(…)
O que aconteceu no Porto no final da semana passada foi um
crime.
(…)
Insegurança é isto: viver numa cidade em que um gang
encapuçado invade a propriedade privada, destrói uma casa e espanca moradores
que estão a dormir.
(…)
[A condenação deste crime] não deve, por isso, vir
acompanhada de nenhum “mas”.
(…)
Já agora, por que razão, em tantas notícias, não se fala das
vítimas como moradores, que é o que também são, como se apenas outros fossem
“moradores” e aqueles não?
(…)
[Os responsáveis políticos] são aqueles que no espaço público
associam imigração e criminalidade, o que é objetivamente falso.
(…)
É quem incentiva o preconceito contra os imigrantes e o leva
para a esfera institucional, como André Ventura, cuja reação à atuação da
milícia foi desculpar o crime.
(…)
A motivação do crime foi o racismo e a ideia de que se pode
espancar imigrantes e obter aplausos.
(…)
[Rui Moreira] criticou o ataque e opôs-se a qualquer ato
racista e xenófobo, o que é evidentemente de louvar.
(…)
Depois não resistiu a desviar a discussão para o debate em
torno da suposta “imigração descontrolada” e, mais grave, sugeriu a extinção da
Agência para a Integração, Migrações e Asilo.
(…)
Regressar ao SEF que tínhamos seria um desastre absoluto.
(…)
Rui Moreira tem também responsabilidades na legitimação da
extrema-direita, por ter permitido uma manifestação neonazi no Porto, no
passado mês de abril.
(…)
[A Câmara] não tem ajudado a resolver o problema da habitação
que afeta trabalhadores portugueses e estrangeiros.
(…)
É preciso contrariar até à exaustão uma mentira e uma ideia
falsa: não há nenhuma relação entre criminalidade e imigração.
(…)
Entre 2017 e 2022, dizem os Relatórios Anuais de Segurança
Interna, a criminalidade geral e a criminalidade violenta baixaram.
(…)
Não é a imigração que os causa: há muito mais portugueses a
cometer crimes do que estrangeiros.
(…)
Há uma franja no nosso país que hoje se sente legitimada para
exercer a sua violência verbal e física, porque encontra respaldo em discursos
públicos e institucionais.
(…)
Há palavras e associações que são gatilhos para a violência.
José Soeiro, “Expresso” online
Foi no dia 23 de abril de 2024 votado no Parlamento Europeu a
proposta do (novo) Regulamento que permite à União Europeia (UE) proibir a
venda, a importação e a exportação de bens fabricados com recurso ao trabalho
forçado.
(…)
Apesar de em pleno século XXI, há cerca de 27,6 milhões de
pessoas em trabalho forçado, o equivalente a quase três vezes a população de
Portugal.
(…)
Esta realidade verifica-se, sobretudo, em grupos de pessoas
vulneráveis, nomeadamente, mulheres, crianças, migrantes, entre outros.
(…)
Os números mostram que nenhuma parte do mundo está livre desta
realidade.
(…)
A UE está agora mais perto de poder ter um papel fundamental
— pelo menos mais ativo — na eliminação do trabalho forçado a nível global.
(…)
No caso de violação das normas previstas no Regulamento,
ficam as empresas infratoras sujeitas ao pagamento de coimas que se esperam ser
pesadas e dissuasoras.
(…)
[Todas as empresas] irão ter de assegurar que nenhum dos
produtos que vendem ou colocam à venda teve, durante todo o seu processo de
produção, a utilização de trabalho forçado.
(…)
Não tenho dúvidas que os consumidores vão estar cada vez mais
atentos e as empresas vão ter, necessariamente, de fazer a sua parte.
(…)
Vai, seguramente, haver um antes e um depois deste
Regulamento!
Tiago Magalhães, “Expresso” online
O aproveitamento demagógico dos problemas da imigração tem
sido uma carta aberta à inscrição de algumas das piores e mais trágicas
expressões da natureza humana na última década.
(…)
São já demasiados os casos em que responsáveis políticos,
deputados inclusive, escolhem o caminho grotesco do racismo e xenofobia perante
algo que possa ter o dedo de um imigrante.
(…)
O racismo político escolhe os seus alvos pela cor da pele e
coloca a tónica não no ataque racista mas no problema que, aparentemente, quer
resolver pela violência da mentira.
(…)
O crime de ódio perpetrado contra cidadãos magrebinos no Porto
(…) continuaria a ser um exemplo implacável do sentimento irracional que cresce
na sociedade portuguesa por ver como imigrantes fazem o trabalho que ninguém
quer fazer.
(…)
Há tanta gente a fechar os olhos à História de um país que
pode agradecer o favor de existir aos migrantes com i ou com e.
Uma
boa parte da sociedade portuguesa gosta da ideia de que a colonização
portuguesa foi mais suave, mais ligeira, menos horrível do que as outras
colonizações.
(…)
A esmagadora maioria da narrativa histórica
sobre o passado colonial português, é construída a partir do olhar colonizador
de Portugal.
(…)
Esta
narrativa é parcial e pretende, propositadamente, embelezar um fenómeno que,
por definição, tanto na sua génese como na sua evolução, é trágico.
(…)
Nós,
os colonizados, ainda não conseguimos traduzir a nossa versão, não conseguimos
construir a nossa narrativa histórica sobre o passado colonial.
(…)
Não
tenho a pretensão de afirmar que narrativa dos colonizados é a mais verdadeira
e imparcial do que a do colonizador.
(…)
O que
defendo é a urgência de um confronto entre as duas visões, que nos permita
alcançar, uma terceira via, alternativa e coletiva.
(…)
Esta
ausência de confronto de pensamentos sobre o passado tem tido reflexos no
debate sobre a questão do racismo, nomeadamente no racismo estrutural, que está
a agravar-se em Portugal.
(…)
Pessoalmente, entendo que a História foi o que foi.
(…)
A História reflete “um olhar” e não “o olhar”
sobre os factos.
(…)
Parece-me
mais produtivo e inteligente a criação da narrativa própria dos colonizados e
de espaços para sua visibilidade. Importante é a tal terceira via.
(…)
A intervenção
do Presidente tem a importância de fazer com que se discuta a história
colonial, as suas consequências e como poderemos utilizá-la para elevar as
relações de Portugal com as antigas colónias.
(…)
Nunca a narrativa histórica será neutral.
Paulo Mendes, “Público”
(sem link)
Sem comentários:
Enviar um comentário