(…)
O Governo israelita sabe que tal [a demissão do secretário-geral
da ONU] nunca ocorreu nem ocorrerá e, no entanto, sente-se confortado
nesta cavalgada contra a ONU.
(…)
Já o mesmo embaixador tinha insultado Guterres por, ao querer
abrir os portões daquela prisão para levar medicamentos e água, estar a
“alimentar terroristas”.
(…)
Passou a clamar pela demissão pelo facto de ter sido recordado que
Israel nunca cumpriu as resoluções da ONU.
(…)
Netanyahu sente-se hoje o deus da guerra, capaz de transformar o
apartheid numa zona de terra queimada.
(…)
Matar, é o que repete.
(…)
[Há uma nova dimensão que não deve ser esquecida]: as próprias
bombas, a produção industrial do armamento, o seu negócio e o seu poder.
(…)
Os EUA continuam a ser, de muito longe, o principal investidor
militar.
(…)
A Arábia Saudita e a Índia são comparáveis em gastos militares à
Rússia, apesar de este país ter o segundo exército do mundo.
(..)
A China é o país cujo gasto militar mais cresceu em proporção (75%
em 10 anos), com o projeto anunciado de ser a maior potência mundial em 2049.
(…)
Dir-se-á que a marinha chinesa já é maior do que a dos EUA.
(…)
Portanto, mais gastos, um ótimo negócio.
(…)
Mesmo que a economia vá mal [nos EUA], o negócio da guerra vai bem
e só pode aumentar.
(…)
A Alemanha tornou-se uma grande compradora e produtora, a Polónia
também.
(…)
Ora, a guerra tem um impacto económico imediato, além da
mortandade que é a sua razão.
(…)
No imediato, aumenta o investimento público, reconverte indústrias
e é mesmo a forma mais rápida de provocar um salto na procura agregada.
(…)
Depois, tem um preço para as economias, (…) favorece as empresas
com maior poder.
(…)
Não será, portanto, por acaso que, do escândalo dos submarinos aos
do atual Ministério da Defesa, este sector seja uma das sedes da corrupção, e
Portugal é só um exemplo.
(…)
O que se ganhou com a reorientação desses gastos [militares] desde
o fim da Guerra Fria é o equivalente ao orçamento mundial para a educação.
Francisco Louçã, “Expresso” (sem link)
Assistimos à autorização, cada vez mais
frequente, do abate de sobreiros.
(…)
Sistematicamente,
tais decisões são justificadas como de "imprescindível utilidade
pública" sem que qualquer entidade, de facto independente, seja chamada a
pronunciar-se.
(…)
Desde
2018, foram já emitidas 44 declarações de "imprescindível utilidade
pública", que originaram o abate de 13.163 sobreiros e de 72.433
azinheiras (também protegidas, por fazerem parte do ecossistema montado), em 27
concelhos de 15 distritos.
(…)
Pela
variedade de dimensão e de impacto, e na impossibilidade de referirmos todos os
casos de abates autorizados desde 2011 no cômputo de um conjunto de 40 mil
sobreiros, a impressão resultante é de que tudo é de interesse público.
(…)
O que
se deveria esperar dos poderes públicos seria que articulassem a resposta às
necessidades energéticas com uma rigorosa salvaguarda e com o restauro de
ecossistemas.
(…)
Nas
últimas décadas, pelo menos, os sucessivos governos abdicaram de qualquer
coerência e firmeza na aplicação de legislação de protecção do ambiente e da
natureza.
(…)
Precisamos, no nosso país, de um controlo muito
mais eficaz e, especialmente, de estratégia política direccionada à conservação
da biodiversidade.
(…)
As situações susceptíveis de configurar
interesse público [são] hoje uma figura em que tudo pode entrar, sem clareza e
sem precisão.
(…)
Não
podemos é fazer dos habitats, dos solos, do coberto arbóreo e vegetal em geral,
das bacias hídricas, ou seja, da biodiversidade, uma vítima do combate, ainda
que teoricamente bem-intencionado, da luta pelo clima.
(…)
Sem transição ecológica nada poderá ser
possível e essa tarda em ser compreendia.
Fernando Santos Pessoa,
Jorge Paiva, José Carlos Costa Marques, Maria Amélia Martins Loução, Nuno
Quental, “Público” (sem link)
[Guterres] dizer que os ataques do Hamas não surgiram do nada
é constatar o óbvio.
(…)
Sabemos, contudo, que o exercício de constatar o óbvio pode
ser uma demonstração de coragem.
(…)
Mas falou e isso tem uma importância enorme no contexto atual.
(…)
Ficou
demonstrado, e ao mais alto nível, que há verdades que não podem ser ditas e
que esse impedimento não recai apenas sobre cada um de nós.
(…)
As
pessoas que tentam fazer uma análise da guerra são rotuladas de apoiantes do
terrorismo ou de antissemitas porque Israel não admite que existam vozes que
contradigam as suas exatas palavras.
(…)
Muito mais importante do que o conteúdo do seu discurso é a reação
que ele espoletou.
(…)
Precisávamos de ver até onde vai a diplomacia israelita.
Ficámos esclarecidos.
(…)
A diplomacia israelita age como estando em representação de
um Estado dominante ao nível de uma potência mundial.
(…)
Israel precisa dos Estados Unidos, mas é cada vez mais
evidente que são os Estados Unidos que precisam de Israel. Este país é a
única influência dos Estados Unidos naquela região.
(…)
Ter uma posição hegemónica no mundo exige mais do que
superioridade militar. Os Estados Unidos acusam a falta de força e de
eficácia da sua diplomacia.
(…)
Claro que o poder de Israel também assenta no justo complexo
de culpa europeu pelo Holocausto.
(…)
Assistimos
ao massacre de um povo perante a complacência da comunidade internacional e
quem perpetua o massacre é que dita as regras das relações internacionais e
impõe a sua narrativa.
(…)
Acredito
que o que moveu António Guterres foi o apego ao que é justo e a sua
sensibilidade perante questões humanitárias.
(…)
Mas seja o que for que o moveu, creio que lhe deveremos estar
gratos.
Carmo Afonso, “Público” (sem link)
O pedido de demissão imediata de António Guterres pela voz de
comando do embaixador de Israel nas Nações Unidas não surpreende.
(…)
Há um certo odor a inimputabilidade.
(…)
É um facto que os ataques do grupo islamista Hamas não
aconteceram do nada. Em nenhum momento Guterres desculpou qualquer dos
agressores.
(…)
Sabe-se muito mais sobre o conflito israelo-palestiniano na
última semana do que em décadas de discurso único e de percepção torcida.
(…)
O Hamas é um demónio, mas já ninguém procura santos sem
paradeiro neste conflito.
(…)
À questão de saber onde se encontram as vítimas, responde-se
sem hesitação: as vítimas são pessoas nos povos dos dois estados, entregues aos
extremismos.
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