sábado, 11 de janeiro de 2025

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O oceano não salva, nem no livro de McCarthy  [“A estrada”] nem na Califórnia, agora. Ontem à noite li na reportagem de Emily Witt para a New Yorker a descrição de uma casa a arder na praia.

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Na Califórnia as pessoas estão habituadas aos incêndios nas partes altas, nas colinas e florestas, mas o que está a acontecer desde terça-feira é outra coisa.

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E o mar está interditado, cheio de materiais tóxicos e detritos. O ar irrespirável. O céu negro de fumo. O horizonte em fogo.

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A água da torneira pode estar contaminada.

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Chovem cinzas e detritos — até Las Vegas, a centenas de quilómetros.

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A Casa Eames não é uma mansão, mas muitas das suas vizinhas são, ou eram.

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E o ainda-Presidente Joe Biden fez o que o povo esperava dele, cancelou a agenda no estrangeiro, despachou bombeiros, soldados, todos os milhões federais possíveis.

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Com a provável próxima almofada de oito mil milhões da venda de armas a Israel, que foi o derradeiro adeus de Biden ao seu outro povo.

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Quantos carros de bombeiros dá para comprar com cada bomba largada em Gaza?

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Enquanto a expressão “desastre natural” se repetia na cobertura dos fogos, uma das vozes a trazer o debate para as alterações climáticas foi a de Daniel L. Swain, cientista da UCLA.

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O que está a acontecer agora, explica Swain, é uma oscilação cada vez mais rápida entre extremos climáticos, aquilo que em inglês se chama “whiplash weather”, a chicotada do tempo entre dilúvios e secas.

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E isto não só resulta das alterações climáticas, diz Swain, como será cada vez mais intenso, com oscilações mais e mais abruptas entre dilúvios e incêndios. O derreter dos pólos tem impacto nos ventos.

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Ao mesmo tempo que todas estas casas e estruturas ardidas estavam cheias de materiais inflamáveis, derivados do petróleo, até literalmente à sola dos sapatos.

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Os fogos da Califórnia são uma espécie de última chamada sobre o que estamos a fazer aqui na Terra.

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Todos os combustíveis fósseis que continuam a ser queimados. Todos os milionários que continuam a viver disso.

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Um paraíso onde vivem muitos desses milionários, ou quem os influencia, tem agora um vislumbre do inferno.

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Dia 20 sai Biden, entra Trump, o negacionista que não acredita nas alterações climáticas, mas acredita em anúncios do inferno.

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Mas o facto é que ele entrou em 2025 a prometer o inferno.

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E não deixa de ser irónico que o inferno, de facto, apareça, mas na costa oeste dos Estados Unidos da América, e para dizer: não há planeta B.

Alexandra Lucas Coelho, “Público” (sem link)

 

Gente ilustrada, com títulos académicos [americanos], cargos de responsabilidade em empresas, apoiante de Trump, não só aceitava como repetia as mais absurdas teorias conspirativas do próprio Trump, e dos seus propagandistas.

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Muitas destas teorias conspirativas tinham directa relação com as eleições e o conteúdo da campanha de Trump.

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Uma das teorias mais absurdas associava o número de abortos num estado com as tempestades ou com outros flagelos naturais.

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Como é possível? Não só é como se tornou um elemento essencial para se perceber o que se está a passar na crise da democracia.

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A segunda pergunta, é se isto é apenas americano ou se é também português? E a resposta é sim, também é português.

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Ignorância é a palavra-chave, não a ignorância antiga, a que vinha do analfabetismo e da escassa escolaridade, e que tinha também uma variante a que hoje podíamos chamar conspirativa.

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Não se reconhece como ignorância, o que faz toda a diferença, e considera-se um saber, um saber perseguido.

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É uma ignorância que assenta em “enganados” e por isso tem um forte componente agressivo.

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O forte conteúdo social e político desta forma de ignorância agressiva é evidente, e o seu papel no populismo essencial.

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Não precisa de um argumento racional basta-lhe um meme.

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O problema para a democracia, como aliás para todas as instituições de mediação (…) é que muitos mecanismos tecnológicos com forte impacto social estimulam essa ignorância.

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Tudo o que se passa com a emergência desta ignorância tem raízes na sociedade, no modo da economia, naquilo que antigamente se chamava “luta de classes”, nos que ganham e nos que perdem.

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Como sabem os serviços de informação, as empresas de marketing e publicidade, todos os poderes que as [tecnologias] sabem usar.

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Entre todos os lubrificantes desta ignorância agressiva o primeiro é o deslumbramento tecnológico.

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O segundo lubrificante é um falso igualitarismo: eu não preciso saber nada sobre o tempo, para me pronunciar sobre as alterações climáticas.

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A capacidade de distinguir entre a verdade e a mentira (seja lá o que for a verdade, mas ela existe como procura), desaparece numa selva que coloca a conspiração ao nível do saber.

Pacheco Pereira, “Público” (sem link)

 

Antony Blinken, secretário de Estado da Administração Biden, concedeu no dia 2 uma entrevista de 50 minutos à jornalista Lulu Garcia-Navarro, do jornal The New York Times.

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Atingiu com Biden o topo da sua carreira, sendo hoje reconhecido como o verdadeiro presidente em exercício.

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As suas decisões, que já causaram morte e sofrimento em vários continentes, não parecem ter abalado este homem.

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Não foi a retirada do Afeganistão um desastre humilhante, deixando milhões de mulheres sem esperança nem futuro? Não. 

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Em relação à Ucrânia, fugiu da tese oficial da “invasão não-provocada”.

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Isso significa reconhecer que Moscovo, afinal, atacou preventivamente um país que se tornara um membro de facto da NATO.

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Blinken emudeceu quando interrogado sobre a sua responsabilidade pessoal no apoio dos EUA ao genocídio em curso de Israel contra o povo palestiniano. 

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A entrevista ignorou o facto de este ser o período mais turbulento de transição presidencial desde a eleição de Lincoln em 1860, na véspera da Guerra Civil.

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As hipóteses de pacificação geral oscilam entre o improvável e o quimérico.

Viriato Soromenho Marques, DN


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