“Ao Presidente da República cabe, não palavras de depressão que desmobilizem os portugueses, mas uma palavra de confiança” disse Manuel Alegre num jantar de pré-campanha para as eleições presidenciais que reuniu, esta sexta-feira, cerca de 300 apoiantes, em Setúbal.
“E se a situação é insustentável, o que é que ele fez para impedir que a situação fosse insustentável?”, questionou Manuel Alegre, lembrando que o Presidente da República “não é eleito para avisar nem para prevenir e que tem poderes consagrados na Constituição”.
O candidato presidencial, apoiado pelo Bloco de Esquerda, pelo PS e pela Renovação Comunista, reagia às declarações do Presidente da República, que disse que o país estava numa “situação insustentável” e “sob escrutínio muito rigoroso, vindo do exterior, no que diz respeito à sua situação financeira”.
Afirmando-se contra os “silêncios prudentes”, Alegre disse que é preciso um país onde a economia esteja ao serviço das pessoas, “que não são números”, e não o contrário.
"Nós sabemos quais são as raízes desta crise. Sabemos que os estados se endividaram para salvar o sistema bancário e depois se endividaram ainda mais para atenuar os efeitos da crise. Sabemos agora também que aqueles que beneficiaram do esforço que foi feito pelos estados e pelos contribuintes estão a querer agora que sejam os contribuintes a pagar de novo aqueles bancos que engordaram à custa da compra da dívida soberana a juros e taxas fabulosos", declarou Alegre.
Reconhecendo que o país está a atravessar momentos difíceis devido à crise provocada pelo sector financeiro, Manuel Alegre defendeu que é preciso encontrar outras soluções para a crise, que não as que estão a ser defendidas pelos defensores do neoliberalismo e lembrou: “A crise também se deve aos atrasos sociais e de desenvolvimento do nosso país”, referindo-se ao tempo em que Cavaco Silva foi primeiro-ministro, no qual “se investiu mais em betão do que em pessoas” e que nessa altura a dívida cresceu 10%.
“Sabemos que a crise está a ser aproveitada para impor a toda a Europa e aos países mais frágeis um plano de austeridade que vai trazer mais recessão, mais desemprego”, afirmou.
Assim, perante esta crise, Manuel Alegre considera que há dois caminhos: a austeridade, a recessão, o desemprego, a desregulamentação, a diminuição dos serviços públicos sociais e a liberalização dos despedimentos, ou, em alternativa, uma reforma profunda, uma política de coesão económica, de coordenação económica, de coesão social, de criação de emprego e, sobretudo, de mais solidariedade.
“Se é mais Europa neoliberal numa Europa dominada pelo neoliberalismo, o Estado português tem uma palavra a dizer. Sabemos que somos um país pequeno mas temos que fazer ouvir a nossa voz”, disse.
“Não é possível que uma Europa que foi sonhada para trazer mais democracia, mais coesão, mais bem-estar para os povos europeus, seja agora aproveitada para fazer aquilo que, ao longo de dezenas de anos, a direita não conseguiu fazer: destruir o Estado social, destruir os serviços sociais, fazer diminuir os rendimentos do trabalhos, fazer diminuir os custos de produção à custa da diminuição dos rendimentos do trabalho”, acrescentou.
“Pacto de insubmissão contra este estado de coisas”
“Fomos uma geração de utopia”, disse Alegre citando Pepetela, referindo-se ao tempo em que derrubar o fascismo era o objectivo maior e a resolução dos problemas. O candidato recordou a sua geração para dizer que os jovens do presente vivem numa maior insegurança e incerteza – “é a geração da precariedade” - e declarou também que “não é com roteiros bonitos para jovens empresários” que se responde aos jovens desempregados, aos que vivem entre estágios não remunerados. “Não é dizendo: sejam empreendedores” que permitimos aos jovens ter uma casa, o primeiro emprego, ver respeitados os seus estudos e aspirações. Nesse sentido, o candidato presidencial apelou ao um “pacto de insubmissão” contra este estado de coisas, “contra a precariedade e a vida que estão a obrigá-los a viver”.
Manuel Alegre pronunciou-se ainda contra uma revisão constitucional que pretenda retirar da Constituição os direitos sociais, afirmando: “não quero uma revisão da nossa democracia, não quero uma revisão da nossa história, não quero uma revisão do nosso país”.
No jantar em Setúbal, em que contou com a presença da ex-ministra da Saúde Maria de Belém, mandatária nacional da sua candidatura, e da deputada do Bloco de Esquerda Mariana Aiveca, entre outras personalidades, Manuel Alegre concluiu que “tudo isto” vai estar em jogo nas próximas eleições presidenciais.