(…)
Quando
o que acontece agora é o maior horror que já testemunhámos, o que as pessoas
não foram capazes de ver, dizer, fazer há um ano importa pouco perante o que
podem ver, dizer, fazer agora.
(…)
Estamos todos atrasados para quem já não viveu,
mas sempre a tempo de algo que seja melhor do que nada.
(…)
Há
duas semanas, Borrell pôs em cima da mesa suspender o diálogo com Israel, como
forma de pressão (os ministros da UE rejeitaram).
(…)
Agora
apelou “a todos os membros da sociedade internacional e em particular aos da
UE” para não “minar o Tribunal Penal Internacional”, porque “é a única forma de
fazer justiça a nível mundial.”
(…)
As
decisões deste tribunal, lembrou Borrell, “não são políticas”, trata-se “de um
órgão jurídico formado por pessoas respeitadas, as melhores da profissão”.
(…)
Borrell
puxou a máscara do anti-semitismo. É um alto-responsável da UE a dizer o que tanta
gente diz há mais de um ano.
(…)
Foi o
próprio Netanyahu, claro, que aproveitou os megafones ao seu dispor como
primeiro-ministro de Israel para fazer a grande acusação de anti-semitismo ao
TPI, na noite de 21 de Novembro, pouco depois de serem emitidos os
mandados de captura.
(…)
[Já o governo francês] decidiu entregar-se de
bandeja a Netanyahu para que ele continue a abusar de milhões.
(…)
Em Israel, todo o espectro político-partidário
condenou a decisão do TPI (…) uma sociedade cada vez mais doente, muito
para além de Netanyahu.
(…)
O
bombista Biden, que já saía da Casa Branca como armador-mor de Israel, agora
sai também a insultar o mais alto tribunal das Nações Unidas.
(…)
Macron esteve metido no cozinhado do cessar-fogo no
Líbano, e não hostilizar Netanyahu pode ter sido parte do cozinhado.
(…)
O alvo do mandado não tem imunidade mesmo que o
seu país não reconheça o TPI. O compromisso dos estados é para com o
TPI. Para com a justiça.
(…)
Albanese (e outros) apontaram ainda a
contradição francesa quanto a Putin e Netanyahu. França não invocou imunidade
para Putin.
(…)
A França cospe no seu próprio túmulo: o túmulo
dos valores humanistas da Europa.
(…)
Milhões
de vidas são tiradas há muito na Palestina por causa da Alemanha, e a Alemanha
persegue hoje, cada vez mais, as vozes pro-palestinianas internas.
(…)
Hoje, Auschwitz é uma arma de destruição maciça
em Gaza.
(…)
O Holocausto é usado para o holocausto em
curso. O crime gera a culpa que gera o novo crime.
(…)
É preciso quebrar este círculo.
(…)
Dá dó
pensar que Portugal está aqui ao lado [da Espanha e da Irlanda] e podia ser
maior do que é, mas se mantém pequeno em tantas frentes.
(…)
Vi um vídeo em que vários israelitas insultam,
ameaçam, levantam mãos e dedos em riste a jovens pacíficos em vigília.
(…)
Espanha
tem uma reparação histórica para com os sefarditas anterior à de Portugal. Isso
não impede o governo de ser contundente com o genocídio que Israel leva a cabo.
(…)
Não é
por ter perseguido os judeus que a Europa agora tem de estar ao lado de Israel,
ao contrário, é por ter perseguido os judeus que a Europa agora tem de salvar
os palestinianos.
(…)
A incapacidade do mundo em parar este horror é
uma tragédia da humanidade, mas antes de mais da Europa.
Alexandra Lucas
Coelho, “Público” (sem link)
O caminho percorrido desde as sociedades
esclavagistas propiciou aos seres humanos poderem vender a sua força de
trabalho a troco de um salário.
(…)
Nesse percurso foram aprofundados os
pré-requisitos que sustentam a dignidade da pessoa humana e alcandorou-se o
trabalho a direito universal.
(…)
No presente, a utilização de novos instrumentos
de trabalho vindos do avanço tecnológico e científico (…) está
a servir, cinicamente, para estilhaçar direitos fundamentais do trabalho, e
aumentar a exploração de milhões e milhões de trabalhadores à escala global.
(…)
As pessoas apresentam-se perante as entidades
contratantes (privadas ou públicas) sem o mínimo poder para discutir o salário
e as condições da prestação do trabalho.
(…)
O valor que o mercado atribui ao trabalho é um
péssimo indicador para o estabelecimento de remunerações justas.
(…)
Os prestadores de cuidados às pessoas fazem um
trabalho de valor extraordinário, mas não reconhecido no mercado.
(…)
O trabalho sustenta a criação de valores de uso
e de troca. Mas, sob pena de se tornar alienante, não pode dispensar a
consciência ética e as regras deontológicas.
(…)
O trabalho precário e desregulado opõe-se às
necessárias qualificações dos trabalhadores e é inimigo de profissões e
carreiras profissionais.
(…)
O trabalho requer ensino, informação,
comunicação e cultura.
Mas
qual é o problema de não saber essas coisas “antigas”, cuja “utilidade” nos
nossos dias é entendida como escassa ou estar substituída por outras
“competências” ou “literacias”? Tudo e todo.
(…)
A
cultura não garante imunidade contra a crueldade, sabemos pelas bibliotecas de
Hitler e Estaline, que eram homens cultos, mas mesmo do ponto de vista do mais
comum dos homens mais vale tê-la do que não tê-la.
(…)
A miséria é obviamente a grande inimiga da
cultura dos homens comuns, que são duplamente pobres.
(…)
A
miséria foi a grande inimiga da cultura, de toda, a antiga e a moderna, mas nos
dias de hoje há outras formas em crescendo do obscurantismo em particular as formas modernas de
ignorância agressiva, ligadas à educação pelo lixo, pela cloaca das redes
sociais
(…)
A escola, que devia resistir, submete-se pelo facilitismo e pela
moda.
Pacheco Pereira, “Público” (sem link)
Quando
a ignorância de envergonhada passa à categoria de atrevida, a democracia não
passa de um instrumento legal para instalar autocracias.
Comentário ao
artigo de Pacheco Pereira acima mencionado, “Público” (sem link)