(…)
Apesar da flagrante ilegitimidade da atual situação à luz do
direito internacional, Marrocos continua a rejeitar qualquer possibilidade de
decisão democrática que não seja a integração do território
(…)
Dois factos recentes agravaram este intolerável cenário.
(…)
A potência ocupante inventou uma “Iniciativa Marroquina para
a negociação de um estatuto de autonomia para a região do Saara”, (…) [em que] reitera
a negação frontal da autodeterminação nos termos das resoluções da ONU.
(…)
Que o Governo espanhol tenha cedido a tal proposta,
saudando-a, é grave.
(…)
Tanto ou mais grave é o governo português ter também
manifestado apoio ao plano marroquino, considerando-o uma “proposta realista,
séria e credível”.
(…)
Tal posição está em flagrante contradição com o património
histórico e diplomático de Portugal num outro caso cujo paralelismo é
cristalino: Timor.
(…)
Uma proposta de referendo no Saara em que as duas únicas
hipóteses são ficar sob ocupação ou ficar sob ocupação, ao arrepio do direito
internacional.
(…)
O segundo facto grave é que Portugal seja parte de uma
candidatura ao Campeonato do Mundo em 2030 que envolve Espanha e Marrocos e na
qual se prevê a realização de jogos em território ocupado.
(…)
Em 2021, o Tribunal Geral de Justiça da UE anulou os acordos
de pesca da UE com Marrocos por incluir os territórios ocupados do Saara sem
consultar os seus legítimos representantes.
(…)
Guterres, que lutou por Timor, não se esqueceu da importância
da persistência e da coerência dos valores nestas matérias.
José Soeiro, “Expresso” online
Um dos
maiores feitos de Hollywood foi exportar para quase todo o mundo o mito do
“sonho americano”.
(…)
A
ideia de que com trabalho e esforço qualquer um pode singrar na “terra das
oportunidades” serve para os pobres se responsabilizarem pela sua pobreza e
reconhecerem a justiça do privilégio.
(…)
Fora
do ecrã, os EUA são um dos países com menor mobilidade social, a léguas do
norte da Europa.
(…)
O
sistema de acesso [à universidade] já reproduz a diferença social e cultural na
sociedade.
(…)
Há
mais jovens oriundos das famílias dos 1% mais ricos nas universidades da Ivy
League do que dos 50% com menores rendimentos.
(…)
Numa
sociedade estratificada, (…), a revolta com a desigualdade é substituída pelo
ressentimento perante o fracasso.
(…)
A
discriminação positiva [para a entrada de alunos negros na universidade] foi
proibida, por referendo ou decisão dos eleitos, em nove estados.
(…)
Um
deles foi a Califórnia e, dois anos depois, a percentagem de alunos negros a
entrar na UCLA desceu de 7% para 4%.
(…)
[Nas Forças
Armadas] um em cada cinco militares são negros, mas só duas das 41 principais
patentes pertencem a esta minoria.
(…)
Uma
nação diversificada sob o comando de lideranças homogéneas é receita para
ressentimento, discórdia, violência e falta de coesão.
(…)
Um
terço dos lugares de Harvard são ocupados por filhos de antigos alunos.
(…)
São,
boa parte, filhos de doadores.
(…)
A
exigência de mérito individual fica para os pobres.
(…)
A base
da desigualdade é a perpetuação de um sistema afunilado à partida.
(…)
A
meritocracia é a mentira que se serve aos pobres para justificar o privilégio.
Daniel Oliveira, “Expresso” (sem link)
O
lugar-comum “à política o que é da política e à justiça o que é da justiça” é
uma completa falsidade.
(…)
Dá um estatuto de independência e isenção à “justiça” que ela
só tem por excepção.
(…)
Numa democracia, a “justiça” é politizada, como são todos os
três poderes clássicos.
(…)
Tal não significa que a justiça não deva ser independente nos
seus procedimentos.
