quarta-feira, 5 de outubro de 2016

PRIMEIRO ANIVERSÁRIO DO INÍCIO DA CONVERGÊNCIA DAS ESQUERDAS


No momento em que passa um ano sobre as eleições legislativas que, em boa hora, levaram à actual solução governativa em Portugal, muita da opinião publicada tem este tema como referência. É o caso do artigo de opinião de Carvalho da Silva (CS) que transcrevemos do Público de hoje onde o investigador e Coordenador do CES em Lisboa se congratula com a convergência das esquerdas que permitiu afastar do poder o governo de direita, de tão má memória para os portugueses. Mas CS aproveita a ocasião para deixar também alguns avisos à navegação em algumas partes do texto como, por exemplo, quando se refere à necessidade de um “novo fôlego” para esta “boa solução de governação” em que “a valorização do trabalho e uma distribuição justa do rendimento sejam vetores fundamentais”.
A atual solução governativa – que implicou recentrar o papel do Parlamento, valorizando-o – e o programa executado pelo Governo PS foram úteis para o país e muito positivos para a esmagadora maioria dos portugueses. O PS libertou-se do “centrão” e, com o BE, o PCP e os Verdes, corporizou um novo sentido de responsabilidade da esquerda. Reconheceram, com oportunidade, a necessidade de convergência e têm sabido, não só manter-se fiéis aos compromissos, como dar contributos positivos, ainda que limitados, na busca de soluções para problemas inadiáveis.
Foi apropriada a opção pela “urgência de reparar heranças inadiáveis de reposição de vencimentos (…) de repor a normalidade no sistema educativo e no sistema de saúde”. Esses passos permitiram a recuperação de um pouco de fôlego à sociedade portuguesa, respondendo às justas expectativas da maioria dos portugueses, que continuaram conscientes da luta constante contra “o final do mês”. É provocatória a afirmação da direita de que o povo anda num contentamento pacóvio.
Entretanto, tornou-se premente uma nova articulação entre respostas conjunturais e a abordagem de grandes temas estratégicos. O diálogo político entre os partidos que suportam o Governo e, sobretudo, a mobilização de sectores sociais que vão muito para lá do espectro partidário é condição necessária e indispensável para um combate com êxito. 
Esta experiência de governação veio revelar a extrema dificuldade de conciliar recuperação económica e dos direitos sociais com constrangimentos europeus cada vez mais apertados. Para quem acreditava na possibilidade de flexibilizar as posições das instituições da UE através da diplomacia e argumentos razoáveis, a experiência da governação tem equivalido a uma dura aprendizagem. Contudo, tornou-se num aspecto positivo desta governação: o Governo cedeu em diversas ocasiões, mas até agora não quebrou. Com isso, adquiriu capacidade para enfrentar embates previsivelmente duros no futuro. A consolidação orçamental exigida por Bruxelas (na ausência de renegociação da dívida) traduz-se na compressão insustentável do investimento público e na contenção de despesa. Por outro lado, prosseguirá a pressão para a desvalorização salarial e a privatização parcial da segurança social, ou seja, a UE e o FMI toleram a reposição da “normalidade” em alguns domínios, mas querem a “anormalidade” a perdurar noutros.
Três domínios apresentam-se, pois, como decisivos para o sucesso desta solução política, no futuro próximo: o fim dos cortes nos serviços públicos, o relançamento do investimento público e a necessária regulação e proteção do trabalho. Serviços públicos de qualidade são condição para uma sociedade sã, qualificada e motivada. O seu reforço deve ser bem articulado com o relançamento do investimento público, real alavanca do investimento privado. Finalmente, a proteção do trabalho e a correção de algumas políticas sociais são essenciais para resolver o atual desequilíbrio social.
Esta boa solução de governação precisa de novo fôlego, voltada para a inclusão de todos num projeto nacional de desenvolvimento, onde a valorização do trabalho e uma distribuição justa do rendimento sejam vetores fundamentais.

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