Vamos reter duas ideias da curta crónica
que a jornalista Ana Sá Lopes assina (ASL) no “Público” de hoje para
discordarmos delas.
A primeira é a frase com que inicia o seu
texto onde afirma que “Os bancos não aprenderam nada com a
crise financeira de 2008”. É claro que aprenderam muito bem que todos os
desmandos que cometerem sempre terão a cobertura dos atuais poderes que dominam
o mundo. E a prova está no que tem acontecido em Portugal, onde a banca conta
sempre com os dinheiros públicos como se se tratasse de uma torneira
permanentemente aberta para o que lhes der na real gana, ao mesmo tempo que da
tal torneira apenas caem algumas gotas para as necessidades mais prementes do
país em áreas tão fundamentais como saúde, educação e segurança social, para
citarmos apenas algumas das que mais propaladas têm sido durante a crise que
estamos a viver e que se vai prolongar não se sabe por quanto tempo.
O que está a
acontecer com o Novo Banco (NB) é um autêntico escândalo nacional. Depois de
receber mais uma tranche de 850 milhões, para tapar os prejuízos sobre
prejuízos que tem acumulado, eis que os salários dos administradores aumentaram
75%. Se isto não é uma provocação à generalidade dos contribuintes portugueses
e a todos aqueles que atualmente vivem num mar de dificuldades para sobreviverem,
então, não sabemos o que é uma provocação.
Outra ideia de
que discordamos de ASL tem a ver com a classificação de infantilidade que
atribui ao Estado (primeiro-ministro e Presidente da República) à aprovação da
atribuição ao NB da “famosa” fatia dos 850 milhões nas condições em que teve
lugar já que ambos tinham obrigação de saber com o que podiam contar da parte
de Centeno, o ministro das Finanças mais à direita com que um Governo PS alguma
vez contou: austeridade para a generalidade da população e mãos largas para os
mais poderosos.
De qualquer
maneira, aqui fica o texto de ASL por entendermos que, com as exceções
assinaladas, em poucas palavras a jornalista deixa expresso o “escândalo nacional”
que constitui “o estado de excepção do Novo Banco”
Os bancos não aprenderam nada com a
crise financeira de 2008. Havia uma esperança, na época, de que o choque
obrigasse a uma reforma profunda no sistema financeiro — não aconteceu. Foi
preciso mudar alguma coisa para que tudo ficasse na mesma, glosando a famosa e
repetida frase de O Leopardo. Em geral, os hábitos e o modus operandi
pré-2008 prosseguiram, com mais ou menos vergonha.
As classes sociais da Idade Média, antes
do advento da burguesia, eram três: clero, nobreza e povo. Os bancos pertencem
à aristocracia — na nossa sociedade não são tratados como os demais,
particulares e empresas. Devem mesmo possuir um direito sobre a terra e os
rendimentos atribuídos por um rei que é investido alegadamente por Deus. Os escândalos do
BES radicam nesta noção de estar acima de todos.
Foi-se o BES e ficou o “banco
bom” — o Novo Banco —, que acabou de receber mais uma tranche de favores
do Estado: os famosos 850 milhões que iam provocando uma crise política e que
nos demonstraram como o nosso Estado (primeiro-ministro, Presidente da
República) é um portento à infantilidade. Os dois defendiam que não fosse feita
uma transferência enquanto uma determinada auditoria não estivesse pronta; a
transferência foi feita pelo ministro das Finanças porque já estava aprovada;
não aconteceu nada. Afinal, segundo o gabinete do primeiro-ministro, auditorias
já havia muitas.
O que Cristina
Ferreira nos conta nesta quarta-feira no PÚBLICO é de fazer
espumar de indignação o mais sóbrio dos portugueses. Apesar de acumular
prejuízos em cima de prejuízos e de continuar a ter capital injectado pelo
Estado — sim, é um empréstimo, mas qualquer contribuinte adoraria ter um
empréstimo daqueles a várias décadas —, os salários dos administradores do
Novo Banco subiram 75% com a venda à Lone Star.
Um caso manifesto de hubris. Afinal, o Estado cá
está para pagar — ou emprestar durante décadas — a conta. E as
auditorias foram todas feitas e devem ter corrido excepcionalmente bem, como
nos garantiu o tal comunicado do primeiro-ministro escrito depois das
tréguas com Mário Centeno. E vêm aí prémios aos
gestores — responsáveis pelo sucesso dos prejuízos — que o
Governo e o PS candidamente questionam, sugerindo que se reverta a decisão.
No dia em que
se sabe que o desemprego
aumenta e a covid-19 nos coloca à beira de uma nova crise económica,
o estado de excepção do Novo Banco é um escândalo nacional.
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