(…)
No sentido em que criam e clarificam um novo
separador de águas, uma nova fronteira entre a civilização a barbárie.
(…)
Existe,
seja qual for o pretexto, o direito de um governo cercar militarmente um
território de outro país impedindo os seus 2,2 milhões de habitantes de sair e
privando-os de alimentação e ajuda humanitária com o fim de os exterminar pela
fome e a doença?
(…)
Toda a
tentativa explícita ou implícita de legitimar ou banalizar este mal absoluto
que é o genocídio impune do Governo israelita, apoiado pelo Governo dos EUA, é
uma forma de cumplicidade.
(…)
[A
extrema-direita] não se dispensou, como é timbre do Chega acolitado a um
ministro da Defesa rastejante na defesa do genocídio e do Governo fascizante de
Israel, o recurso à mentira torpe, à manipulação informática grosseira e ao
insulto.
(…)
Na
realidade, eles não podem nem querem compreender precisamente que a questão de
Gaza se tornou hoje a decência de toda a forma de estar na política.
(…)
[A Mariana
Mortágua, a Sofia Aparício, o Miguel Duarte, o Diogo Chaves e os] 500
participantes na flotilha humanitária [com] a sua atitude corajosa e
clarificadora devolveram-nos a
esperança nestes tempos sombrios.
Fernando Rosas, “Público” (sem link)
Estamos perante a capitulação estratégica de um
partido fundador da democracia portuguesa [o PSD] (…) diante de forças
cuja retórica e práticas visam minar os alicerces desse mesmo edifício.
(…)
Essa inversão de papéis [com uma aliança
legislativa entre o PSD e o Chega na aprovação da lei
de estrangeiros] exige
escrutínio rigoroso.
(…)
Ao escolher negociar matéria sensível (…)
com um partido que desumaniza imigrantes, o PSD, sob a direção de Luís
Montenegro (…) sacrifica princípios fundadores em troca de viabilidade
parlamentar.
(…)
O Governo (…) simplesmente atua como se
eles [princípios constitucionais] fossem ornamentos retóricos dispensáveis
perante a urgência da governabilidade.
(…)
O
perigo não é uma rutura autoritária súbita, mas a normalização progressiva de
práticas que corroem a substância democrática enquanto preservam a sua
aparência.
(…)
A imigração concentra ansiedades sobre
identidade, segurança e mudança social e permite canalizá-las para um alvo
vulnerável.
(…)
[O Governo] reconhece implicitamente que a
extrema-direita [na pessoa do Chega] possui competência particular para decidir
quem merece integrar a comunidade política.
(…)
Essa concessão simbólica ultrapassa o conteúdo
técnico do diploma.
(…)
O
processo negocial estabelece um precedente perigoso: naturaliza a ideia de que
políticas identitárias restritivas são posições legítimas no espectro
democrático.
(…)
Dissolve-se assim a fronteira entre pluralismo
(…) e um relativismo moral que trata a dignidade humana como variável
negociável.
(…)
A retórica populista do Chega assenta na
deslegitimação sistemática das mediações institucionais.
(…)
Quando
dirigentes do Chega desafiam decisões do Tribunal Constitucional e questionam a
legitimidade de juízes não eleitos, não estamos perante excesso retórico:
trata-se de contestação deliberada do princípio da separação de poderes, pilar
de qualquer democracia liberal.
(…)
O custo desta cedência traduz-se na
deterioração do espaço deliberativo.
(…)
A
invetiva substitui o argumento; a demonização do adversário torna-se estratégia
legítima; a mentira deliberada integra o repertório do debate público.
(…)
O
Chega instrumentaliza procedimentos democráticos — voto parlamentar, retórica
da soberania popular — para promover uma agenda que, em última instância,
restringe o alcance da própria democracia.
(…)
O
perigo não é a defesa explícita de uma ditadura; é a erosão lenta das
salvaguardas que impedem a tirania da maioria.
(…)
Quando
o PSD valida esse interlocutor, não está a conceder apenas uma vitória
tático-parlamentar: participa ativamente na reconfiguração do espaço político.
(…)
A responsabilidade do PSD ultrapassa a presente
legislatura.
(…)
Se um
partido fundador já não distingue entre adversário legítimo e força corrosiva,
que sinal envia acerca do valor intrínseco das instituições?
(…)
Forças populistas autoritárias não deixam de
corroer instituições porque essa corrosão constitui a sua razão de existência.
(…)
Esperar
que o Chega se transforme num parceiro fiável é, na melhor das hipóteses,
ingenuidade; na pior, é cálculo que subordina princípios à vantagem imediata.
(…)
Cidadãos educados no desprezo pelas normas
dificilmente mobilizar-se-ão para as defender quando elas forem ameaçadas.
(…)
Recuperar
a centralidade dos princípios fundadores não equivale a dogmatismo imobilista;
significa reconhecer limites inegociáveis que preservam a própria possibilidade
da democracia constitucional.
(…)
A aliança
PSD-Chega na lei de estrangeiros não é uma anomalia passageira. Representa um
sintoma de reconfiguração mais profunda.
Domingos Caeiro, “Público”
(sem link)
O
crescente isolamento de Israel foi suficientemente explícito na Assembleia
Geral das Nações Unidas para convencer Benjamin Netanyahu a envolver-se num
eventual acordo.
(…)
Nestes dois anos, Benjamin Netanyahu não deu
sinais de pretender
negociar.
(…)
[Benjamin Netanyahu] lidera um
Governo cujo equilíbrio está nas mãos de dois ministros fanáticos, um dos quais
defende que o direito internacional não se aplica a Israel porque os judeus são
um povo eleito por vontade divina.
(…)
Se este
plano
tem algum mérito no imediato, é o de resgatar os reféns, pôr fim ao massacre e
de permitir a entrada de assistência humanitária no enclave.
(…)
Israel
não terraplena totalmente a cidade de Gaza, mas mantém a sua expansão nos
colonatos da Cisjordânia, uma palavra cortês para colónia, uma presença militar
em Gaza e inviabiliza um Estado palestiniano.
(…)
O Hamas não tinha outra solução que não fosse
negociar e tentar atenuar a sua capitulação.
(…)
Israel
jamais aceitará de bom grado direitos iguais para os árabes que habitam o país
e o direito de autodeterminação da Palestina.
(…)
O que nos reserva o horizonte pode ser uma
limpeza étnica por outros meios.
(…)
Os
palestinianos só podem contar com a indignação e solidariedade de quem tem a
consciência e a coragem de protestar contra a chacina diária da população civil
de Gaza.
(…)
A
exigência da libertação dos reféns não faz de ninguém fã de Netanyahu nem a
exigência do fim deste genocídio faz de alguém apoiante do Hamas.
Amílcar Correia, “Público” (sem link)
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