(…)
Muitos
países fazem depender a sua meta de neutralidade carbónica da compensação de carbono
e da capacidade de absorção das suas florestas, que compensam as emissões que
não conseguem reduzir.
(…)
Empresas,
instituições e cidadãos pagam pela plantação de árvores que irão absorver
carbono da atmosfera em quantidade equivalente às emissões que desejam
compensar (offsets).
(…)
Será que há, de facto, uma redução de emissões
com o sistema de compensação? Não, não há.
(…)
O
máximo que se consegue, caso as árvores sejam mesmo plantadas e não morram, não
sequem ou não ardam, é uma neutralização parcial das emissões, compensadas pela
captura adicional de carbono atmosférico.
(…)
Mas as emissões não diminuem.
(…)
Pelo contrário, as emissões tendem a aumentar.
(…)
O sistema de compensação dá a sensação de que o
problema fica resolvido.
(…)
Salvo quando as notícias nos lembram de que
as alterações climáticas continuam aí e cada vez mais intensas.
(…)
O
dióxido de carbono na atmosfera não pára de aumentar, tal como a temperatura
média global, que as catástrofes climáticas continuam a aumentar com consequências
cada vez mais graves.
(…)
A
analogia atrás referida sobre o significado real do sistema de compensação de
carbono relata uma situação hipotética em que alguém nos paga para sermos
vegetarianos, de forma a poder comer mais carne de vaca.
(…)
O
excesso de emissões associado à produção de carne bovina que come é compensado
pela redução das emissões associadas à nossa dieta vegetariana.
(…)
A esta analogia extraordinária podemos
acrescentar outras [como por exemplo]: o meu amigo paga-me
para eu andar de transportes públicos e fazer férias em parques de campismo,
para ele poder viajar de avião e ir de férias às Caraíbas, a Bali, às Seicheles
e ir visitar o Machu Picchu.
(…)
O meu
amigo é muito amigo do ambiente, pois com todas as medidas de compensação de
carbono consegue a sua neutralidade carbónica, já que as compensações anulam as
suas emissões.
(…)
Como
não uso nenhum sistema de compensação de carbono, eu sou o emissor-poluidor e
ele é verde, ele é sustentável e grande amigo do ambiente.
(…)
Contudo, na prática, eu já vou um a dois dias
por semana de bicicleta de casa para o trabalho (…) já viajo o mínimo de avião
(…) já sou quase vegetariano (…) compro muito pouca roupa e até aceito
roupa usada (…) sou pouco consumista (…) reparo tudo o que
me é possível reparar e envio tudo o resto para reciclar (…) até tomo
banho de água fria da Primavera ao Outono.
(…)
Se já
faço tudo isto e tenciono fazer ainda mais para reduzir a minha pegada de
carbono, porque é que o meu amigo me quer pagar? Não precisa, eu faço-o na
mesma.
(…)
Não deveria ele fazer esforço idêntico? E
assim, juntos emitiríamos muito menos.
(…)
Na
prática, com o seu método de redução da pegada de carbono, através das
compensações e depois das contas bem-feitas, o resultado não dá “resto zero”.
(…)
Na
prática, e mesmo com este grande esforço, não consigo reduzir abaixo das 3,2
toneladas anuais de dióxido de carbono (minha estimativa)
(…)
Mesmo assim, [será] muito superior às actuais
emissões anuais per capita de Guiné-Bissau, de 140 quilos ao ano.
(…)
Se
fizesse como o meu amigo, eu compraria créditos de carbono,
pagaria compensações no mercado voluntário de carbono e, por fim, conseguiria a
minha neutralidade antes de 2050, com muito menor esforço e sem me preocupar. E
a sustentabilidade do planeta, como ficaria?
(…)
Há um grande número de empresas à espera deste
mercado de carbono.
(…)
Governos
e multinacionais estão a fazer pressão para que se dependa cada vez mais deste
“negócio” das compensações de carbono e menos da redução efectiva de emissões.
Carlos Antunes, “Público” (sem link)
Quais
são os municípios em que se esgotaram os terrenos destinados à construção de
habitação e nos quais existe falta de habitação para responder quer às
necessidades de realojamento das famílias, em situação de indignidade
habitacional, quer à procura de arrendamento acessível?
(…)
Nos
municípios sujeitos a maior pressão urbanística e/ou com maior aumento dos
preços da habitação, quais são os que já esgotaram os solos disponíveis para
habitação situados nos seus perímetros urbanos?
(…)
Como
consequência da aplicação da Nova Lei de Solos em 2014, protelada através de
sucessivas alterações legislativas, quantos milhares de hectares de solos
urbanizáveis passaram a rústicos e em que municípios?
(…)
Que
experiência internacional valida a tese de que a liberalização do processo de
classificação do uso do solo concorre para uma efectiva diminuição do preço do
solo urbano e do preço final da habitação?
(…)
Como
já aqui
referi, a propósito da intenção liberalizadora presente no Mais Habitação, em
Portugal não há falta de terrenos para a construção de habitação que justifique
uma decisão política desta natureza.
(…)
Quantas centenas de milhares de habitantes é
ainda possível alojar, na situação actual, dentro dos seus perímetros urbanos?
(…)
Se
analisarmos as Estratégias Locais de Habitação aprovadas em todos os concelhos
da AML, verificamos que foram identificadas 37.381 famílias a viver em situação
indigna nos 18 concelhos.
(…)
Na AML
há terrenos urbanos suficientes para alojar dignamente todas as famílias
necessitadas e para construir todas as habitações necessárias para regular o
mercado de arrendamento. Falta apenas vontade política.
(…)
Por
que razão, em muitos dos municípios nos quais se regista um
aumento continuado dos preços da habitação, o investimento público em
habitação foi nulo nas últimas duas décadas?
(…)
Actuando
numa lógica que concorre para a manutenção dos preços especulativos e que
ignora as respostas necessárias – e possíveis, caso existisse vontade política
– às necessidades das pessoas, das famílias e das empresas.
(…)
A
actual estratégia de neutralização da Lei de Solos favorece os interesses do
sistema financeiro e dos especuladores, atraindo o capital estrangeiro, seja de
que origem for.
(…)
[O que agora se propõe] torna todo o
território do país potencialmente urbanizável.
(…)
O álibi das necessidades habitacionais é apenas
isso, um álibi.
(…)
Quantos
milhares de fogos irão ser construídos com esta nova lei que antes não poderiam
ser e onde? O Governo não sabe.
(…)
Na
verdade, ao concretizar esta alteração o Governo devolve ao urbanismo o seu imenso
poder corruptor, praticado com esplendor antes da crise do imobiliário, com as
consequências de todos conhecidas.
(…)
Vamos
ter a segunda edição dos “Donos disto Tudo” e da sua próspera corte de
vassalos, desta vez com uma relevante “expressão territorial”.
(…)
Como país somos incapazes de criar riqueza para
todos.
(…)
Mas criar ricos e muito ricos é mesmo a nossa
especialidade.
José Carlos Guinote,
“Público” (sem
link)