O
texto seguinte, que retirámos do Público de hoje, é da autoria da Embaixadora
do Ano Europeu para o Desenvolvimento (*). Todo ele merece uma leitura atenta
até porque a simplicidade da mensagem que contém leva a que seja de fácil
compreensão.
Com
exemplos sobejamente conhecidos, Cláudia Semedo explica com facilidade que o
grau de desenvolvimento de um país condiciona a gravidade das consequências de
uma qualquer catástrofe natural (ou não). A partir daqui, podemos compreender o
que é para a vida das pessoas de países muito pobres o aumento das
desigualdades que grassa pelo mundo, fruto de um sistema que, em vez de as
combater, ainda contribui para as aprofundar. “Veja-se o exemplo do terramoto
do Haiti, onde morreram mais de 200 mil pessoas. Poucas semanas depois, um
terramoto de maior magnitude atingiu o Chile, país com melhor condição, e o
número de baixas não ultrapassou as 5 centenas”. Tudo isto tem a ver com as
condições gerais da vida das pessoas em ambos os países, em áreas como a
educação, a saúde, a habitação, o saneamento básico e muitas outras que
potenciam ou diminuem o impacto de qualquer catástrofe.
O
sismo e tsunami do Oceano Índico que, em 2004, inundou a Indonésia, o terramoto
que, em 2010, abalou o Haiti ou a guerra na Síria que, segundo o Observatório
Sírio dos Direitos Humanos, já provocou a morte de mais de 240 mil pessoas são
apenas três exemplos de catástrofes que nos fazem colar à televisão, durante
dias a fio, à espera de saber as causas, a dimensão e as consequências de
tragédias que deixam um rasto de morte e marcas profundas na comunidade
mundial.
Três
acontecimentos que convocam o nosso espírito de solidariedade e compaixão. Três
momentos em que a resposta à habitual pergunta, “Mas o que é que eu posso
fazer?” surge natural e imediatamente. Aparecem muitos voluntários, os
objectivos dos habituais apelos telefónicos são superados, as roupas mais
gastas saem dos armários, as conservas, pacotes de arroz, de massa e feijão
voam das prateleiras dos supermercados para bancos alimentares. Todos queremos
ajudar e muitas vezes não sabemos como. Uma onda de produtos, muitos obsoletos
e sem cabimento, entope as organizações e torna o processo de escoamento
moroso, pela necessidade de cuidada selecção. E o tempo vai passando, as
imagens vão perdendo o impacto que a novidade provoca, as reportagens vão
diminuindo a frequência com que passam e a normalidade instala-se lenta mas
eficazmente. E desligamos, talvez no momento em que os países que foram
afectados mais precisam de nós para reerguer as suas infraestruturas. Mas, para
isso, neste nós tem de caber muito mais do que a vontade pessoal de cada
cidadão. Há que reunir esforços entre os governos centrais, as autoridades
locais, a sociedade civil, o sector privado e os centros de pensamento para que
surjam estratégias concertadas e a longo prazo no sentido de um desenvolvimento
sustentável.
A
ajuda humanitária é accionada em situações de emergência e tem como propósito
salvar vidas, aliviar o sofrimento e preservar a dignidade humana das populações
durante e após as crises, mas também prevenir e reforçar a capacidade de
resposta para quando ocorram tais situações.
É
necessário cuidar dos sobreviventes e, numa lógica de autonomização, criar
condições para o retorno à vida normal mas é fundamental que se invista na
prevenção pois, só assim, é possível diminuir o impacto destas catástrofes que
afectam desproporcionalmente os países, as comunidades e as populações mais
vulneráveis.
97%
das mortes devido a desastres naturais acontece em países em desenvolvimento; um
terço das pessoas que se encontram em situação de pobreza extrema vive em
países frágeis e dilacerados por conflitos armados; não é por acaso, nem
por desígnio divino.
As
desigualdades económicas revelam-se nas formas mais brutais. O fosso é cada vez
mais profundo, a bola de neve agiganta-se e faz cada vez mais vítimas à sua
passagem.
Os
países economicamente menos viáveis não conseguem agir para além da
sobrevivência diária, daí a preparação para situações de risco ficar para
segundo, terceiro ou em nenhum plano.
Veja-se
o exemplo do terramoto do Haiti, onde morreram mais de 200 mil pessoas. Poucas
semanas depois, um terramoto de maior magnitude atingiu o Chile, país com
melhor condição, e o número de baixas não ultrapassou as 5 centenas.
É
urgente equilibrar a balança do direito à vida.
A
cooperação entre países tem de ser mais eficaz e pensada com maior seriedade,
celeridade e vontade política.
Não
podemos continuar a olhar para o lado e assobiar como se nada fosse enquanto
milhares de pessoas se entregam ao mar e à morte como único recurso
possível.
O
aumento das catástrofes naturais e dos conflitos armados, na sua maioria
provocados pela competição por recursos escassos, tem de nos fazer parar para
repensar a forma como interagimos com a natureza e entre pares.
Não
há igualdade ou justiça possíveis enquanto todas as vidas não valerem
exactamente o mesmo.
É
urgente que olhemos para as necessidades do outro como se nossas fossem.
É
urgente que exijamos o respeito pela vida do outro como se da nossa se
tratasse.
É
urgente que pensemos em prevenir em vez de remediar.
(*) Cláudia
Semedo
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