terça-feira, 6 de outubro de 2020

UMA PÉROLA…

 

Caiu hoje na nossa mesa de trabalho, através de uma rede social, um curto texto com excertos do primeiro programa do PPD/PSD – na realidade, nessa altura a sigla era apenas PPD de Partido Popular Democrático – elaborado logo em 1974. Trata-se de uma pequena preciosidade ou “pérola”, como designamos no título deste artigo porque o programa é muito mais extenso e digno de uma pormenorizada análise atual a que ainda ninguém se debruçou. Convenhamos que seria muito interessante… como se pode constatar perante o que aqui deixamos a seguir. Quem já leu o primeiro programa do PPD ainda se lembra das propostas dos “sociais-democratas” e da via “social-democrata para o socialismo”. De qualquer maneira, a sugestão que, para já aqui deixamos aos frequentadores deste blog, é que procurem o texto integral do citado primeiro programa do PPD e se deleite a ler um puro exercício do mais desbragado oportunismo político. Alguém que não conheça do que se trata, pode ser levado(a) a acreditar que é obra de algum partido ideologicamente próximo dos ideais comunistas.  

Na realidade, nada do que lá está escrito foi alguma vez defendido para o futuro dos portugueses nem essa foi a intenção de quem elaborou o programa nem dos que o aprovaram. Estamos, antes, perante um exemplo real do oportunismo político que atravessou toda a direita no pós-25 de Abril, tentando não perder o contacto com os justos anseios de mudança da esmagadora maioria da população portuguesa, mas sem a intenção de lhes dar qualquer seguimento. Veja-se que, até o Prof. Freitas do Amaral, primeiro presidente do CDS, chegou a defender num comício uma “sociedade sem classes” em Portugal – há um vídeo que documenta esta afirmação.

É claro que toda esta retórica da direita em 1974 jamais teve qualquer avanço e rapidamente se esfumou para a defesa dos interesses mesquinhos e de classe que estes grupos representavam e representam.

Senão, façamos um simples exercício mental no sentido de nos interrogarmos como é que, de um dia para o outro, simpatizantes e defensores convictos da ditadura, passaram a criticar de forma radical o sistema capitalista, propondo a nacionalização de muitas empresas privadas e ações como a expropriação ou arrendamento compulsivo da propriedade agrária ou mesmo a defesa de uma “sociedade sem classes”… Nada disto tinha qualquer ligação à realidade mas a verdade é que, muitas vezes com a ajuda de democratas, foram impondo um retrocesso até chegarmos à situação atual em que a defesa da mais pequena melhoria das condições de vida para os mais desfavorecidos tem de ser conseguida a pulso por parte das forças do progresso.  

Vejamos, pois, alguns curtos excertos do primeiro programa do PPD (mais tarde PSD), uma verdadeira pérola a quase meio século de distância da sua elaboração.


“Não há verdadeira democracia sem socialismo, nem socialismo sem democracia”;

p. 14 – “O capitalismo multiplicou as desigualdades sociais”;

p. 15 – “O capitalismo conseguiu expandir a produção a um ritmo extraordinário (…) mas fê-lo à custa da exploração dos trabalhadores e das nações produtoras de matérias primas, colocando a maioria da população na dependência de alguns diretores de grandes grupos económicos incontroláveis e deixando afinal insatisfeitas muitas necessidades essenciais através da criação artificial de necessidades e da manipulação do consumidor”;

p. 17 – “A industrialização conduziu à acumulação do capital financeiro que deu um poder extraordinário aos grupos que dominam os grandes bancos comerciais”;

p. 19 – “Um sistema económico baseado no lucro individual revelou-se incapaz de, por si só, sem intervenção do Estado, assegurar o pleno emprego e planear a satisfação das necessidades coletivas.”

p. 21 – “urgência da eliminação de outras causas de alienação e opressão e, desde logo, da superação da estrutura jurídica da empresa que a torna num espaço social estranho para a pessoa do trabalhador, da eliminação dos temores pela segurança perante riscos de existência”.

Na p. 100 propõe a eliminação de monopólios ou privilégios de qualquer espécie para o setor privado.

Na p. 103 e 103 pretende-se assegurar a efetiva submissão do poder económico ao poder político, pelo que o estado intervirá diretamente na produção, nacionalizando, e resumimos, monopólios naturais, empresas sectorialmente dominantes, indústrias básicas ou “de tal modo importantes que daí avenha poder excessivo”, etc.

Na p. 104 defende-se a planificação económica democrática.

Na p. 116 a expropriação ou arrendamento compulsivo da propriedade agrária.


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