe bem ver alguém chamar os bois pelos nomes quando essa é a evidência para toda a gente. Relativamente ao caso BPN não se passou nada de novo porque, em Portugal, os chamados crimes de colarinho branco acabam sempre da mesma maneira: tudo fica por esclarecer, os culpados não são encontrados ou, pura e simplesmente, os processos acabam por prescrever sem punição dos criminosos. É claro que, para esta gente, o crime compensa largamente, ainda que tenham de gastar muito dinheiro com bons advogados. Os que acabam por pagar a conta são sempre os mesmos e os que ficam a rir também…
O pequeno texto seguinte tem a assinatura de Daniel Oliveira e foi transcrito da edição de ontem do “Expresso”. Ele reflecte a indignação de muitos de nós, perante mais um cambalacho levado a cabo, na nossa cara, por gente de má nota, com a cobertura implícita – para usarmos uma expressão muito branda – do poder. Até quando assistiremos sem reacção a situações destas?

ENTRE AMIGOS
“Um grupo de mafiosos, com bons contactos no poder, a começar pela Presidência da República, roubou ao país o correspondente a mais do que vamos perder todos no próximo Natal. Houve um terramoto político? Tudo acabou quando todos os que mantiveram relações menos claras com esta quadrilha foram investigados e todos os culpados postos atrás das grades? Não. O BPN vai ser vendido a um banco de um ex-ministro de Cavaco Silva, ex-colega de alguns que participaram na golpada. E, acusa um outro candidato à compra, mais barato do que a outra oferta. Fica tudo entre amigos.”

Luís Moleiro

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A ÁGUA É DE TODOS

Qualquer pessoa sabe que todo o negócio em que uma das componentes é a água vale a pena pelo lucro que proporciona. Desde os refrigerantes até à água engarrafada com sabores existe uma infindável panóplia de líquidos para consumo pessoal cuja principal componente é a água. Até aqui, quase nada a opor para além da falta de qualidade de muitos e das grandes quantidades de açúcar que nos convidam a ingerir.
Em geral, para suprir as nossas necessidades diárias, não precisamos comprar água engarrafada ou refrigerantes.
Perto de cem por cento da população portuguesa tem água canalizada em casa, proveniente da rede pública. Até agora, a captação e distribuição de água tem estado sob a tutela dos órgãos municipais e não se nota que as coisas funcionem mal. Então porque se pretende privatizá-las? A resposta é simples: constitui um excelente negócio e a papinha já está toda cozinhada.
Pela experiência de muitos países, sabe-se que a privatização da água é altamente nefasta para as populações pela perda de qualidade e pelo aumento dos preços que acarreta. Como muito bem afirma o Prof. Boaventura Sousa Santos no artigo de opinião que esta semana assina na “Visão”, “a privatização da água é a mais escandalosa de todas porque ela põe em causa o próprio direito à vida.” E acrescenta, logo a seguir:
“A água é um bem comum da humanidade e o direito à água potável, um direito fundamental. Um direito de que está privada cerca de um quarto da população mundial (1,5 biliões de pessoas). Todos os dias morrem 30.000 pessoas por doenças provocadas pela falta de água potável. As alterações climáticas fazem prever que este problema se agravará nas próximas décadas. Considerando que quase metade da população mundial vive com menos de 2 dólares por dia, e, por isso, sem condições para aceder ao mercado da água, tudo recomendaria que as medidas para garantir o acesso à agua fossem orientadas pela ideia do direito fundamental e não pela ideia da necessidade básica.”
Em muitos países onde a água foi privatizada, está a assistir-se a uma remunicipalização da sua gestão, por pressão das populações que se sentem altamente prejudicadas. Em Portugal devemos prevenir para não termos de remediar depois. O precioso líquido que compõe cerca de 70% do nosso corpo não pode ser objecto de negócio. A ÁGUA TEM DE CONTINUAR A PERTENCER A TODOS!

Luís Moleiro

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

PROPAGANDA E REALIDADE

Pura propaganda
Todo o dia de hoje houve um enorme alarido à volta da descida do preço das vacinas para as doenças tropicais.
A partir da doutrina económica que orienta o actual governo, todas as explicações para este facto seriam possíveis, excepto a preocupação em beneficiar os utentes.
Veio a saber-se que o governo Sócrates tinha procedido a um aumento brutal daquelas vacinas, razão pela qual, as pessoas tinham abdicado delas, com os inerentes riscos para a saúde. Procedeu-se a uma redução do preço das mesmas mas, apesar disso ainda ficam muito caras.
Há ainda que desmascarar mais esta manobra de propaganda pois trata-se de um procedimento que beneficiará um reduzido número de cidadãos.