(…)
Mas uma coisa é essa base política de tudo em democracia,
outra é a “justiça” actuar como agente político.
(…)
O caso mais grave deste tipo de comportamento de, na prática,
ilegalizar a política foi em Itália.
(…)
[Perante a corrupção generalizada do sistema político
italiano] a Operação Mãos Limpas tinha todo o sentido.
(…)
Mas ela tornou-se rapidamente, mais do que um acto de “justiça”,
numa actividade persecutória.
(…)
Em Portugal, a mesma tentação justicialista tem estado sempre
presente, com altos e baixos, na “justiça”.
(…)
A
tentação de ilegalizar a política está mais que presente nos dias de hoje em
Portugal e é, em conjunto com a comunicação social politizada e as asneiras do
Governo, uma fonte importante da crise da democracia que vivemos.
Pacheco Pereira, “Público” (sem link)
Pode e deve mencionar-se as matérias de grande significado
que ficaram de fora [da recente revisão do Código do Trabalho] e deviam
ter sido consideradas para equilibrar poderes.
(…)
O ajustamento e o valor daquelas alterações serão
determinados pelas relações de forças entre os atores, pelas opções políticas
em cada tempo e pela jurisprudência que se vai formando.
(…)
E o atual contexto está carregado de armadilhas.
(…)
Debaixo de uma falsa modernidade, prossegue a promoção do
conceito “colaborador” em substituição de trabalhador.
(…)
Foi a democracia que acabou com esse velho colaboracionismo.
O conceito não tem enquadramento constitucional ou legal.
(…)
Hoje vários dos argumentos expandidos contra disposições
legislativas progressistas visam estilhaçar o Sistema de Relações Laborais da
nossa Democracia.
(…)
O Direito do Trabalho traça balizas que obrigam a articular
interesses económicos com valorização dos direitos sociais e humanos.
(…)
Respostas voluntaristas e pretensamente pós-modernas que o
Governo fez avançar, e promove com ligeireza, podem transformar-se em perigosas
armadilhas.
Ao fim
de tantos tropeções, dores de cabeça, trabalho de bastidores, a Lei do Restauro
da Natureza foi finalmente aprovada.
(…)
Tenho
dito e reescrito que a informação da urgência, sobre a necessidade de recuperar
ecossistemas degradados, é tão necessária e pedagógica quanto a questão do
clima.
(…)
Apesar
de aprovada, esta lei foi muito amputada. A politização em torno desta
discussão veio mostrar quão difícil tem sido a mudança dos interesses
económicos.
(…)
A
segurança alimentar e a quantidade de alimento produzido foram as “armas”
usadas em torno desta politização, como se o facto da preservação da
biodiversidade fosse afectar a produção alimentar.
(…)
Do
ponto de vista das pescas, a delimitação de certas zonas como defeso ou a
constituição e preservação de pradarias marinhas asseguram a presença de nichos
ecológicos para berço de espécies piscícolas.
(…)
O grande problema é que o tempo de resposta da natureza é
diferente do desejado pelos interesses económicos e políticos.
(…)
Um dos
problemas ligados à agricultura prende-se com a recuperação de turfeiras, pauis
ou zonas húmidas que estão em vias de extinção.
(…)
“Obrigar” a recuperação destes ecossistemas é algo impensável
para os detractores da lei do restauro.
(…)
Pensar
que a floresta é apenas a árvore de exploração é reduzir a importância de uma
verdadeira floresta com diferentes estratos arbóreos e arbustivos.
(…)
Actualmente, o incentivo são as florestas uniformes,
contínuas e contíguas que não fazem solo e ainda por cima são ígneas.
(…)
O
importante agora é demonstrar, com seriedade científica, que os defensores
desta lei apenas se preocupam com a nossa sobrevivência enquanto espécie neste
grande ecossistema que é o planeta Terra.
Maria Amélia Martins-Loução, “Público” (sem link)
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