(…)
O PS,
ao mesmo tempo que prepara a campanha eleitoral, bombardeia pelos seus canais
que a culpa “é do PCP e do Bloco”.
(…)
Que
haja angústia, preocupação e frustração com a situação a que chegamos é
perfeitamente legítimo. Qualquer pessoa do “povo da esquerda” a sente.
(…)
[A geringonça] morreu
na madrugada de 11 de outubro de 2019 – já com um novo Parlamento eleito –
através de um comunicado do Partido Socialista anunciando a recusa de qualquer
acordo escrito para a nova legislatura.
(…)
O PS
recusava a proposta do Bloco de um acordo escrito para os 4 anos, que
permitiria estabilidade política e enquadrar a aprovação dos 4 orçamentos da
legislatura.
(…)
A
estratégia de António Costa era não ter nenhum compromisso estável com a
esquerda, podendo escolher as alianças que entendesse na Assembleia durante o
ano, em geometria variável.
(…)
A
realidade provou que era uma estratégia insustentável.
(…)
[Os
partidos à esquerda do PS] não quiseram validar um documento em que, apesar de
toda a encenação mediática, não identificaram verdadeiramente a presença das suas
reivindicações e do que consideram ser o seu mandato.
(…)
[Trata-se
de] um documento, além do mais, onde não reconheceram as garantias de que
promessas incluídas no texto da lei orçamental são depois executadas,
transformando-se nesse caso numa fraude.
(…)
As
razões da esquerda e da direita contra este Orçamento são opostas.
(…)
Em
matérias que o PS sabia serem essenciais para a esquerda, o PS juntou-se à
direita para chumbar as propostas da esquerda e para manter regras que a
direita deixou na lei.
(…)
Aconteceu
em praticamente todas as votações da lei do trabalho (…), aconteceu nas regras
do debate democrático e parlamentar (…) ou em medidas de reversão de ruinosos
negócios da direita (…).
(…)
Assim,
a indignação seletiva sobre os “votos com a direita” resulta da falta de
atenção ou conhecimento desta realidade.
(…)
Há uma
acusação impossível [contra Bloco e PCP]: a de que o seu sentido de voto
resulta de um cálculo eleitoral.
(…)
A
haver eleições, poderão ser os partidos que menos beneficiarão delas, dada a
intensa campanha de vitimização do Governo.
(…)
Desde
2019, as abstenções da esquerda nos Orçamentos do PS não impediram a
extrema-direita de crescer.
(…)
O
crescimento das direitas, nomeadamente da sua componente mais radical,
alimentar-se-á do descontentamento popular.
(…)
Ficarmos
paralisados pelo medo e abrirmos mão do que achamos ser essencial para essas
políticas não é combater a extrema-direita, é ficar tolhido por ela, sem ter nenhuma
garantia do seu esvaziamento.
(…)
O que
tornou impossível a António Costa aceitar a reposição da lei laboral da autoria
de Vieira da Silva no que diz respeito aos despedimentos?
(…)
Por
que razão não pode haver um regime de dedicação exclusiva no Serviço Nacional
de Saúde, tal como propuseram Arnaut e Semedo?
(…)
Por
que não aceitou António Costa as propostas da esquerda sobre contratação
coletiva - como até a insuspeita ex-ministra socialista Maria de Lurdes
Rodrigues recomendou que se fizesse.
(…)
O que
não valerá muito a pena é alimentar a ideia de que a solução para o impasse
criado por António Costa em 2019 é cancelar a democracia pelos riscos que os
seus resultados podem produzir.
(…)
Aqui
chegados, mais do que recriminação mútua, precisamos de discutir soluções.
José Soeiro, “Expresso” Diário
[A
atrapalhação com o preço da gasolina] vai repetir-se, mas é mais grave que se
sobreponha a outras incapacidades estruturais, como a revelada pelas sucessivas
demissões em hospitais públicos ou pelos casos humilhantes de fecho de
urgências ou de blocos operatórios.
(…)
Onde
Costa pensa que o país suspira por lhe dar poder absoluto está a formar-se uma
onda de desilusão.
(…)
Os
casos da morte no SEF, das estufas de Odemira, do acidente com o carro do
ministro e tantos outros formam um magma de irritação que nunca vai ser
percebido pelas sondagens, nem muito menos pelos assessores que gravitam na
roda do poder.
(…)
O país
está cansado e os crisófilos estão a brincar com o fogo.
(…)
[A
crise estrutural do SNS] é tema tão essencial que levou o primeiro-ministro a
fazer uma das promessas da sua vida: em 2017 não haveria ninguém sem médico de
família.
(…)
Não
sei se S. Bento compreende a gravidade do desinteresse que manifesta pela
promessa falhada.
(…)
A
mesma crise estende-se a todo o SNS.
(…)
Se a
saúde vai ser o coração dos sistemas de proteção social, esta corrosão do SNS é
um problema democrático.
(…)
Impressiona
perceber que Costa não faz ideia do que está a dizer [sobre o fator de
sustentabilidade] e ignora que o dito fator já só se aplica num pequeno número
de casos.
(…)
Em
2017 e 2018 o fator de sustentabilidade foi sendo anulado para pensões
antecipadas com carreiras longas, em 2019 terminou para quem já tenha 40 anos
de desconto aos 60 de idade, mantendo-se ainda a outra penalização pela
antecipação.
(…)
A
garantia estrutural de um serviço de saúde com profissionais em exclusividade,
bem pagos e responsabilizados, um sistema de proteção social que dê segurança
às pessoas, uma economia qualificada com salários justos, é isso que fará um bom
Governo para o nosso tempo.
Francisco Louçã, “Expresso” Economia (sem link)
Quando, saindo das eleições de 2019, recusou fazer acordos escritos à
Esquerda, optando por navegar à vista de BE e PCP, Costa tinha um grande
objectivo: preparar o terreno para uma crise política em 2021
(…)
Após aprovar o primeiro Orçamento do
Estado (OE) da legislatura, o BE sai da solução governativa desencantado com as
negociações do OE21 e com a falta de cumprimento das promessas contidas e
inscritas no OE anterior que viabilizara.
(…)
No choque frontal com a realidade, o Governo
voltou a encarar as negociações do OE como um simulacro.
(…)
Perante a falta de vontade negocial do
Governo, BE e PCP rejeitam o OE22
(…)
A crise política que António Costa
ambicionava chegou.
(…)
No penúltimo ano parlamentar, PCP e BE
aprovaram a grande maioria das propostas do PS, tendo os socialistas votado
contra quase todas as iniciativas desses partidos. Estava escrito.
(…)
Acusar PCP e BE de tacticismo e de falta
de responsabilidade política e, simultaneamente, de terem sido reféns do PS
durante anos é uma contradição insanável.
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