quarta-feira, 20 de maio de 2020

A BANCA SABE QUE O PODER POLÍTICO DÁ TODA A COBERTURA A TODOS OS DESMANDOS DO CAPITAL FINANCEIRO


Vamos reter duas ideias da curta crónica que a jornalista Ana Sá Lopes assina (ASL) no “Público” de hoje para discordarmos delas.
A primeira é a frase com que inicia o seu texto onde afirma que “Os bancos não aprenderam nada com a crise financeira de 2008”. É claro que aprenderam muito bem que todos os desmandos que cometerem sempre terão a cobertura dos atuais poderes que dominam o mundo. E a prova está no que tem acontecido em Portugal, onde a banca conta sempre com os dinheiros públicos como se se tratasse de uma torneira permanentemente aberta para o que lhes der na real gana, ao mesmo tempo que da tal torneira apenas caem algumas gotas para as necessidades mais prementes do país em áreas tão fundamentais como saúde, educação e segurança social, para citarmos apenas algumas das que mais propaladas têm sido durante a crise que estamos a viver e que se vai prolongar não se sabe por quanto tempo.
O que está a acontecer com o Novo Banco (NB) é um autêntico escândalo nacional. Depois de receber mais uma tranche de 850 milhões, para tapar os prejuízos sobre prejuízos que tem acumulado, eis que os salários dos administradores aumentaram 75%. Se isto não é uma provocação à generalidade dos contribuintes portugueses e a todos aqueles que atualmente vivem num mar de dificuldades para sobreviverem, então, não sabemos o que é uma provocação.
Outra ideia de que discordamos de ASL tem a ver com a classificação de infantilidade que atribui ao Estado (primeiro-ministro e Presidente da República) à aprovação da atribuição ao NB da “famosa” fatia dos 850 milhões nas condições em que teve lugar já que ambos tinham obrigação de saber com o que podiam contar da parte de Centeno, o ministro das Finanças mais à direita com que um Governo PS alguma vez contou: austeridade para a generalidade da população e mãos largas para os mais poderosos.
De qualquer maneira, aqui fica o texto de ASL por entendermos que, com as exceções assinaladas, em poucas palavras a jornalista deixa expresso o “escândalo nacional” que constitui “o estado de excepção do Novo Banco”

Os bancos não aprenderam nada com a crise financeira de 2008. Havia uma esperança, na época, de que o choque obrigasse a uma reforma profunda no sistema financeiro — não aconteceu. Foi preciso mudar alguma coisa para que tudo ficasse na mesma, glosando a famosa e repetida frase de O Leopardo. Em geral, os hábitos e o modus operandi pré-2008 prosseguiram, com mais ou menos vergonha.
As classes sociais da Idade Média, antes do advento da burguesia, eram três: clero, nobreza e povo. Os bancos pertencem à aristocracia — na nossa sociedade não são tratados como os demais, particulares e empresas. Devem mesmo possuir um direito sobre a terra e os rendimentos atribuídos por um rei que é investido alegadamente por Deus. Os escândalos do BES radicam nesta noção de estar acima de todos.
Foi-se o BES e ficou o “banco bom” — o Novo Banco —, que acabou de receber mais uma tranche de favores do Estado: os famosos 850 milhões que iam provocando uma crise política e que nos demonstraram como o nosso Estado (primeiro-ministro, Presidente da República) é um portento à infantilidade. Os dois defendiam que não fosse feita uma transferência enquanto uma determinada auditoria não estivesse pronta; a transferência foi feita pelo ministro das Finanças porque já estava aprovada; não aconteceu nada. Afinal, segundo o gabinete do primeiro-ministro, auditorias já havia muitas.
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O que Cristina Ferreira nos conta nesta quarta-feira no PÚBLICO é de fazer espumar de indignação o mais sóbrio dos portugueses. Apesar de acumular prejuízos em cima de prejuízos e de continuar a ter capital injectado pelo Estado — sim, é um empréstimo, mas qualquer contribuinte adoraria ter um empréstimo daqueles a várias décadas —, os salários dos administradores do Novo Banco subiram 75% com a venda à Lone Star.
Um caso manifesto de hubris. Afinal, o Estado cá está para pagar — ou emprestar durante décadas — a conta. E as auditorias foram todas feitas e devem ter corrido excepcionalmente bem, como nos garantiu o tal comunicado do primeiro-ministro escrito depois das tréguas com Mário Centeno. E vêm aí prémios aos gestores — responsáveis pelo sucesso dos prejuízos — que o Governo e o PS candidamente questionam, sugerindo que se reverta a decisão.
No dia em que se sabe que o desemprego aumenta e a covid-19 nos coloca à beira de uma nova crise económica, o estado de excepção do Novo Banco é um escândalo nacional.

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