(…)
É vasto o leque de contaminantes que nos são
devolvidos pela natureza depois de os termos lançado a ela.
(…)
Neste momento já pagamos uma pesada multa de
cerca de 200 milhões de euros por ano pelas embalagens de plástico que não
reciclamos.
(…)
Os trabalhos que nos esperam para consertar
esta tão viciada entorse da nossa condição ambiental são imensos.
(…)
Na segunda metade da década de 90 ainda
tínhamos cerca de 340 lixeiras a céu aberto a poluir solos e linhas de água e,
em poucos anos, conseguimos fechá-las todas.
(…)
[Atualmente] reciclamos apenas 23% dos RU [resíduos
urbanos], dos quais 14% são embalagens e papel, e 9% são resíduos orgânicos ou
biorresíduos.
(…)
Isto quando as metas europeias são claras: já
em 2025 a meta de reciclagem é de 55% e em 2030 será de 60%...
(…)
É também urgente diversificar os modelos de
recolha em função dos locais — do porta a porta aos contentores dos biorresíduos.
(…)
E ainda criar o sistema de pagamento em função
da produção do lixo não separado — o célebre PAYT — Pay as You Throw.
(…)
[Há que] requalificar algumas das unidades de
tratamento mecânico e biológico (TMB) em que se investiu há uns anos.
(…)
[É importante] a criação de um sentido de responsabilidade
pública, informada sobre o que é esse célebre monstro a que se chama ‘lixo’ e o
que cada um de nós tem de fazer com ele.
(…)
As próprias soluções técnicas ganham eficácia
com a mobilização cívica.
(…)
E, acima de tudo, envolver as escolas de todos
os graus de ensino a começar no pré-primário.
(…)
E se o lixo nunca vai embora, pois que fique
connosco, mas como riqueza.
Luísa Schmidt, “Expresso” online
As democracias liberais não estão a ser
destruídas por tanques ou golpes militares.
(…)
As democracias ocidentais enfrentam uma ameaça
sem precedentes, e a janela para a resistência eficaz fecha-se rapidamente.
(…)
[Trata-se de um diagnóstico rigoroso] sobre por
que razão as instituições democráticas estão a falhar na contenção de forças
autocráticas que operam com velocidade e coordenação inéditas.
(…)
O que presenciamos – dos Estados Unidos à
Europa – não é um ataque frontal às instituições democráticas, mas a sua
captura e esvaziamento gradual.
(…)
Um processo que mantém aparências formais
enquanto destrói a substância.
(…)
Os mecanismos de defesa que as democracias
construíram ao longo de décadas revelam-se trágica e surpreendentemente inadequados.
(…)
Por que razão estão [as democracias] a falhar
tão espetacularmente.
(…)
A resposta encontra-se num desalinhamento
estrutural profundo: as instituições democráticas foram construídas para um
mundo que já não existe.
(…)
[A] confiança institucional transformou-se na
nossa principal vulnerabilidade.
(…)
Estamos perante um colapso da arquitetura
institucional das democracias liberais.
(…)
O poder económico concentrou-se em corporações
tecnológicas que operam acima de qualquer jurisdição nacional.
(…)
Mais fundamentalmente, as instituições
democráticas pressupõem boa-fé dos atores políticos.
(…)
A separação de poderes funciona se todos os
poderes aceitarem limitações mútuas.
(…)
A independência judicial funciona se as
decisões judiciais forem respeitadas.
(…)
As instituições não se defendem sozinhas;
dependem de pessoas dispostas a fazer escolhas que envolvem perdas ou
sacrifícios para as preservar.
(…)
As democracias sempre conviveram com
divergências ideológicas intensas, mas partilhavam um terreno factual comum.
Essa base desapareceu.
(…)
Esta fragmentação não é acidental, é o modelo
de negócio das plataformas digitais.
(…)
[As democracias ocidentais] permitiram que
empresas americanas e chinesas se tornassem os principais mediadores do debate
político.
(…)
Desde os anos 90, as democracias ocidentais
facilitaram a saída de dinheiro saqueado de países autocráticos, permitindo que
fosse escondido em paraísos fiscais.
(…)
Este dinheiro corrompeu o
sistema financeiro democrático, criando indústrias inteiras que lucram com o
branqueamento de capitais autocráticos.
(…)
Quando esses fluxos começaram a financiar
campanhas políticas, a captura do sistema tornou-se inevitável.
(…)
As autocracias contemporâneas articulam-se
através de três vetores: interesses financeiros partilhados, manipulação
narrativa coordenada e cooperação militar.
(…)
Instituições democráticas operam através de
processos deliberativos que, pela forma como foram estruturados, são lentos.
(…)
Enquanto os tribunais analisam a legalidade de
uma ação, três outras já foram implementadas.
(…)
Cada ação prepara o próximo passo numa escalada
calculada.
(…)
As instituições europeias dependem de
unanimidade que transforma decisão em paralisia.
(…)
Quando um único país pode bloquear respostas
coordenadas, a capacidade de ação coletiva evapora-se.
(…)
A Europa permitiu que plataformas externas se
tornassem mediadores primários do debate político europeu.
(…)
Regulação tecnológica torna-se
questão de sobrevivência democrática, não de política industrial.
(…)
A
transformação autoritária não é ainda irreversível, mas a janela fecha-se
rapidamente.
(…)
[O
resgate virá] de cidadãos que compreendem que defendem não um partido, mas as
condições de possibilidade da democracia.
(…)
Nunca uma
captura institucional se auto-reverteu sem resistência organizada.
(…)
Ainda não
chegámos ao ponto de não-retorno. Mas podemos vê-lo no horizonte,
aproximando-se à velocidade que só a inércia democrática permite.
(…)
A
história não oferece rascunhos.
Domingos Caeiro, “Expresso” online
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