Para
usarmos uma expressão branda, as expectativas da geração actual não são nada
risonhas e, pior do que isso, não se vislumbra uma luz ao fundo do túnel. A actual
fase do sistema capitalista não deixa qualquer esperança de um futuro melhor para
os jovens que agora estão nos primeiros anos da sua vida activa. Na melhor das
hipóteses o que actualmente a sociedade tem para lhes oferecer é trabalho
precário, mal pago, sem direitos ou regalias e com horários a perder de vista. O
desânimo apodera-se de muitos e as consequências sociais são inimagináveis,
quase sempre no pior sentido.
O
texto seguinte é o excerto de um artigo de opinião de Domingos S. Ferreira (*)
dado à estampa no Público de hoje, onde se faz um leitura negativa mas realista
do tipo de vida que espera os jovens actuais.
No
pós-Guerra qualquer pessoa podia aspirar ter uma vida desafogada e decente.
Constituir e sustentar a família, porventura, comprar uma casa e um automóvel,
contribuir para o bem-estar social, ter um estatuto e ser respeitado.
Lamentavelmente, as expectativas da actual geração, qualquer que seja a sua
situação na pirâmide da distribuição de rendimentos, são opostas àquelas nos
dias que correm. A insegurança no trabalho durante toda a vida, rendimentos
miseráveis (quando têm a sorte de obter um emprego), ausência de quaisquer
direitos ou regalias, sem perspectivas de carreira e inúmeras horas de
trabalho. Enfim! descartáveis como o papel higiénico. Tudo em nome da
competitividade e do sacrossanto todo-poderoso e omnisciente “mercado”. Esta
situação torna-se particularmente mais grave para os filhos das classes mais
pobres que não têm os conhecimentos que lhes permitam obter um emprego. Assim,
quer uns quer outros, não perguntam qual o emprego que gostariam de ter, mas
qual o emprego que lhes ponha algum dinheiro no bolso. Ter uma casa é um
sonho distante demais, por isso são obrigados a arrastar-se indefinidamente nas
casas dos progenitores com os sonhos e esperanças destruídas, e vidas adiadas.
Angus
Deaton, laureado Nobel da economia, demonstra num paper que, apesar das elevadas
habilitações académicas dos jovens da classe média, o pessimismo e a perda de
confiança quanto ao seu futuro, a perda da auto-estima e o desânimo levaram ao
aumento dos indigentes, dos “sem-abrigo”, de doenças do fígado, do consumo
excessivo de álcool e droga e dos suicídios. As malfeitorias efectuadas à
sociedade pelos banqueiros (que, ainda assim, receberam prémios de
produtividade) e plutocratas (cuja indevida riqueza é escondida nos
subterrâneos labirínticos dos offshores), sem nenhumas consequências judiciais, bem
como a desconfiança nas estruturas de governação originadas pela incompetência
e pela incapacidade, produzem ressentimentos e sentimentos de revolta nos
jovens que alastram como fogo em palheiro. Vale à pena lembrar que a fuga aos
impostos pelas grandes corporações seria suficiente para pagar a dívida pública
de todos os países da União.
Andrew
Charles, outro laureado Nobel de Economia e, David Brady, professor da
Universidade de Stanford, demonstram no paper Globalization
and Political Instability a
correlação entre o crescimento da sustentabilidade política e o declínio da performance
económica,
referindo que os países com menor performance económica têm maior instabilidade eleitoral e
política. Esta instabilidade corresponde ao declínio de mão-de-obra no sector
industrial nos países desenvolvidos, dado que a introdução das poderosas
tecnologias de informação no processo produtivo, não só permitiram a
desintermediação dos colarinhos azuis, como também se alastraram à desintermediação
dos colarinhos brancos, resultante do desenvolvimento da robótica, inteligência
artificial, cadeias de valor globais, etc. De acordo com David Brady, “o
emprego no sector industrial caiu de 40% em 1960 para 20% em 2015”, resultando
em exércitos de desempregados e gente escandalosamente mal paga, pois os outros
sectores da economia não absorveram estes desempregados considerados agora
“danos colaterais” negligenciáveis no processo de globalização e modernização.
Muito embora a introdução da tecnologia tenha permitido ganhos de produtividade
de cerca de 300% nos últimos 50 anos, a verdade é que os salários estão abaixo
dos níveis da década de 1950 (a valores actualizados), segundo conclui Tomas
Piketty em Capital no século XXI. E enfatiza que se observa a
tendência ao retorno dos rendimentos do capital, o que provoca o aumento mais
rápido da riqueza obtida por herança do que aquela que é obtida pelo rendimento
do trabalho, agravando ainda mais a desigualdade económica e social promovendo
mais instabilidade política.
(*)
Professor Associado, Director do
INNOVARE – UAL
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