Pura realidade
Quase despercebida está hoje a passar a notícia de uma das consequências da crise da fome que alastra na Somália. Segundo um estudo da ONU terão morrido mais de 29 mil crianças, com idade inferior a 5 anos, nos últimos 90 dias. Como diria o Alto-Comissário da ONU para os Refugiados, “é só fazer as contas”. E, feitas as contas, verifica-se que, só na Somália, morreram de fome, por dia, cerca de 322 crianças, desde há três meses.
É a tal guerra barata que vai dizimando seres humanos sem ser preciso disparar um só tiro. O direito à alimentação não é um direito humano? E o sofrimento por que passam milhões de cidadãos deste mundo, até sucumbirem à míngua de tudo?
O montante suplementar que a ONU pediu para as populações vítimas da seca na África Oriental – 500 milhões de dólares – corresponde a metade do que a França gastou na guerra da Líbia entre Março e Junho deste ano…

Por outro lado aparece nas nossas televisões, com grande destaque, a história de uma australiana, filha de um multimilonário, presumivelmente vítima de um processo de extorsão. A jovem permaneceu cerca de 10 horas com uma bomba-coleira que acabou por se verificar ser falsa. Nada lhe aconteceu para além de um valente susto.

Conclusão
Certamente muito mais gente ficou informada sobre a história da australiana que apenas sofreu um grande susto e sobre a redução do preço de vacinas que poucos cidadãos utilizam do que sobre o número de crianças que, neste momento estão a morrer à fome numa zona de África. São "pretos" e, se calhar, na sua terra, o petróleo não abunda…

Luís Moleiro

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

LIQUIDAÇÃO TOTAL

O que o governo Passos Coelho está a levar a cabo é, nem mais nem menos, que a continuação da política de Sócrates no que diz respeito ao desmantelamento do património do Estado (de todos nós). Só que o faz com muito maior despudor pois o carácter ideológico que sempre assumiu não lhe cria quaisquer peias. E parece que está com muita pressa de passar tudo a míseros patacos, seja qual for o prejuízo para o erário público.
O exemplo mais recente tem a ver com o BPN, alienado por uns trocados, suportando ainda o Estado os encargos com os despedimentos que ascendem a 50% dos trabalhadores. A tudo isto juntam-se mais 550 milhões que vão ser sacados do bolso dos contribuintes para lá serem metidos, para além do valor astronómico que, desde há muito, já lá está enterrado.
Como muito bem afirma o escritor Manuel António Pina no texto que hoje assina no JN, “o actual Governo começa a parecer-se de mais com uma comissão liquidatária do património do Estado a preços de saldo (e com os contribuintes a financiar os compradores)”.
A era Sócrates foi tremendamente nefasta para os portugueses que, em desespero de causa, perante a necessidade de se livrarem de um quase-ditador, acabaram por entregar o poder a um bando que não vai ter o mínimo pejo de introduzir neste país tudo o que de mais nefasto impõe a doutrina neoliberal.
Vai ser uma factura tremendamente difícil de pagar num futuro muito incerto para a maioria da população portuguesa.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

PALMAS PARA ZECA AFONSO. FARIA HOJE 82 ANOS (2/8/1929)

AJUDEMOS A BANCA!

Toda a comunicação social se faz eco de uma redução significativa dos lucros da banca privada que opera em Portugal. Assim, os quatro principais bancos registaram uma quebra relevante (mais de 50% segundo o ‘Público’) no primeiro semestre deste ano. São eles o BPI, BCP, Santander Totta e BES.
Perante tamanha calamidade para o país, está este blog em condições de informar os seus frequentadores que vai ter lugar uma recolha de fundos, a nível nacional, de forma a compensar banqueiros e accionistas por tão grande prejuízo. Ainda não estão definidas as formas como o dinheiro vai ser encaminhado para os seus destinatários mas, apela-se, desde já, que se formem comissões de cidadãos que colaborem em tão meritória missão.
Daria uma péssima imagem do país que, por exemplo, pessoas como os srs. Ricardo Salgado ou Fernando Ulrich deixassem de viajar em carros topo de gama e, ainda por cima, tivessem de ser eles próprios a conduzir o seu automóvel.
O sufoco é tão grande que o (in)suspeito ‘Jornal de Negócios’ afirma hoje na sua edição online que “os tempos estão difíceis para a banca, e tudo o que os banqueiros não querem é que a troika faça mais exigências que os possam penalizar”. Compreende-se a reclamação porque os sacrifícios nasceram para se aplicarem aos trabalhadores por conta de outrem, pensionistas, funcionários públicos e pequenos empresários, para só falarmos dos principais grupos da sociedade que levaram, levianamente, estes últimos anos a “viver acima das suas possibilidades”. Aquisição de casa própria ou carro, não são luxos que possam ser permitidos a esta gente.
Portanto, apelamos aqui ao sentido patriótico de todos os portugueses a fim de apoiarmos a banca neste difícil momento que está a atravessar…

