No
texto que assina esta quarta-feira no Público, o Prof. Santana Castilho (SC)
lança “um olhar breve sobre os programas eleitorais”, particularizando o sector
educativo.
Relativamente
às duas principais forças partidárias, SC não encontra diferenças substanciais
nas “previsões económicas e financeiras”, levando à constatação de uma contradição
entre o objectivo de redução da despesa pública e a promessa de “melhoria de
prestações nas áreas sociais, designadamente na Educação”. Esta é uma ideia
transversal a muitos especialistas nas áreas económica e financeira, o que
significa, logo à partida, uma quase impossibilidade de cumprimento das
promessas eleitorais, ou seja, o costume.
Contados
os votos e eleitos os deputados, PS e PSD/CDS rapidamente esquecerão os
compromissos com os eleitores. Merkel, Bruxelas e a Tróica são um argumento
sempre à mão para justificar o incumprimento dos programas eleitorais…
Não
podendo ser exaustivo nesta análise, fico-me por algumas perguntas e
comentários, relativos a temas mais controversos.
Depois
de ler os programas eleitorais vindos a público, há uma primeira pergunta que
se impõe: do ponto de vista das previsões económicas e financeiras que
estabelecem, serão o programa eleitoral do PS e o Programa de Estabilidade e
Crescimento para 2015-2019 (o verdadeiro programa eleitoral da coligação
PSD/CDS) substancialmente diferentes? Para responder importa tomar por referência
as variações previstas em cada um deles, relativamente a indicadores clássicos,
isto é, PIB, FBCF (Formação Bruta do Capital Fixo, relevante por dar uma noção
da evolução da capacidade de produção do país), exportações, consumo público,
consumo privado, custo unitário do trabalho, prestações sociais e taxa de
desemprego.
Tendo
os dois programas como objectivos a redução do saldo orçamental, actualmente
negativo, o aumento do saldo primário (receitas menos despesas sem juros da
dívida) e a diminuição da dívida pública, tudo junto supondo uma forte redução,
no mínimo contenção, da despesa pública, como conciliar isso com as promessas
de melhoria de prestações nas áreas sociais, designadamente na Educação?
Afirmando
o PS que quer criar mais emprego e melhor emprego, será isso compatível com a
diminuição do custo unitário do trabalho, que propõe?
Poder-se-á
crescer economicamente, única via para criar emprego, respeitando as regras do
Tratado Orçamental, que impõem um défice orçamental abaixo dos 3% e uma dívida
pública que não supere 60% do PIB?
A
expansão do ensino pré-escolar é a medida que faz o pleno nos programas
eleitorais do PS, PSD/CDS-PP, CDU, BE e Livre, no que à educação respeita. O
programa do PSD/CDS-PP, sem surpresa, propõe a continuação de um caminho
ruinoso para o sistema de ensino. O programa do PS é um repositório de
generalidades, não se pronunciando ou sendo dúbio sobre muitos aspectos
importantes (PACC e municipalização, por exemplo) e retomando conceitos que
melhor ficariam no limbo do passado (escola a tempo inteiro, entre outros).
É
chocante ver que, subliminarmente, o PS tem uma ideia pouco favorável da
competência dos professores portugueses, tal é a avalanche de intenções de
desenvolver e relançar formação de todo o tipo: inicial e contínua; nos
domínios da pedagogia, da didáctica e das competências técnicas. Para nenhuma
área de actividade que o programa aborda se prevê tratamento semelhante para os
respectivos profissionais. Não há formação reforçada para médicos, engenheiros,
enfermeiros, advogados, juízes ou políticos. Mas sobra para os professores. Tem
um significado.
O
PS, em matéria de educação, tem um esqueleto no armário. Chama-se Maria de
Lurdes Rodrigues. Com este programa não se libertou dele. Um bom exemplo é a
recuperação do conceito de escola a tempo inteiro. Que quer isso dizer?
Temos
hoje milhares de pequenos emigrantes do quotidiano, que andam dezenas de
quilómetros para ir à escola. São as vítimas do encerramento compulsivo de
milhares de pequenas escolas das suas aldeias. Juntam-se a outros milhares de
crianças nacionalizadas em nome dum estranho conceito de escola a tempo
inteiro. Todas juntas, constituem uma espécie de órfãs de pais trabalhadores,
com quem pouco estão. É preciso debater o papel que este sequestro e este
desenraizamento podem jogar no comportamento destas crianças.
O
PS fala de reavaliar a realização de exames nos primeiros anos de escolaridade.
Depois de tudo o que já foi dito, estão claros os argumentos e os fundamentos
para ser pró ou contra. Faltou coragem para assumir um lado.
O
PS fala em criar mecanismos de incentivo à fixação de professores em zonas
menos atractivas. Como se nos concursos tivéssemos vagas sem candidatos, quando
o país conhece que o fenómeno é o inverso, na expressão de milhares a
disputarem cada horário, seja ele aonde for. Sobre ideias para devolver
condições de trabalho dignas e esperança de futuro numa carreira congelada há
mais de uma década e em marcha de retrocesso acelerado há duas legislaturas, o
silêncio é olímpico.
O BE prevê a criação de
bolsas de empréstimos de manuais escolares. É algo que já existe um pouco por
todo o país, por iniciativa de várias organizações de cidadãos. O movimento é
socialmente meritório, particularmente no quadro das dificuldades que as famílias
vivem. Mas a generalização da medida merece ponderação. Será que o papel do
livro, mesmo que didáctico (sem falar dos dicionários, gramáticas e atlas
geográficos, por exemplo) caduca com o fim da frequência da escola? Estamos
conscientes de que se não fomentarmos a propriedade dos livros escolares
estaremos, provavelmente, a varrer de milhares e milhares de lares portugueses
os únicos livros que algum dia lá entraram? A reposta a esta pergunta é
implicitamente dada pelo PSD/CDS-PP que, embora de modo faseado, quer acabar
com os manuais escolares em suporte papel, substituindo-os por conteúdos
digitais. Saberão em que país vivem?
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