Uma investigação divulgada recentemente [dava
conta que no Brasil]: 75% trabalha exclusivamente para estas plataformas [como
a UberEats, a Glovo, a iFood ou a Rappi] e está conectado a duas aplicações
distintas ao mesmo tempo. 77% dizem que trabalham mais de 10 horas diárias,
quase metade 12 horas.
(…)
Não têm contrato ou vínculo à
plataforma, os rendimentos são altamente variáveis em função dos pedidos e dos
rankings, com uma percentagem significativa a ir para a multinacional que é
proprietária da aplicação.
(…)
Não têm proteção social, os acidentes
correm por sua conta e ficam entregues a si mesmos em caso de doença, incluindo
a covid.
(…)
Se reivindicam qualquer coisa, a
retaliação é simples: são bloqueados na aplicação, ficam “em branco”, sem que
lhes sejam encaminhados pedidos para o seu telemóvel.
(…)
Também em Portugal, o universo das
plataformas não tem parado de crescer. Segundo um estudo da Comissão Europeia,
envolve já cerca de 10% da população empregada.
(…)
Esta realidade dos 'emprecários' (aparentes
empresários na realidade precários), ficou escancarada com a pandemia.
(…)
A falácia do “transforma-te numa empresa
que és tu” parece ter sido posta a nu nos últimos meses.
De susto em susto, o cenário de uma
crise bolsista ganha terreno à medida que se agrava a divergência entre as
economias agora em recessão (depois de estagnadas desde 2008) e a valorização
dos ativos financeiros.
(…)
Ninguém sabe ao certo quando ou como
serão os mercados arrancados da sua exuberância, mas as razões que a sustentam
merecem reflexão.
(…)
Em ambos os lados do Atlântico, como do
Pacífico, os principais bancos centrais responderam à crise pandémica com
injeções bilionárias nos sistemas financeiros.
(…)
Sem novos meios de intervenção na
economia, as políticas públicas estão reféns dos instrumentos monetários e,
logo, dos bancos.
(…)
No privado, o crédito barato subsidia as
grandes empresas mas não chega às pequenas.
(…)
Para além dos bancos centrais, são agora
os contribuintes os fiadores da atividade bancária.
(…)
O pior da recessão ainda não chegou e já
a OCDE recomenda a retirada dos apoios aos salários.
(…)
Se as crises são todas diferentes, e
esta é mais diferente que as anteriores, os erros parecem repetir-se, uma e
outra vez.
Mariana
Mortágua, “Expresso” (sem link)
A metodologia que é seguida pelo INE
permite conclusões espantosas, como registar uma diminuição do desemprego
quando há mais pessoas sem trabalho.
(…)
O desemprego estatístico ignora o
desemprego real.
(…)
De janeiro a maio temos menos 249 mil
pessoas na população ativa, e não é porque tenham emigrado ou se tenham
reformado — são mesmo os novos desempregados da covid.
(…)
Entre os jovens, um ou dois em cada
cinco estará sem trabalho, e, para muitos, essa crise prolonga-se desde há dez
anos.
(…)
Esta metodologia é penosa. Transforma a
estatística, que devia ser um instrumento para medir a realidade, num biombo.
(…)
[A OCDE] esta semana, assinalando um
desemprego médio de 8,4% nas economias mais desenvolvidas, veio recomendar aos
governos que retirem as medidas de apoio a salários.
(…)
O desemprego é uma excursão dos
trabalhadores para “novos empregos”. Não temos de nos admirar se a norma
estatística favorece este conto de fadas.
Francisco Louçã,
“Expresso” Economia (sem link)
O que também começa a ser evidente é que
a situação se deve agravar no outono e mesmo já durante o verão, que costumava
ser um período de muito emprego sazonal. A razão é simples: o turismo
desapareceu.
(…)
As consequências serão grandes, tanto no
desemprego como nas contas de pequenas empresas que viviam deste fluxo.
(…)
Esta economia do turismo tem sido uma
especialização viciosa para Portugal.
(…)
[A sobre especialização em turismo] afunila
as capacidades produtivas e sugere que é fácil ganhar dinheiro sem responder
aos problemas mais difíceis de criação de uma economia coerente, inovadora, com
emprego qualificado.
Francisco Louçã,
“Expresso” Economia (sem link)
A novela EDP é um retrato exato de
Portugal.
(…)
O fio condutor é a fragilidade crónica
do Estado e a sua captura por interesses privados, em particular dos sectores
rentistas.
(…)
Um modelo de capitalismo luso-virtuoso:
iniciativa privada sem risco para quem investe, mas com custos intermináveis
para o contribuinte e consumidor.
(…)
Este mecanismo só funcionou, no entanto,
porque foi alavancado por uma teia promíscua de interesses, com participações
acionistas cruzadas, acompanhadas de migrações de protagonistas centrais de um
lugar-chave para outro.
(…)
Quando assistimos ao lento, circular e
repetitivo desenrolar da novela EDP, ficamos sempre com a sensação de que não
haverá desfecho e que, no fim dos episódios, estaremos apenas ainda mais
pobres.
Pedro Adão e
Silva, “Expresso” (sem link)
[O poder político] entregou duas
empresas estruturantes [EDP e REN] para a soberania económica a outro Estado,
garantindo-lhe dividendos que em muito poucos anos lhe devolverão tudo o que
pagou.
(…)
Para uma empresa que gere rendas,
interessam gestores com boas agendas de contactos políticos que segurem essa
vantagem.
(…)
A justiça nunca é imaculada de
mesquinhez. Mas num país pequeno é pior.
(…)
O improvável triângulo EDP-TIC-SBE exibe
a pequenez de um país que tem de começar a substituir a indignação ética pela
precaução política.
Daniel
Oliveira, “Expresso” (sem link)
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