(…)
É na lei do trabalho e na saúde que o diálogo sobre soluções para
o país tem encontrado os maiores obstáculos.
(…)
Os combates de Lenine pela participação nos parlamentos ou contra
os compromissos de Kautsky e Adler com “os bandidos da sua própria burguesia”,
tendo relevância histórica, não são uma bússola para o Orçamento português.
(…)
Faz sentido, por exemplo, mantermos as regras do subsídio de
desemprego que vêm do governo PSD-CDS quando, como identificou Paulo Pedroso
num recente estudo do Instituto de Políticas Públicas, essas regras
deixaram 42% dos desempregados numa situação de pobreza?
(…)
Por que razão havemos de enfrentar a presente crise do emprego com
as regras e compensações por despedimentos da direita, regras que aliás foram
contestadas pelo PS, em 2012, por irem “além da troika”?
(…)
[Sentimos o problema da esquerda] quando o PS exigiu maioria
absoluta para acabar com a geringonça ou quando, logo depois, recusou a
proposta do Bloco de um acordo para a legislatura.
(…)
[O Bloco] procurou um acordo para soluções estruturais e de longo
prazo, desde logo nas áreas do trabalho, da proteção social e da saúde.
(…)
[Boaventura Sousa Santos] recomendou ao Bloco que [aceitasse] medidas
emergenciais temporárias, (…) deixando assim cair as propostas na área do
trabalho e da saúde e subscrevendo o Orçamento.
(…)
Deveria o Bloco ter aceitado o “roubo” [que constitui o pagamento
ao Novo Banco] e abdicado de “proteger mais eficazmente a saúde dos
portugueses” ou de uma “protecção robusta do emprego”?
(…)
[O argumento de que a direita pode ganhar eleições] encerra
qualquer debate, porque essa hipótese é desligada do programa e das respostas
concretas que a esquerda é capaz de apresentar agora.
(…)
A urgência que temos é outra – e não lhe respondemos desistindo de
respostas nos temas mais difíceis, mas que são os que respondem pela
mobilização da maioria do povo: emprego e saúde.
(…)
Foi também a esse perigo [do crescimento da direita] que o Bloco
procurou responder e foi para contê-lo que insistimos em negociar algumas
medidas que, como Boaventura reconhece, são “exigências justas”.
(…)
Atrasar ou recusar as medidas que sejam sentidas e reconhecidas
pela população é que pode contribuir dramaticamente para entregar o futuro à
direita.
(…)
As futuras soluções de Governo passarão necessariamente por
convergências e, para construí-las, precisamos de uma esquerda firme para
determinar uma nova agenda.
(…)
Com 700 mil desempregados e a desagregação que a longa pandemia
provoca, um orçamento estruturalmente contracionista ou a corrida para os 3% de
défice são receitas para o desastre.
(…)
Ao elevar o patamar da negociação, [a esquerda] está a dizer ao
país que o bom governo terá de responsabilizar-se por esse programa de saúde e
emprego.
José Soeiro, “Expresso” Diário
Um cidadão foi barbaramente assassinado às
mãos do Estado português por
inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que tentaram depois encobrir o crime.
(…)
No final de março, mal o país se confrontou
com a macabra notícia, o ministro foi chamado ao Parlamento pelo Bloco de
Esquerda.
(…)
Ficou a promessa de uma investigação célere,
do apuramento de todas as responsabilidades, de consequências sem olhar a quem
e de mudanças na estrutura do SEF. Passaram oito meses e não vemos resultados.
(…)
Foi preciso a viúva vir a público denunciar
que nem a transladação do corpo foi assegurada pelo Estado português.
(…)
Um “offshore” de impunidade, é assim que as associações de defesa dos
imigrantes se referem às instalações do SEF.
(…)
As violações da lei eram referidas por
instâncias europeias e condenadas pela provedora de Justiça ao longo dos anos.
(…)
O relatório europeu anual The Asylum Information
Database, gerido pelo European Council on Refugees
(ECRE), denunciou que em 2019 houve crianças a passar quase dois meses em
detenção.
