É agora que se molda o que virá depois
da nuvem. E isso passa por, agora, fazer literalmente tudo para que a nuvem não
destrua as vidas nem física nem economicamente.
(…)
Agora é mais exigível que nunca que um advogado
que exerce a sua profissão para uma entidade empregadora, estando inserido na
estrutura organizativa da sociedade, com um rendimento fixo, sujeito a horários
de trabalho e ao cumprimento de códigos de conduta, tem que ter um contrato de
trabalho.
(…)
Então e os que ficaram sem emprego de um
momento para o outro?” E respondo: para a grande maioria dos advogados, foi
exatamente isso que se passou.
(…)
Como foi exigido para todos os demais
trabalhadores, exige-se também para estes tantos advogados que ficaram
subitamente sem fonte de rendimento que sejam acionadas medidas de proteção
extraordinária.
(…)
Medida de emergência: atribuir aos
advogados, durante este período de exceção, o direito de descontar para a
Segurança Social e de receber dela a proteção que recebe qualquer trabalhador
independente
[Em Espanha], trabalhadores temporários,
estagiários e contratados a prazo mantêm obrigatoriamente o seu vínculo
enquanto durar a crise pandémica.
(…)
A Itália, cujo governo não se posiciona
de todo à esquerda, tinha aprovado, logo a 17 de março, a proibição dos
despedimentos.
(…)
A aprovação desta medida em Portugal tem
sido sugerida com vários argumentos.
(…)
Portugal está já a viver uma vaga de
dezenas de milhares de despedimentos e de cessações de contratos precários
(como se pode ver neste site), que estão a causar um imenso desespero.
(…)
A prioridade deveria ser garantir transferências
diretas do Estado às micro e pequenas empresas em dificuldade para pagamento de
salários em março e abril, evitando falências e evitando o endividamento junto
da banca.
(…)
O que mais estruturalmente permitirá
segurar a vida das pessoas no futuro – e, de resto a economia e as empresas – é
evitar uma explosão do desemprego.
(…)
Ora, a este nível, o decreto do Governo
hoje publicado está muito aquém das expectativas e das necessidades.
(…)
Uma grande empresa pode proceder à
“limpeza” de todos os seus trabalhadores precários, dispensar os trabalhadores
em outsourcing.
(…)
É que a proibição do despedimento que
ficou na lei ignora os despedimentos já havidos e só se aplica a partir do
momento em que a empresa requer o apoio.
(…)
O que chamar a esta versão da “proibição
de despedimento” se não um indulto a quem já despediu e um convite a que as
empresas se desembaracem dos precários.
Ver brancos, pretos e
amarelos a lutar pela mesma dita sobrevivência enquanto seres humanos é uma
lição só comparável a ver europeus e americanos a disseminarem conscientemente
a infecção a uma velocidade bem superior à dos asiáticos. Estes tempos não são fáceis
para ninguém, muito menos para estes.
(…)
Um conjunto de opiniões
que pretende passar um pano de esquecimento rápido sobre as opções tomadas pela
selva financeira em detrimento da preservação dos sectores estratégicos da
economia nas mãos do Estado.
(…)
Há um cíclico séquito de
gente que vocifera por liberalismo económico para desatar a correr para os
cueiros do Estado quando as coisas dão para o torto.
(…)
É aqui, não depois de
sairmos de um pesadelo, que devemos deitar contas à vida por muitas decisões
políticas passadas que quase desmantelaram o SNS,
Alguns desavergonhados neoliberais vêm reclamando a
necessidade de se salvaguardar a economia - tal como eles a encaram -, mesmo
que isso implique a morte de milhões de seres humanos.
(…)
Nos últimos anos, os
bancos centrais andaram a fabricar dinheiro a rodos e nunca houve tanta
riqueza. Porque não se desencadeiam mecanismos para ir buscar dinheiro
acumulado nos offshore e em enormes grupos empresariais?
(…)
É uma evidência que o
choque provocado pelo vírus é simétrico, atinge todos os países e povos quase
de forma igual, mas o egoísmo e a ganância sustentam-se no assimétrico.
(…)
[O Governo] devia ter a
coragem de assumir medidas legislativas que assegurem os vínculos laborais,
jurídicos e de facto, num período temporal definido.
(…)
A União Europeia pode
implodir face à ausência de coerência e coesão, à negação da solidariedade e
equidade entre países e povos.
Hoje, com a covid-19,
verifica-se que muitos lares de idosos são
verdadeiras incubadoras do vírus, mas uma sociedade
que vive o mito da juventude na arte, na cultura, no desporto, na vida,
permanece bastante indiferente à sorte desses alvos preferenciais do vírus.
(…)
As grandes diferenças
entre 1918 e 2020 são duas: a globalização e o tecido comunicacional, no qual
são embebidas todas as acções e decisões. E é esse tecido que muda quase tudo
nesses cem anos de diferença.
Pacheco Pereira, “Público” (sem link)
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