(…)
Apesar de Odair Moniz ter cadastro, o perfil que os vizinhos
hoje fazem dele contrasta com o da polícia.
(…)
Do outro lado, temos a PSP de Alfragide, que, num caso de
agressão e sequestro de seis jovens da Cova da Moura, em 2015, foi acusada
pelos tribunais de mentir.
(…)
Os agressores condenados em tribunal viram os seus processos
disciplinares arquivados, continuaram no ativo e alguns até foram promovidos.
(…)
Temo nunca vir a saber, com toda a certeza, o que aconteceu
na madrugada da última segunda-feira.
(…)
[A polícia] já mentiu antes e voltou a ser apanhada a fazê-lo
agora.
(…)
Quem guarda os que nos guardam, pressionado por uma opinião
pública facilmente incendiável, tem medo de impor a lei.
(…)
Infelizmente, não é só Ventura que, sem saber o que se
passou, condecoraria um polícia por ter morto um homem.
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Estes bairros são a nossa cidade invisível. Ela existe,
separada da nossa cidade, mal servida de tudo, exatamente para não ser vista.
(…)
A polícia tem o poder de impor uma espécie de “lei marcial”
que trata as populações como coletivamente suspeitas.
(…)
Cresce-se a aprender que é indiferente ser honesto ou
criminoso, porque leva tudo pela mesma medida.
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Quando, através do incitamento ao crime nas forças de
segurança, o líder parlamentar do Chega diz que “se a polícia atirasse mais a
matar, o país estava em ordem”, temos de recordar que nem a polícia aplica
sentenças nem elas incluem a pena de morte.
(…)
No nosso ordenamento jurídico, até a fuga por causa de um
crime menor é preferível à perda da vida de um cidadão.
(…)
Em democracias, o protesto também não se faz queimando
autocarros, provocando vítimas inocentes, apedrejando polícias e criando o caos
em bairros já tão maltratados.
(…)
Antes dos piores tumultos, houve, no bairro, uma vigília
pacífica. A quantos minutos teve direito, em comparação com as horas de
telegénica violência?
(…)
Quando olham para o que aconteceu na esquadra de Alfragide em
2015, verificando que ficou quase tudo na mesma, estas populações sentem que
fazem parte da nossa democracia?
(…)
Quando vier alguma coisa semelhante à ordem, é bom não
esquecermos que a alternativa ao Estado de direito é a barbárie.
(…)
Para estas populações o Estado de direito tem falhado
repetidamente.
(…)
O grito “sem justiça não há paz” não é uma ameaça. É uma
velha constatação de facto.
Daniel Oliveira, “Expresso” (sem
link)
As teorias queer são um conjunto de trabalhos académicos que
desafiam as normas sociais impostas à sexualidade e ao género.
(…)
O
termo “queer” surgiu como uma expressão de abuso,
violenta, mobilizada contra pessoas LGBTQIA+, sobretudo homens gays efeminados,
em contextos anglo-saxónicos, um termo análogo ao português “paneleiro”.
(…)
O
termo passou, no entanto, por um processo de reapropriação – por activistas,
organizações e pela academia, que o recuperam como termo de luta.
(…)
A chamada “ideologia de género”, uma denominação com origem
no Vaticano (…) tem vindo a tornar-se um hot topic no debate público.
(…)
Entendendo
a “ideologia” como um conjunto de ideias que compõem uma determinada
cosmovisão, não me parece de todo mal que a minha [ideologia do género] seja
interpretada como apontando para uma sociedade mais igualitária em termos do
enquadramento da sexualidade e do género.
(…)
Luís
Montenegro, prometeu, relativamente ao curriculum da disciplina obrigatória de
Educação para a Cidadania “reforçar o cultivo dos valores constitucionais e libertar esta disciplina das
amarras a projectos ideológicos ou de facção”.
(…)
Após
estas declarações o espaço público viu-se inundado por uma discussão
importantíssima – sobre as vidas de minorias sexuais e de género e,
especificamente sobre as vidas de pessoas trans e não-binárias.
(…)
Ao
longo das últimas décadas, imenso progresso tem sido feito no campo dos estudos
sobre as vidas e experiências de pessoas LGBTQIA+, a nível internacional, mas
também em Portugal.
(…)
Se tanto se discute a “ideologia de género” porque é que se
sabe tão pouco sobre ela?
(…)
Procurando
defender o ponto de vista da minha “facção” – de “ideólogos de género”, claro -
o conhecimento sobre sexualidade e género pode ser muito libertador, permitindo
saber mais sobre um campo historicamente negligenciado da experiência humana
nas sociedades ocidentais.
(…)
É
sempre importante repetir que a ideia não é tornar ninguém LGBTQIA+ – porque
isso é aliás impossível, mas promover um entendimento mais complexo da
sexualidade e género – inclusivo das experiências destas pessoas.
(…)
Face à
aproximação do discurso do PM às narrativas anti-género, vale a pena relembrar
que pessoas trans e não-binárias representam dos grupos mais violentados e
discriminados das nossas sociedades, não só hoje, como ao longo da história.
(…)
Neste
debate o que está em causa é a dignidade básica de minorias sexuais e de
género, aliás prevista no Artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e
que é agora questionada, mais uma vez, ao mais alto nível.
Pedro Fidalgo, “Público” (sem link)
A relação entre a família e a escola é sempre uma construção
de balanço e equilíbrio. Se há algo que não pode ser posto em causa é o
princípio de que nenhuma delas se substitui à outra.
(…)
Tomarmos a nossa família como padrão é replicar na escola um
juízo sobre nós mesmos, nossa conduta e princípios, o que não pode ser
tolerável nem admissível numa sociedade livre, plural e inclusiva.
(…)
Eleger a revisão da matéria dada na disciplina de Cidadania como
uma prioridade governativa, num momento e contexto em que se procura conter a
polarização e desocupar trincheiras, é alinhar com o programa, a retórica e os
objectivos da extrema-direita.
(…)
A violência doméstica, como o próprio nome indica, vive-se em
casa e talvez essa fosse a grande prioridade.
(…)
Levantar a bandeira das aulas de Cidadania como um dos focos
fundamentais de mudança é alimentar a ideia de há um monstro ideológico que
cresce visível nas salas de aula, quando o fundamento do que se ensina é
respeito e civilização.
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