Cem dias depois de eleito, Hollande só desiludiu quem sobre ele criou ilusões. É certo que chegou a entusiasmar os seus apaniguados. No arranque da campanha que o levou ao Eliseu, prometia aos franceses "começar pelo sonho", "o sonho francês que é a confiança na democracia, a democracia que será mais forte que os mercados, mais forte que o dinheiro...". E, de facto, foi por esse sonho que começou, mas para o esvaziar.
Primeiro, culpabilizaram os trabalhadores, os reformados, os desempregados, os estudantes, os doentes, inculcando-lhes a ideia de que os seus direitos ao trabalho, à reforma, ao subsídio de desemprego, à proteção social, ao ensino, à saúde, a condições de vida digna, eram privilégios e regalias que desequilibraram as contas e deram origem à crise. Agora, para consolidar nos trabalhadores e no povo a perda dos seus pequenos direitos dizem-lhes: nem pensem voltar ao passado porque isso era o regabofe.
Mas o retrato de horror de um país desestruturado e em que a prioridade da acção do Estado deixou de ser a persecução do bem-estar e da dignidade de vida de todas as pessoas, é dado de forma lancinante pelos números da realidade socioeconómica e não passa só pelo falhanço da execução orçamental, que mostra como um país não é governável com profissões de fé e declarações de convicção ideológica e como é desajustado e irrealista o programa político-ideológico que está a ser imposto a Portugal. Ou seja, não só é impossível de cumprir este tipo de tratamento de choque neoliberalizador, como o seu efeito é levar o país para um buraco de onde levará anos, mesmo décadas, a sair.
São José Almeida, Público (sem link)
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