(…)
O Livro Verde [sobre o Futuro do Trabalho] abria assim
finalmente a porta para que a lei exigisse de multinacionais como a Uber, a
UberEats, a Glovo, entre outras, a assunção das suas responsabilidades enquanto
empregadoras.
(…)
Parecia iniciar-se enfim um caminho para garantir direitos
básicos aos trabalhadores das plataformas.
(…)
Mas a proposta do Governo, uma das tais 64 para o “Trabalho
Digno”, não acolheu a formulação do Livro Verde que o próprio Governo
encomendara, cedendo ao lóbi feito por estas multinacionais.
(…)
Mas além de propor manter esse modelo que tem sido tão
criticado, o Governo prevê mesmo estendê-lo a toda a realidade do trabalho em
plataformas.
(…)
O sinal que o Governo parecia querer dar com o Livro Verde foi
assim atropelado pela sua proposta, que descartou as formulações do Livro para
insistir num modelo de precarização à medida das multinacionais.
(…)
O embrulho retórico [de Costa] esconde um conteúdo contrário ao
anúncio feito.
(…)
Não são menos reprováveis, no tal documento das 64 medidas, as
propostas sobre período experimental a trabalhadores à procura do primeiro
emprego.
(…)
[Tinha
havido] em período pré-Orçamento, um sinal do PS no
Parlamento em sentido contrário às propostas do Governo na concertação social.
(…)
[É agora líquido que] o PS não aceita tocar no alargamento do
período experimental e o destino final da proposta aprovada é, como aconteceu
no passado, ser chumbada pelo PS, pelo PSD e pelo CDS.
(…)
Mas tem sido assim. O que o Governo tem feito nestes últimos
meses no campo do trabalho é muito jogo político e um discurso que procura
vender gato por lebre.
(…)
As declarações do Primeiro-Ministro não batem certo com as suas
propostas e parecem até destinadas a ocultá-las.
(…)
É justamente nestas matérias sensíveis que deveria haver, em vez destas
cenas, um esforço à esquerda para medidas sérias e consistentes de combate à precariedade.
José Soeiro, “Expresso” Diário
Houve, na última crise, a ilusão de que se tinha aprendido com os
efeitos da desregulação financeira.
(…)
A realidade só prova alguma coisa se quem tem o poder de a
explicar no espaço público estiver confortável com o que ela prova.
(…)
Os ideólogos da desregulação que levou ao colapso bancário
venceram o debate. A crise financeira passou a ser conhecida como “crise das
dívidas soberanas”.
(…)
Com ingenuidade, muitos acham que a pandemia provou a necessidade
do Estado social.
(…)
Mas a narrativa do “despesismo socialista” começa a fazer o seu
caminho.
(…)
Os mesmos que exigiram mais apoio a empresas e cidadãos cobrarão
cada cêntimo gasto.
(…)
A demagogia da direita é ajudada pela do Governo, que embandeirou
em arco com o aumento do emprego, como se isso fosse plausível sem o reforço de
meios do Estado.
(…)
O objetivo é exigir (…) a transferência das funções sociais do
Estado para o privado, “mais competente”.
(…)
A última parte desta narrativa é mais difícil: o ataque ao SNS.
(…)
O objetivo é fazer o caminho que levará à conclusão ensaiada no
início da pandemia: o SNS está esgotado, o privado é a resposta.
(…)
A ‘bazuca’ ajuda o discurso, mas atrapalha a estratégia.
(…)
[O diabo] acabará por vir, porque a austeridade cíclica é da
natureza da nossa integração no euro.
Daniel Oliveira, “Expresso” (sem link)
O sector da saúde está em brasa há dois dias com a nova tabela da
ADSE. O que a polémica tem por detrás é sempre dinheiro.
(…)
[A exclusividade dos médicos] é um excelente objetivo. Que pode
resultar num fracasso.
(…)
Sou a favor da dedicação exclusiva dos médicos no Estado, mas
discordo do método em curso, por nele ver um aumento de custos provavelmente
inútil.
(…)
Os médicos fazem muitas horas extra, pelo que o Estado gasta de um
lado para poupar do outro.
(…)
Os privados vão continuar a precisar de médicos, pelo que vão
continuar a contratar ao público, pagando mais do que hoje.
(…)
O país não ganhará mais horas totais de trabalho médico.
(…)
O problema do SNS é também uma questão de gestão.
(…)
Já para o ministro das Finanças, a exclusividade dos médicos pode
ser a explosividade do Orçamento.
(…)
A economia resistiu relativamente bem à pandemia, mas agravando
desigualdades e muito à custa do Estado.
(…)
A saúde não tem preço mas tem custos. Sem boas medidas e boa
gestão é dinheiro atirado pela janela.
Pedro Santos Guerreiro, “Expresso” (sem link)
Não é necessário estar muito atento para perscrutar insinuações de
que sobre nós paira uma ameaça aos fundamentos de uma democracia pluralista e
liberal.
(…)
A democracia portuguesa terá certamente muitas fragilidades, mas
assumir que o poder político está empenhado em transformá-la numa outra coisa é
fantasioso e, em si, perigoso.
(…)
Uma resposta óbvia prende-se com o longo período de afastamento da
direita do poder executivo.
(…)
A direita social sente uma orfandade que se traduz em incompreensão
sobre os motivos profundos da sua incapacidade para alcançar vitórias
eleitorais.
(…)
A direita escolheu transferir a responsabilidade dos seus
falhanços para uma suposta degradação das qualidades democráticas do regime.
(…)
Que Carlos Moedas, (…) também não tenha resistido ao discurso do
medo é mesmo motivo para preocupação.
Pedro Adão e Silva, “Expresso” (sem link)
O Alentejo pode estar prestes não só a ficar irreconhecível como a
transformar-se num autêntico caso de estudo de frouxidão governativa,
administrativa e tecnofuncional sob a mais crónica e determinante entorse
ambiental do país: o desordenamento do território.
(…)
A paisagem não é uma espécie de suplemento ornamental para a
promoção turística. Ela situa-se no plano básico da segurança do país — garante
boa água, solo arável, biodiversidade e cultura.
Luísa
Schmidt, “Expresso” (sem link)
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