(…)
Afinal de contas, o governo dos Açores parece não incomodar
ninguém [com a integração de fascistas no governo].
(…)
Integra-se, mas é um “risco”, como se a extrema-direita não
estivesse já instaladíssima e integradíssima; ou isola-se, mas é “ineficaz”,
como se não fosse a declamação do tremendismo que faz a fortuna destes
candidatos.
(…)
É certo que tanto quem defende a primeira solução como quem
pugna pela segunda aceita e, por vezes, até afirma que o problema é a política
social, o fracasso económico, a falta de perspetivas, a exasperação da pobreza,
a rotina criada pela sociedade que se fecha e que se pendura em desigualdades
escabrosas.
(…)
Mesmo sabendo que é a austeridade que cria a indignação de
que se alimentam as extremas direitas, que por sua vez proporão mais
austeridade e mais desigualdade, esse é o dogma dos nossos tempos e é o que
querem prosseguir.
(…)
Diz o nosso primeiro-ministro que a extrema-direita se
combate na confiança social - e depois recusa cumprir a lei e pretende impor
uma baixa do valor real das pensões e dos salários.
(…)
Portugal é o país mais desigual da Europa – mas a resposta é
reduzir os rendimentos dos pensionistas, punir os assalariados, subir os juros.
(…)
Se sabem que é esta a forma de cultivar o desespero que
agiganta os neofascismos, parecem muito empenhados em confirmar-se a si
próprios como os causadores da tragédia democrática.
Francisco Louçã, “Expresso” online (sem link)
Na noite eleitoral, em canais de notícias e telejornais
portugueses, os oráculos anunciavam a vitória do “centro-direita” [em Itália].
(…)
Como pode uma herdeira do fascismo italiano [Meloni]
liderar uma coligação de “centro-direita”?
(…)
Desde que não seja abertamente eurocética como Boris Johnson
e defenda a NATO, pode maltratar os emigrantes à vontade.
(…)
Chega as juras de amor de Meloni à União Europeia, à NATO e à
Ucrânia, carregando sem vergonha o legado de Mussolini.
(…)
[Cá e em toda a Europa] a direita sabe que terá de governar
com esta gente.
(…)
É a resignação. Já ninguém tem dúvida que, se precisar, o PSD
fará um acordo com a extrema-direita para governar.
(…)
Para preparar o caminho que todos sabem ser inevitável para a
direita voltar ao poder é preciso ir normalizando não só André Ventura como os
seus aliados europeus.
(…)
Mas se a conversa é sobre Itália, esta equiparação entre
comunistas e fascistas torna-se especialmente insultuosa (…) depois do “compromisso histórico” que [Aldo Moro] fez com os
comunistas, que ajudaram a construir a democracia italiana.
(…)
A normalização da extrema-direita é uma estratégia de curto
prazo para o centro-direita. A longo prazo ela tem-se revelado
sempre suicida.
(…)
Essa normalização tem-se feito sempre através da absorção dos
valores da extrema-direita.
(…)
O nazismo e os seus crimes contra a humanidade só foram
possíveis numa sociedade em que o antissemitismo estava disseminado.
(…)
É este caldo de tolerância com a intolerância que a direita
outrora moderada está a ajudar a cozinhar.
(…)
Acabarão por ser absorvidos por aqueles que julgam que vão
absorver, liderados por quem julgam que vão liderar.
(…)
[Em Itália] foi Georgia Meloni que absorveu o voto do campo
da direita.
(…)
Mas o dado que não podemos esquecer é este: nas democracias
ocidentais, a desigualdade atingiu, desde 2008, níveis que só conheceu em 1929.
(…)
E é a desigualdade que deslaça a comunidade e torna a
democracia inviável.
(…)
O centro-esquerda continua a acreditar que se for a última
fronteira do cordão sanitário à extrema-direita manterá na sua mão um seguro de
vida. Não. Esse seguro de vida caducou.
(…)
O que a esquerda italiana tem de se perguntar é como vale
hoje 26%, e o Partido Democrático [PD] 20%.
(…)
Como aconteceu isto a uma das mais poderosas e vibrantes
esquerdas da Europa.
(…)
Mas a descaracterização de um partido [PD] feito da amalgama
do antigo PCI, democratas-cristãos e neoliberais nunca permitiu que escolhesse
entre a social-democracia e o neoliberalismo.
(…)
Perante as primeiras gerações que sabem que viverão pior do
que os seus pais, é preciso saber que a desesperança é tão perigosa para os
governos democráticos europeus como para a teocracia iraniana.
(…)
A esquerda tem de propor uma forte redistribuição da riqueza
para salvar democracia.
(…)
O remédio contra ela [extrema direita], [redistribuição da
riqueza], que resultou noutros tempos, foi retirado do mercado.
Daniel Oliveira, “Expresso” online
(sem link)
Não se pode ignorar que, politicamente, extrema-esquerda tem
um significado e que ele [Luís Montenegro] não se coaduna com estes dois
partidos [BE e PCP].
(…)
São
defensores das liberdades individuais e colectivas, não apelam à sublevação
revolucionária ou à luta armada ou qualquer outro fim ou meio que não esteja
previsto e consagrado na Constituição.
(…)
[Montenegro
insiste nesta classificação] porque lhe dá jeito.
(…)
Montenegro
precisa de desdramatizar o perigo e de justificar aos portugueses a sua
intenção de chegar a entendimento com o partido neofascista e racista
português.
(…)
[Montenegro]
faz contas à necessidade que tem do previsível resultado eleitoral do Chega
para chegar à governação, mas também é obrigado a fazer contas à debandada de
todos aqueles que, sendo de direita, são também antifascistas e sérios.
(…)
Para
chegar ao poder não hesitam em colocar os portugueses numa posição de sujeição
política e executiva a uma força que a grande maioria considera repugnante e
antidemocrática.
(…)
Luís Montenegro quer fazer desse problema [crescimento da
extrema-direita] a sua solução.
(…)
O
tempo chegará em que [os eleitores da extrema-direita] serão esclarecidos, mas,
para nosso mal, estamos precisamente na fase contrária que, ao que parece, está
para durar.
(…)
O
financiamento do partido [de extrema-direita] pelas famílias Champalimaud e
Mello, de que dava conta uma peça da revista Sábado,
é bem ilustrativo do quanto, em vez de partido anti-sistema, é um partido
comprometido com as suas bases mais bafientas.
(…)
[Montenegro] não emprega as suas energias a
combater a extrema-direita e não tem qualquer confiança na sua própria
liderança e na possibilidade de chegar à governação sem este entendimento.
(…)
Não é
verdade que o PS tenha governado com a extrema-esquerda, mas é verdade que o
PSD quer governar com a extrema-direita. E é imperdoável.
Carmo Afonso, “Público” (sem link)
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