quarta-feira, 15 de agosto de 2012

UNIÃO DA ESQUERDA PRECISA-SE!

Se é verdade que o Verão não é a época mais propícia para grandes reflexões de carácter filosófico ou político, não é menos verdade que os tempos estão de tal maneira difíceis para a esmagadora maioria da população que não nos podemos dar ao luxo de esquecer, ainda que por pouco tempo os problemas que nos cercam.

É tradicional dizer-se, com toda a razão de ser, que a direita conhece melhor o seu inimigo principal do que a esquerda e sabe unir-se nas ocasiões em que os interesses dos mais poderosos estão em jogo. Por sua vez, a esquerda tem sido incapaz de se “unir em torno da meia dúzia de ideias simples que sempre formaram o núcleo duro das suas convicções políticas”. E o resultado disso está à vista com a aproximação da destruição do Estado Social e tudo o que ele comporta em áreas como a da Saúde, da Educação pública e da Segurança Social, para só falarmos nos casos mais prementes. Mas, o mais grave e incompreensível de tudo é que a campanha orquestrada pela direita, com apoio significativo nos media que estão ao seu serviço, no sentido de convencer as pessoas de que a existência do Estado Social é incomportável, tem tido um êxito inquestionável.

Esta questão é exactamente abordada por José Vítor Malheiros num artigo (*) que ontem veio à estampa no “Público” e cuja parte final aqui deixamos para reflexão.

“De facto, quando a direita diz que o "memorando da troika" conta com o apoio de partidos que representam 80% dos eleitores está a dizer algo que é mais do que uma estatística eleitoral. A verdade é que, por incompreensível que isso nos pareça, a esmagadora maioria da população não considera (ou não tem considerado) que as conquistas do Estado social desde o 25 de Abril mereçam ser defendidas com real afinco. Houve de facto algo que se perdeu, um sonho que se esqueceu, uma narrativa que deixou de fazer eco e que tem de ser reinventada, reconstruída, refeita de raiz. Podemos atribuir isso a uma sistemática lavagem ao cérebro efectuada pelos media (que é tragicamente real) ou a outros factores, mas a verdade é que existe hoje um terrível divórcio entre a população e a defesa dos seus interesses, devido a uma narrativa reaccionária e caceteira que se tornou hegemónica e que conseguiu impor a ideia do Estado social como fonte de desperdício, da Segurança Social como sustento de parasitas, do Serviço Nacional de Saúde como um luxo incomportável, da solidariedade social como algo "insustentável", da Escola Pública inclusiva como "facilitista", dos apoios à Cultura como "elitistas", etc. A verdade é que a direita tem conseguido vender com absoluto despudor e grande eficácia este discurso, voltando trabalhadores contra trabalhadores e convencendo uma grande parte de que os direitos excessivos dos outros, dos subsidiodependentes, dos ciganos, dos que não querem trabalhar, dos velhos, dos doentes, dos disléxicos, dos bolseiros, são a causa da pobreza de cada um - ao mesmo tempo que vende os privilégios dos agiotas como algo inquestionável e positivo.

Que a esquerda tem de se unir em torno do que para si é importante, penso que é uma evidência para todos os defensores de uma sociedade decente, livre e justa. Mas a grande batalha que temos de travar no campo das ideias não se resume à arena da esquerda. Quem temos de convencer são todos os cidadãos que, seduzidos ou adormecidos pelas historietas da direita, continuam a votar nos que lhes roubam o trabalho, os direitos e as riquezas, eternizando desigualdades injustas e privilégios. Enquanto o discurso populista da direita sobre o rendimento social de inserção como sustento de parasitas e sede de fraudes continuar a colher, o nosso trabalho estará longe de estar feito.”

(*) ”Em busca da narrativa perdida”

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