quarta-feira, 11 de junho de 2025

CITAÇÕES À QUARTA

 
Há uma ideia pré-concebida de que os desconhecidos que encontramos no nosso dia-a-dia são os que apresentam maior perigo para as pessoas.

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[No entanto]o relatório da APAV de 2023 constatou que 60% dos homicidas tinham alguma relação com a vítima.

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O Relatório Anual de Segurança Interna que concluiu que em 2024 foram registadas mais de 30 mil denúncias de violência doméstica, sendo que 26 mil casos o agressor era marido ou companheiro da vítima.

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Assim, (…) a pessoa mais perigosa na vida de uma mulher mais depressa é o ex-namorado ou parceiro do que um desconhecido.

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Todos estes casos [histórias acabadas de citar] seguem o mesmo nível de misoginia sistémica, tanto no dia-a-dia das mulheres como na Justiça portuguesa. 

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O conceito misógino de propriedade, no qual os homens sentem que são donos das mulheres, cria um ambiente fértil para tragédias.

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Este conceito [misógino], tomado como sentimento de poder pelos homens, é patrocinado pela masculinidade hegemónica, que lhes ensina que as mulheres a eles lhes pertencem.

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É importante dizer que nenhuma vítima se pôs a jeito: a culpa nunca é da vítima, mas sempre do agressor.

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Se calhar, está na altura de (…) garantir uma Justiça que combata a misoginia sistémica.

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A violência doméstica, no namoro ou familiar não tem mais ou menos importância conforme o género da vítima.

Clara Não, “Expresso” online

 

O primeiro-ministro Luis Montenegro afirma que "precisamos de ter um país aberto à imigração, mas cuidado que precisamos também de ter um país seguro".

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O ministro Leitão Amaro diz a respeito da operação [conduzida pela PSP no Martim Moniz em Lisboa] que quem se encontra irregular em Portugal “tem de ter consequências”.

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Encostam dezenas de migrantes à parede. Põem-nos em fila e revistam-nos.

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Em vésperas de eleições legislativas, o governo anuncia que 18 mil pessoas serão notificadas para abandonarem o país com um prazo legal de 20 dias.

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É um espectáculo posto em cena para que toda a gente o veja, tanto estrangeiros como portugueses, e foi escrito por dois motivos.

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[Estamos fartos de saber que] não existe qualquer ligação entre migração e criminalidade e que os migrantes contribuem mais para a Segurança Social do que beneficiam dela.

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O segundo motivo consiste em dar ao governo uma aparência de controlo sobre o tal perigo. 

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O governo gera a percepção de uma ameaça, para se poder apresentar como a única forma de a combater.

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Por muito que o que motiva este espectáculo seja a relação com o espectador, as suas vítimas são-no de verdade.

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Quem recebe uma notificação de abandono voluntário terá mesmo apenas mais 20 dias de estada legal no país. 

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Note-se que este não é um espectáculo português. Longe disso. Nos últimos anos, esteve em cena em quase todo o mundo ocidental. 

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Por detrás da violência, por detrás de toda esta performance de crueldade, está o facto bem conhecido pelos governos destes países de as nossas economias dependerem do trabalho migrante. 

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Não há nenhum país no mundo que faça um número de deportações comparável ao número de imigrantes em situação irregular presentes no seu território. 

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Nos EUA, a probabilidade de ser detido por trabalhar ilegalmente é semelhante à de ser atingido por um relâmpago.

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Os governos dos países ocidentais toleram o trabalho de migrantes irregulares porque isso significa mão-de-obra barata em sectores fundamentais.

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Também o governo português está ciente da sua dependência de trabalho migrante. 

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Uma pergunta impõe-se: se as economias do mundo ocidental estão tão dependentes de trabalho migrante, porque vemos um discurso cada vez mais inflamado no que toca à imigração?

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A nacionalidade passa a ser um critério aceitável para definir quem tem direito a ter direitos. Como tal, serve como critério para a exploração do trabalho migrante.

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Os alvos da deportação não são tanto aqueles que acabam deportados, mas todos aqueles que permanecem deportáveis.

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Do centro do palco diz-se bem alto, para que se ouça: estrangeiros não são bem-vindos aqui. 

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[Mas] nos bastidores, ouve-se outra mensagem: precisamos de estrangeiros para trabalhar, mas preferimo-los sem direitos.

Miguel Duarte, “Expresso” online

 

Há quem fale do Estado Novo como se tivesse sido uma época ordeira, limpa, respeitável.

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A maioria destas pessoas não viveu aquele tempo, nem nunca se dedicaram a estudá-lo minimamente.

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Não viveram a censura, a polícia política, o medo de falar. Não sabem o que foi o Tarrafal, nem o que significava uma carta a ser aberta pelo Estado.

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[Não] foram obrigados a combater numa guerra colonial que parecia não ter fim.

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[A memória] também se constrói com aquilo que se escolhe contar – e principalmente com aquilo que se omite.

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Uma versão em que o império foi só feito de “descobrimentos”, em que Salazar era um homem de contas certas, em que os portugueses eram todos ordeiros e felizes até ao 25 de Abril lhes ter estragado a festa.

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[Este discurso] serve para justificar políticas de exclusão.

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É um discurso perigoso, porque oferece respostas simples a problemas complexos.

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[A extrema-direita] escolhe aquilo que lhe convém e transforma-o em verdade absoluta.

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Porque o ensino da História foi sendo empurrado para os cantos, desvalorizado, encurtado. Porque há gerações inteiras a crescer sem perceber o que foi e o que é o fascismo.

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[Trata-se de] reconhecer que lhes foi retirado [aos jovens] o tempo, o espaço e o estímulo para pensar criticamente o passado.

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E quando a História deixa de ser ensinada com profundidade, os mitos ocupam o lugar da memória. 

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Sem memória, ficamos à mercê de qualquer narrativa que grite mais alto.

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[A História] tem de nos servir para pensar o presente – não para o envenenar.

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[Temos] de lembrar que o progresso não foi dado: foi conquistado.

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[Temos de lembrar] que os direitos não caíram do céu: foram exigidos, muitas vezes com custos altos.

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[Temos de lembrar] que a liberdade não é garantida – é defendida todos os dias, também nas palavras que escolhemos usar.

Valter Mendes Fernandes, “Público” (sem link)


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