Com
a aproximação do processo eleitoral para as Legislativas 2015, é cada vez maior
o receio de uma forte abstenção do eleitorado português. As pessoas não são
burras e têm vindo a constatar que o seu voto pouco tem contado para os
governantes eleitos, para além de os alcandorar aos cargos do poder. As
eleições de 2011 foram o último e mais significativo exemplo da nossa história
recente em que os compromissos dos candidatos dos partidos que formaram governo
foram imediatamente esquecidos assim que as urnas de voto encerraram. Por outro
lado, temos também os recentes acontecimentos que tiveram como centro a chamada
crise grega, em que os votos do povo helénico que desejava uma efectiva mudança
de políticas no seu país esbarraram no muro ditatorial dos defensores dos
interesses do capital financeiro e das grandes empresas internacionais. São bem
conhecidos os nomes dos principais protagonistas, mas o que fica na cabeça de
grande parte dos portugueses é que, por um motivo ou por outro, a sua vontade
expressa através do voto não é respeitada. Daí até abdicarem do direito de
votar vai um passo.
É
tarefa dos mais politicamente conscientes motivar os nossos concidadãos no
sentido de que a sua abstenção no acto eleitoral só favorece os piores
políticos e partidos do nosso meio, deixando para trás aqueles que, através de uma luta
tenaz, vão oferecendo resistência à acção nefasta dos rostos que em Portugal representam
o que há de pior no sistema capitalista.
O
texto seguinte constitui um excerto de um excelente artigo de opinião que transcrevemos
do Público de hoje e em que o autor (*) enumera uma série de razões (“votar
porquê” e “votar para quê”) que devem levar os portugueses a votar no próximo dia
4 de Outubro.
Votar para que depois do pântano do início do
novo século e da tanga apregoada por Durão Barroso, possamos agora abandonar o
buraco onde caímos. Um buraco para o qual a saída não pode passar pela perda de
direitos, e pela competitividade baseada na diminuição da qualidade de vida.
Votar para que possamos sair deste buraco
centrando todos os nossos esforços num processo de reindustrialização assente
na procura interna mas, igualmente, dirigido para os mercados externos.
Votar para que possamos mudar e iniciar um
longo e árduo caminho que nos afaste da periferia da Europa, pois essa é a
única forma de quebrar um círculo vicioso que nos remete para uma União a
várias velocidades.
Votar porque nos últimos anos emigrámos a nossa
ciência e tecnologia. Votar para inverter as condições que criámos para que os
nossos cientistas e investigadores tivessem de abandonar a nossa ciência,
passando a fazer a ciência dos outros países europeus.
Votar porque precisamos de uma política
económica séria, uma economia dirigida ao bem comum, uma economia assente na
translação de conhecimento científico, uma economia verde e não uma economia de
trabalho precário e dirigida para os ganhos de uma muito pequena minoria.
Votar porque precisamos de um plano público
para empreendedores para que haja de facto um financiamento dirigido ao
empreendedorismo e não apenas bancos que só financiam a construção e venda de
casas, cartões de crédito e empréstimos para consumo.
Votar porque precisamos de promover a nossa
soberania através do software, apoiando as empresas
nacionais que invistam nessa área hoje central a tudo o que fazemos.
Votar para que possamos alterar as prioridades
fiscais do país, tornando a fiscalidade mais preocupada com os cidadãos e em
adaptar o IVA ao seu dia-a-dia (e não ao dia-a-dia de quem não vive a vida da
classe média e dos cidadãos de menores rendimentos).
Votar porque a recuperação económica passa por
aumentar o rendimento disponível dos cidadãos e não pela baixa do IRC das
maiores empresas (as quais muitas vezes nem sequer são patriotas na sua
domiciliação fiscal nem na sua criação de emprego).
Votar porque a recuperação económica passa
também pela recuperação da dignidade económica de um país. Quantos meses, ou
anos, necessitaria um trabalhador médio português para atingir o salário
recebido em algumas administrações de empresas privadas e públicas portuguesas,
ou dos reguladores de diferentes sectores económicos?
Votar porque a enorme desigualdade salarial
entre homens e mulheres e entre cargos de topo e os restantes trabalhadores tem
de ser reduzida. O preço a pagar por não o fazer será uma recuperação económica
em debilidade permanente e a ausência de dignidade em Portugal.
Votar porque não podemos continuar a ter um
país em que os riscos de pobreza, e o número de população em pobreza, continuem
a aumentar. Precisamos assegurar que não seremos, a breve trecho, um país onde
a saúde e a esperança de vida dos cidadãos dependa do local onde se habita,
onde se apanha transportes públicos ou de onde se estuda ou trabalha.
Votar porque precisamos de assegurar o
financiamento de uma educação e saúde públicas e de assegurar que pequenos e
médios empresários não caiam na exclusão social após um desaire económico dos
seus investimentos produtivos.
Votar para que seja possível uma mudança
assente na justiça social, na dignidade e na soberania dos cidadãos.
(*) Gustavo Cardoso, Professor Catedrático do
ISCTE-IUL e investigador
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