(…)
A
dificuldade em olhar com verdade para o passado colonial não vem de hoje nem se
revelou apenas neste caso.
(…)
Esse
pacto [de silêncio sobre a guerra] manifesta-se nas “burocráticas omissões”
como a que ficou patente no recente voto de pesar do Parlamento, validado pela
direita e pelo PS.
(…)
Este
“pacto de silêncio” tem-nos privado de uma abordagem madura do legado colonial
e dos padrões que herdámos dele e que hoje se exprimem diversamente.
(…)
Quem
ousa questionar essa narrativa [das teses lusotropicalistas] e esse
revisionismo histórico, logo é apelidado de querer “politizar a história”.
(…)
Como
se os processos de desmemória que abrem a porta à banalização do colonialismo e
do racismo não fossem a mais política das escolhas.
(…)
À
recriminação das tentativas de promover uma leitura crítica do passado no
espaço público, tem-se somado ainda a fabricação histriónica de falsas
polémicas.
(…)
Este
silêncio e esta polarização tem vários efeitos de invisibilização.
(…)
E
concorre, finalmente, para a banalização e a legitimação da extrema-direita
atual.
(…)
Está
aí, no namoro explícito entre dirigentes do PSD e Ventura.
(…)
E está
aí, também, no discurso de uma direita intelectual que tem vindo a relativizar
de forma explícita o regime constitucional e a própria democracia.
(…)
Eis,
no seu esplendor, a miséria de espírito, a abdicação democrática e a
infantilidade política destas elites.
(…)
Felizmente,
há um outro país que (…) está disposto a lutar por democratizar a
democracia, em vez de abdicar dela.
José Soeiro, “Expresso” diário
Um
apelo público veio propor a abertura das escolas, a começar pelas dos mais
pequenos, a partir de março.
(…)
O que
mais qualifica [os signatários do apelo] não é a profissão ou a ciência, é
simplesmente procurarem responder às dificuldades com o bom senso.
(…)
Ainda
nem um quinto da população está protegida.
(…)
Andamos
longe da imunidade de grupo e nem sabemos quanto tempo nos protegem estas
barreiras.
(…)
O
problema desta nova estratégia [que passaria por aumentar massiva e rapidamente
a testagem de todos os contactos de pessoas infetadas] é que foi
anunciada antes de haver capacidade para a aplicar ou mesmo sem preparação
técnica adequada.
(…)
Quanto
ao recrutamento e treino de rastreadores, que devia ter sido multiplicado desde
março passado, parece haver um atraso incompreensível.
(…)
Espero
que o Governo não ignore que estamos a perder tempo e que cada dia que passa é
pior para a vida de centenas de milhares de crianças e jovens.
(…)
A
escola só funciona presencialmente e não há ensino envolvente que não seja na
sala de aula.
(…)
Quanto
menor a idade, mais determinante é essa aprendizagem na comunidade escolar.
(…)
As
sugestões daquele apelo para a abertura das escolas são certeiras: menor
horário e mais diferenciado por anos letivos, vacinação de professores e
funcionários, turmas mais pequenas.
Francisco Louçã, “Expresso” Economia (sem link)
É
ocioso perguntar (…) se o exército norte-americano condecora os torcionários de
Abu Ghraib.
(…)
Houve
fanfarra na homenagem [a Marcelino da Mata], com partidos de direita a
disputarem a primeira fila e todas as autoridades a curvarem-se
cerimoniosamente.
(…)
[Houve
quem explicasse que] em todo o caso, há mérito no paralelo entre essa coisa de
matar em nome da raça e a contestação da ganância dos hospitais privados, que
fecharam as portas a doentes no início da pandemia. Parece piada.
(…)
Além
do medalhado, o episódio dos florões da Praça do Império é outro momento desta
vertigem da saudade passadista.
(…)
E, se
tudo parece uma caricatura, um número de Parque Mayer, o caso revela de que se
ocupa esta direita.
(…)
Há a humilhação nacional com o elogio da
ditadura, perdoemos-lhes, pois, de noite, todos os gatos são pardos.
Francisco Louçã,
“Expresso” Economia (sem link)
Em janeiro estavam registadas no Instituto do Emprego e Formação
Profissional cerca de 420 mil pessoas desempregadas. São mais 100 mil do que em
janeiro do ano passado.
(…)
Foram apanhados por esta vaga de desemprego sobretudo trabalhadores em
situações de precariedade.
(…)
[São] vítimas de uma dupla desproteção:
não têm vínculo com as empresas para quem efetivamente trabalham e são
excluídos, total ou parcialmente, da proteção social.
(…)
Todos os dias aparecem aos milhares, sem
rendimentos ou com magríssimos apoios sociais criados durante a pandemia.
(…)
A pandemia realçou o lugar e o valor
central do trabalho.
(…)
Mas é uma fraude dizer-se que no futuro
não haverá empresas e que os trabalhadores terão de passar a ser
"colaboradores" sem contratos de trabalho, pendurados em plataformas
comandadas por algoritmos.
(…)
Em muitas plataformas os trabalhadores já
hoje são forçados a baixar o custo das tarefas a que podem concorrer até ao
limite do suportável ou até ao prejuízo, na esperança de no futuro serem
selecionados para outras tarefas.
(…)
A extensão da proteção social em caso
algum compensa a perda de segurança resultante da inexistência de contratos de
trabalho.
Mesmo que criminosa, a História não tem
direito à prescrição porque vive sob o jugo da memória. E essa não esquece.
O facto de se manter uma amnésia induzida sobre
este acontecimento histórico [guerra colonial] faz com que ele regresse
sucessivamente, e de formas nem sempre expectáveis.
(…)
O argumento formalista, [do voto de pesar pela morte de
Marcelino da Mata] que consiste no elenco das condecorações, omite que foram
dadas por um regime cujo derrube, justamente no quadro de uma derrota política
na guerra, é a razão da democracia que temos.
(…)
Se é verdade que a guerra é a guerra, também não é certo considerar
que todos aqueles que nela participaram se regiam pela mesma bitola ou tiveram
os mesmos comportamentos [que Marcelino da Mata].
(…)
Com efeito, a guerra colonial foi o desfecho tardio de um
império já anacrónico.
(…)
O que é que Portugal pretende fazer para enfrentar, de forma
cabal, os persistentes silêncios sobre este passado?
Miguel Cardina, “Público” (sem link)
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