(…)
Os problemas do SEF (…) são inequivocamente
sistémicos.
(…)
Mas o tempo passou, a violência piorou até
que alguém morresse nas instalações do SEF e, mesmo depois disso, nada de
estrutural foi feito até hoje.
Pedro Filipe
Soares, “Público” (sem link)
O primeiro sinal da fraqueza do Acordo de
Paris viu-se nos dias seguintes a 12 de Dezembro de 2015. Nas
bolsas, as empresas petrolíferas não colapsaram, os activos de carvão, petróleo
e gás, assim como as empresas poluentes, não viram o seu valor cair.
(…)
As opções civilizacionais associadas com
travar a crise climática não estavam em cima da mesa em Paris.
(…)
Desde então, as emissões só pararam de
aumentar em 2020, e foi por causa da crise económica associada à pandemia.
(…)
As empresas fósseis continuaram a beneficiar
não só de financiamento privado, mas também de financiamento público.
(…)
Das poucas coisas realmente boas saídas do pós-Acordo
de Paris foi o relatório encomendado ao IPCC [Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas] em 2018.
(…)
Os governos responderam embelezando as contas
para apresentar em público.
(…)
Estamos obviamente a falar de cortes muito
abaixo do necessário.
(…)
O Governo português é versado nesta prática
[de mutilar habilmente o que é necessário fazer].
(…)
Não há nenhuma maneira de cortar gases com
efeito de estufa que não seja cortando gases com efeito de estufa.
(…)
[Paris] é um arranjo que nada resolve
mas que serve de pano de fundo para toda a espécie de anúncios inconsequentes,
que no caso da crise climática são crimes contra o nosso futuro colectivo.
(…)
Não há qualquer dúvida que a melhor coisa que
surgiu no pós-Acordo de Paris foram as mobilizações globais pelo clima de 2019,
que surgiram em contraposição ao impotente acordo.
João Camargo, “Público”
(sem link)
As circunstâncias que
envolvem a morte do cidadão ucraniano no Aeroporto de Lisboa, a 12 de Março,
foram denunciadas entre o nevoeiro político e a semi-indiferença da opinião
pública, às voltas com o início da pandemia e o confinamento.
(…)
Durante quase um ano,
decifrámos o que aparenta ser a face visível de um modelo de práticas
discriminatórias e violentas, de abusos discricionários e de tortura num Estado
democrático.
(…)
Sem qualquer apontamento,
sinal de preocupação ou manifestação de pesar por parte do presidente da
República, habitualmente solícito em todas as ocasiões, adensou-se o silêncio.
(…)
Já ninguém olha para esta
morte como um caso isolado.
(…)
O ministro que tutela o
SEF, incapaz de estar à altura dos mínimos de decência que esta situação
requeria, culpa a Comunicação Social, os comentadores, o Mundo, todos nós, pela
sua letargia.
Um dos efeitos colaterais
resultante da adesão de Portugal ao Mercado Comum foi a instalação de uma
cultura de transferência/dependência dos "dinheiros europeus" que
permeia o fundamental do tecido empresarial e o próprio Estado.
(…)
As transferências seriam
supostamente temporárias e durariam apenas o tempo necessário para que o país
convergisse com a média da União, em níveis de rendimento e bem-estar.
(…)
A UE surge,
recorrentemente, envolvida em negociações feitas à beira do abismo,
apresentando-se como de vida ou de morte, quer para a própria União, quer para
estados-membros que, como Portugal, se tornaram dependentes de transferências
financeiras permanentes.
(…)
O tempo urge e a União
acumula assuntos bloqueados.
(…)
Em que assuntos a UE mostra
capacidade de decisão? Naqueles que deveriam dizer respeito aos estados, sobretudo
quando se trata de países com frágil poder negocial.
(…)
Os portugueses precisam de
(…) dispensar quanto antes a dependência castradora da semanada europeia.
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