terça-feira, 19 de dezembro de 2017

O PROBLEMA DAS MIGRAÇÕES CONTINUA MUITO GRAVE


Apesar de não parecer, porque a comunicação social passou a dar-lhe menos importância, a verdade é que o problema das migrações continua na ordem do dia. Para isso, basta constatar o “avassalador número de 65,6 milhões de pessoas em todo o mundo que foram forçadas a abandonar as suas casas, apenas um dos números referidos por Pedro Góis (*) no seguinte excerto de um artigo de opinião que assina no Público de hoje.
Este ano, como aliás já nos anteriores, foram muito intensas as migrações humanas. Em todos os continentes a sedentarização tradicional, a idade da imobilidade em que temos a ilusão de viver, tem sido posta em causa por grandes movimentos migratórios tanto internos como internacionais. Atualmente vivemos uma época de grande e intensa mobilidade como nunca aconteceu no passado. As colossais migrações internas na China ou na India, as migrações internas em grandes áreas de consenso político como a União Europeia, os EUA ou a CEDEAO não param de demonstrar que Galileu era um visionário quando, referindo-se ao planeta, ao afirmar “Eppur si muove”, afinal, também a nós se referia.
A “crise dos refugiados” deu sinais de abrandamento na Europa Central e no centro da política europeia, mas não desapareceu. Moveu-se noutras direções, permaneceu nos países vizinhos das áreas de conflito, divergiu para países como a Líbia, o Egipto, o Sudão do Sul ou o Níger, encontrou novos atores políticos, perdurou no centro da atenção das principais agências humanitárias e de centenas de ONG. Novas “crises de refugiados” como as dos rohingya são apenas parte de um avassalador número de 65,6 milhões de pessoas em todo o mundo que foram forçadas a abandonar as suas casas. O maior volume de migrações forçadas de sempre. Entre estas pessoas estão quase 22,5 milhões de refugiados, mais de metade dos quais são crianças e jovens. Devemos ainda somar a estes números dez milhões de apátridas, seres humanos a quem foi negada a nacionalidade e o acesso a direitos básicos como educação, saúde, emprego e liberdade de circulação.
A intensidade (e volume) das migrações irá aumentar ao longo das próximas décadas. O conhecimento científico que detemos atualmente sobre as causas das migrações não deixa margem para dúvidas. Os desequilíbrios demográficos norte-sul, o envelhecimento demográfico de muitos países europeus, mas também da Rússia ou do Japão, a pressão demográfica em países como a Nigéria ou o Bangladesh e a urbanização ineludível do mundo são apenas algumas das condições potenciadoras de um aumento das migrações à escala global. As alterações climáticas, por si só, forçarão a migração em massa de um bilião de pessoas até 2100.
Não referimos ainda as causas e consequências de uma desigualdade social crescente entre ricos e pobres que, progressivamente, vai ocupando mais espaço no século XXI. O coeficiente de Gini tende cada vez mais para 1 (o valor da desigualdade perfeita) e afasta-se do 0 (o valor da igualdade perfeita) num número cada vez maior de países. Não falámos da irracionalidade de muitas das decisões políticas que negam as causas das migrações e pretendem condenar à imobilidade uma parte imensa da população mundial. Não falámos da corrupção que impede uma redistribuição progressiva da riqueza gerada em muitos dos países de origem dos migrantes. Não falámos da construção de muros, do negócio em que se tornou a segurança de fronteiras ou do aparecimento de uma indústria das migrações global com lobbies cada vez mais impactantes nas políticas de migrações internacionais.
(*) Sociólogo, Prof. universitário e investigador do CES

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