(…)
A morte de Francisco suscitou uma imensidão de
declarações de simpatia, de exaltação da sua dimensão humana, do seu pensamento
e da sua obra.
(…)
Os que assim agem [muitos deles de forma
hipócrita] fazem-no na busca de legitimidade para continuarem a negar
Francisco, mas ao mesmo tempo reconhecem que os ideais com que os cidadãos se
identificam (os que têm futuro) são os de Francisco e não os deles.
(…)
Os perigos de a nossa sociedade sofrer
violentos retrocessos vêm, por um lado, do populismo da extrema-direita que
nega relações humanas e sociais harmonizadas num espaço para todos e a própria
democracia, mas por outro lado, dos imperativos daquilo que ele designa de
“Dogma de fé neoliberal”.
(…)
O individualismo neoliberal coloca o futuro
como uma construção de todos contra todos (…) coloca os interesses dos
privilegiados sempre a salvo, impõe o poder unilateral do patrão como base dos
sistemas de relações de trabalho.
(…)
Neste 1.º de Maio há, pois, que reforçar a luta
contra a pobreza, a precariedade, as discriminações, os baixos salários e os
longos horários de trabalho, e pelo acesso à habitação.
(…)
Ao longo da sua história, os sindicatos foram
capazes de defender e praticar a solidariedade internacional e de agirem com
eficácia no plano nacional.
A manifestação “popular” do Porto, equivalente
à de Lisboa, foi uma grande manifestação, maior do que o habitual.
(…)
Havia grande mobilização, penso que em parte
por uma crescente consciência da crise interior das democracias.
(…)
O governo
da AD, com a asneira de ter sugerido cancelar
comemorações por causa do luto papal, acentuou uma sensação de risco que é
mobilizadora.
(…)
Mobiliza os sectores mais politizados, mas são
estes que participam em manifestações.
(…)
[O sector que, de facto, está a crescer
consideravelmente e marcou esta manifestação é o] dos grupos LGBT e
feministas, que parecem ter uma capacidade de mobilização sem paralelo com o
passado.
(…)
Há uma causa que domina todas outras, a da
Palestina.
Pacheco Pereira, “Público”
(sem link)
Na semana passada soubemos que os gastos
militares globais ultrapassaram os 2,46 biliões de dólares em 2024.
(…)
Este é um número avassalador que representa um
crescimento de 7,4%. O maior desde a Guerra Fria.
(…)
A indústria do armamento não está apenas viva:
está em expansão! E como qualquer indústria precisa de crescer, produzir,
vender.
(…)
Também aqui a lógica da oferta e da procura
funciona: cria-se a necessidade, alimenta-se o medo, vende-se segurança.
(…)
Que a paz é uma utopia, e que a única forma de
estarmos seguros é armarmo-nos até aos dentes.
(…)
Continuamos a agir como se a guerra fosse um
destino certo. E esquecemo-nos de que a paz é uma escolha. Uma escolha que
exige construção dinâmica.
(…)
[O Papa Francisco] relembrou-nos que a guerra é
sempre uma derrota, e para todos.
(…)
E que não há guerras justas, por muito que nos
te ntem convencer do contrário.
(…)
[Talvez seja tempo] de ousarmos acreditar que
outro caminho é possível.
(…)
Que, por mais ingénuo que pareça, o
desarmamento não é uma fantasia. É uma necessidade.
(…)
E que a paz, essa palavra tão gasta, continua a
ser o horizonte mais digno para qualquer civilização que se queira chamar
humana.
(…)
Num tempo em que falar de paz parece quase
ingénuo, Francisco insiste [nos seus últimos momentos de vida], e ainda bem em
lembrar-nos que a guerra não é inevitável. Nunca foi. E nunca será.
Madalena Abreu, “Diário
de Coimbra” (sem
link)
O 25 de Abril de 1974 foi o dia em que
Portugal, com surpresa de quem encontra dinheiro num bolso velho, descobriu que
podia ser livre.
(…)
Bastava levantar a cabeça – e, se possível
abrir as janelas para arejar o cheiro a mofo que décadas de medo tinham
deixado.
(…)
A escola era para poucos, os hospitais uma
indignidade, a guerra para quem não tinha para onde fugir.
(…)
O medo instalara-se como um mobiliário antigo:
pesado, desconfortável, mas demasiado familiar para ser dispensado.
(…)
Em 1970, 25,7% dos portugueses eram
analfabetos. Hoje são apenas 3,1%. A esperança média de vida aumentou de 67
para 82,6 anos.
(…)
A mortalidade infantil que matava quase 38 em
cada mil recém-nascidos, caiu para 2,6.
(…)
É fácil esquecer o que se conquista quando já não
custa nada tê-lo.
(…)
Hoje, a liberdade é tratada como a água da
torneira: só se nota quando falta.
(…)
Portugal corre o riaco de se tornar um daqueles
lugares onde se fala de liberdade como se fosse uma recordação de família:
estimada, mas deixada na prateleira.
(…)
[Abril] foi feito à mão: construído rua a rua,
voto a voto, livro a livro.
(…)
Política nunca foi apenas partidos ou governos:
é a construção contínua da sociedade.
(…)
Quem dela se afasta, iludido ou desanimado,
esquece que ao abandonar a política está, na verdade, a abandonar o seu próprio
futuro.
Alexandre Bogalho, “Diário
de Coimbra” (sem
link)
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