Luís Moleiro

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

GENERALIZAÕES PERIGOSAS

Sempre que surge a notícia de um acto de violência perpetrado por algum elemento de uma minoria étnica, religiosa ou estrangeira, de imediato surgem na imprensa online dezenas de comentários xenófobos em relação a ciganos, “pretos”, islamitas, naturais de outros países, etc. A cor da pele, o grupo étnico, a religião ou a origem geográfica de um criminoso fazem generalizar a todos os elementos do grupo as culpas dos actos levados a cabo por apenas um. Ultimamente, chegam-nos supostas informações da polícia de roubos ou actos de violência em locais por nós frequentados e que sabemos tratar-se de puras invenções. Os seus ‘autores’ são, invariavelmente, ciganos, negros, romenos ou outros estrangeiros do leste. Nestas histórias nunca aparecem portugueses nem gente de origem ocidental.
A intenção de gerar o medo para criar um caldo de cultura racista e xenófoba é evidente. O que se pretende? Certamente nada de bom porque se parte de um pressuposto errado.
O massacre de Oslo veio demonstrar que todas as culturas, todas as religiões, todas as etnias, todas as ideologias geram monstros, gente louca, como afirma Daniel Oliveira no seguinte texto transcrito da última edição do ‘Expresso’.

O NOSSO LOUCO
Os militantes islamitas deturpam uma religião pacífica? São apenas os grupos violentos que o fazem? Ou, indo mais longe, o islão é uma religião intrinsecamente agressiva? Perante esta três possibilidades, não tem a Europa de abandonar o pensamento ‘politicamente correcto’ tão ao gosto dos ‘multiculturalistas’ e defender a sua cultura e os seus valores humanistas? Andamos neste debate há pelo menos uma década. Até que um racista cristão põe uma bomba na sede do Governo norueguês e mata a tiro mais de 70 jovens socialistas, numa acção planeada, com motivações políticas e que nunca poderá ter sido preparada apenas por ele a direita nacionalista deturpa os valores europeus e ocidentais? São apenas os grupos violentos que o fazem? Ou, indo mais longe, a ideia de que é necessário combater a ‘islamização da Europa’ acabará sempre por degenerar em violência? Perante estas três possibilidades, não devemos abandonar o pensamento ‘politicamente correcto’ tão ao gosto da direita modernaça e defender o cosmopolitismo e os valore humanistas?
Nada disso. Aquilo que estávamos proibidos de dizer sobre os terroristas islâmicos – que se tratam de loucos – por tal significar uma desculpabilização da sua matriz ideológica e religiosa, passou a ser aceitável para falar de Anders Breivik. O que no fundamentalismo islâmico era ideologia e cultura na extrema-direita europeia é patologia. Poderia aproveitar o momento para dizer que a Europa, ao ser tão condescendente com o discurso xenófobo, desde que apresentado com a sofisticação retórica da defesa da democracia e da liberdade (de Pim Fortuyn e Geert de Wilders), criou o caldo para este massacre. Não o digo porque é falso. E porque seria oportunista e de mau gosto.
Sim, Breivik é um louco, sim, Osama Bin Laden também o era. Não, nem toda a extrema-direita europeia e nem todos os fundamentalistas islâmicos passam do pensamento ao acto. E isso faz toda a diferença. Mas uns e outros vivem de ideologias do ódio e alimentam o ódio dos loucos. Não, não há ‘valores ocidentais’. A Europa da liberdade é também a Europa do Holocausto. O cristianismo de Luther King é também o cristianismo do Klu Klux Klan. Assim como o islão de Aga Khan é também o islão da sharia. E a ideia de que há uma homogeneidade de pensamento, de valores e de modos de agir em cada cultura ou religião é a base de todos os supremacistas. Por isso, da próxima vez que se sentirem muito orgulhosos da vossa incorrecção política, pensem em Anders Breivik. Ele é também o Ocidente. Um louco, claro. Como os loucos que insultam o islão com as bombas que matam em seu nome. Todos temos os nossos. E em algum momento da nossa história eles até tiveram a simpatia da maioria.

Luís Moleiro