quinta-feira, 29 de junho de 2017

NOVA LEI DOS BALDIOS APROVADA POR MAIORIA PARLAMENTAR



Quando se afirma que a actual fórmula governativa está esgotada porque já atingiu os seus objectivos, pretende-se subestimar a sua importância e esvaziar muitas metas que a direita não quer ver atingidas. Ao longo destes (quase) últimos dois anos tem-se provado que, passo a passo, ainda que num quadro adverso, tem sido possível reverter algumas malfeitorias que a coligação PSD/CDS tinha feito às populações. Uma delas foi a aprovação na anterior legislatura de uma lei dos baldios tendente a destruir paulatinamente esta forma de propriedade comunitária, introduzindo-lhe elementos tendentes à sua privatização”.
O Bloco avançou na actual legislatura com “uma nova lei que revertesse os anteriores passos privatizadores da maioria de direita e acabasse com os alçapões legais que privavam as comunidades dos rendimentos dos baldios”, como afirma Carlos Matias, deputado do BE no seguinte artigo de opinião que transcrevemos do Público de hoje. A referida lei acaba de ser aprovada na AR pela actual maioria de esquerda.
Os baldios são terrenos de gestão e uso comunitários, constituindo uma realidade multissecular de espaços tradicionalmente fruídos por comunidades locais. Ao longo dos séculos, foram objeto de cobiça dos mais poderosos e do próprio Estado Novo, sendo conhecidos os muitos episódios de apropriação, consumada ou não, dos bens possuídos por esta forma de propriedade comunitária. Todos estes ataques enfrentaram a contestação das populações e originaram revoltas.
Na anterior legislatura, a maioria PPD/PSD e CDS-PP aprovou uma lei para destruir paulatinamente esta forma de propriedade comunitária, introduzindo-lhe elementos tendentes à sua privatização. Por essa via, a direita satisfez interesses económicos que vislumbram na apropriação dos baldios uma nova fonte de rendimento, para benefício próprio, em detrimento das comunidades locais. Assim se explica todo o interesse em permitir a extinção de baldios, abrindo o caminho à sua privatização. Tudo assente na negação do princípio secular de que os baldios estão fora do comércio jurídico e são propriedade das comunidades locais.
Na atual legislatura, o Bloco de Esquerda avançou com uma nova lei que revertesse os anteriores passos privatizadores da maioria de direita e acabasse com os alçapões legais que privavam as comunidades dos rendimentos dos baldios. O Bloco tomou a iniciativa, apresentou e agendou um projeto-lei nesse sentido
Acaba agora de ser aprovada, na Assembleia da República, uma nova Lei dos Baldios, após meses de intenso trabalho e negociações que permitiram acordar um texto conjunto entre PS, BE, PCP e PEV. Trata-se de um diploma que responde ao essencial das preocupações das comunidades locais. Mas que irrita profundamente a direita.
Percebe-se, pois as mudanças são muitas. A nova lei respeita escrupulosamente o princípio constitucional da propriedade comunitária, assenta no respeito pelos diversos usos e costumes e defende a gestão comunitária de ingerências exteriores.
Apenas alguns exemplos:O melhor do Público no emailSubscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público.Subscrever ×
- Na lei atual podem ser celebrados contratos de cessão e exploração e também de arrendamento. A admissão de arrendamento corresponde a descaracterização dos baldios como propriedade comunitária, procurando-se assim confundir a propriedade comunitária com a privada. Na proposta aprovada não se admite o arrendamento de baldios.
- A lei ainda em vigor prevê a obrigatoriedade de planos de utilização dos baldios. A proposta aprovada afasta a possibilidade de, por lei ou regulamento, se impor condições mais gravosas nos planos de utilização do que as aplicáveis sobre propriedades privadas.
- No que se refere ao direito às receitas provenientes dos baldios submetidos ao regime florestal depositadas e ainda não recebidas, a lei atual prevê a prescrição do direito decorridos três anos a contar do início de Setembro de 2014. Na proposta agora aprovada, os compartes mantêm o direito a receber essas receitas.
- Na lei atual não consta menção ao direito às águas dos baldios. Segundo a proposta agora aprovada, as águas integrantes dos baldios podem ser usufruídas pelos compartes de acordo com os usos e costumes, sem prejuízo de as águas nele nascidas, que estiverem a ser destinadas a uso público, conforme prevê a lei 54/2005, serem públicas.
- Pela lei atual a cessação do regime de administração de baldios em associação com o Estado opera-se por deliberação da assembleia de compartes. Na proposta prevê-se que a cessação ocorre impreterivelmente também depois de decorridos 50 anos após a entrada em vigor do decreto-lei aplicável.
A nova Lei dos Baldios, agora aprovada, é de facto um passo em frente na recuperação do direito das comunidades aos seus baldios e defende-os de ataques privatizadores. Uma lei, só por si, não resolve todos os problemas, sabemo-lo. Esta não será exceção. Mas melhora radicalmente o quadro em que trabalham as comunidades locais e as associações de baldios. E há muito trabalho a fazer, para ajudar a ultrapassar casos de fragilidade na gestão que, de facto, subsistem.
Confiamos nos povos e na sua capacidade para encontrar novas formas de gestão amplamente democrática, sem tutelas, rentáveis, respeitadoras do ambiente e de que, muito justamente, beneficiem as comunidades.

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