terça-feira, 8 de setembro de 2015

ÁGUA E SANEAMENTO COMO DIREITOS HUMANOS



O Direito Humano à Água e ao Saneamento foi reconhecido pelas Nações Unidas em 2010 e muitas vozes vêm manifestando o seu receio de que o século XXI seja marcado por guerras pelo controlo do precioso líquido.
A existência de um direito não tem qualquer significado se não passar a ser implementado na prática. No que diz respeito à água, é inadmissível que a nível da União Europeia ainda não se tenha ainda tomado qualquer iniciativa nesse sentido, o que pode levar á suspeição de que muitos interesses estão por de trás dessa ausência de vontade política. Não tenhamos qualquer dúvida de que o negócio da água é altamente apetecível e os exemplos sobram entre nós.  Por isso, foi muito bem-vinda a Iniciativa de Cidadania Europeia pelo Direito humano à Água e Saneamento que recolheu quase 2 milhões de assinaturas por toda a União Europeia e que hoje vai ser votada no Parlamento Europeu.
De um texto sobre esta problemática apresentado no Público de hoje recolhemos os seguintes excertos.
Vai ser votada hoje no Parlamento Europeu a Iniciativa de Cidadania Europeia pelo Direito Humano à Água e ao Saneamento. A Iniciativa que recolheu 1,884,790 assinaturas por toda a União Europeia, ultrapassando largamente o requisito de 1 milhão se assinaturas necessário para aceitar uma Iniciativa de Cidadania Europeia.
A Iniciativa requer que o Direito Humano à Água e ao Saneamento reconhecido no âmbito das Nações Unidas em 2010 seja legalmente implementado no espaço da União. O objectivo é que a UE aprove legislação que exija aos Estados-membros que assegurem e proporcionem o serviço de abastecimento de água potável suficiente e limpa e o serviço de saneamento básica a todos os seus cidadãos e cidadãs. Esta Iniciativa requer ainda que esta obrigação seja realizada, mantendo os recursos hídricos e os serviços de abastecimento de água e de saneamento excluídos das regras de mercado e do processo de liberalização.
(…)
A água é um bem vital e insubstituível e por mais que seja um bem escasso e tenha custos a sua captação, tratamento e abastecimento, nenhum ser humano deveria ver o seu acesso à água recusado, seja por que motivo for. Pelo menos é o que se esperaria num país democrático liberal, defensor, promotor e guardião dos mais altos valores da dignidade humana, como Portugal afirma ser.
O estado português tem a obrigação legal e moral de defender, promover e garantir o direito humano à água e ao saneamento. Revela-se assim de extrema importância, nesta fase de contracção e suspensão de diferentes direitos económicos e sociais devido às políticas de austeridade, que o direito humano à água e ao saneamento seja reconhecido pela UE, criando uma obrigação acrescida a Portugal e aos restantes estados-membros.
O silêncio dos governantes portugueses sobre esta temática preocupa-me e inquieta-me. O facto de existirem tarifas sociais em nada altera a realidade portuguesa. Muitos agregados familiares não se qualificam para usufruir das tarifas sociais e, no entanto, devido ao impacto da crise actual, não conseguem fazer face às suas despesas base de sobrevivência, incluindo do serviço da água e saneamento básico. O Direito Humano à Água e ao Saneamento não é uma questão apenas de países em desenvolvimento. A sua discussão é evitada em muitos países desenvolvidos, incluindo Portugal, porque se considera que a rede física claramente garante esse direito. O que poucos e poucas estão disponíveis para discutir é o facto de actualmente ser muito difícil para muitos (demasiados) agregados familiares manterem-se ligados a essa mesma rede de abastecimento. Este silêncio indicia uma falta de vontade política de encarar a realidade actual das famílias portuguesas.
(*) Paula Duarte Lopes, professora da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e investigadora do Centro de Estudos Sociais

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