(…)
Percebe-se
que tudo se resume à dificuldade em aceitar estes novos atores políticos, com
uma agenda que julga “folclórica” e “ultraminoritária”.
(…)
A
linguagem, como as relações de poder em que ela se sustenta, tem camadas de
história que não se atenuam no tempo da política, mas no tempo em que as
mudanças sociais vão acontecendo.
(…)
Um uso
diferente das palavras pode acelerar a mudança
(…)
Se for
levada até às últimas consequências, a linguagem inclusiva torna-se um código
exclusivo dos grupos que a usam, e por isso inútil.
(…)
Sim,
cada palavra é uma trincheira. Mas se transformamos tudo numa trincheira,
desistimos de construir alguma coisa para além da bolha onde nos sentimos
seguros.
(…)
A
afirmação das identidades dos que sofreram milénios de opressão, sejam mulheres,
minorias étnicas, homossexuais ou transexuais, faz parte da sua luta pela
igualdade.
(…)
Uma
parte (não todos) destes movimentos identitários é parente envergonhada do
individualismo neoliberal.
(…)
[Este
progressismo neoliberal] não aspira a qualquer fraternidade humana e,
mesmo que o negue sempre, secundariza a desigualdade da distribuição da riqueza.
(…)
[Há
uma ratoeira] onde uma suposta “interseccionalidade” aceita, na prática, que a
única discriminação que se pode manter invisível é a de classe, que oprime a
maioria da população do mundo.
(…)
Uma
ratoeira aproveitada por quem até aceitará mais mulheres, negros ou gays no
conselho de administração da sua empresa desde que se mantenha intacto o seu
privilégio económico e social.
(…)
Apesar
das reações agressivas de quem se sente em perigo, as mulheres e as minorias
têm conquistado direitos.
(…)
Mas,
em simultâneo, a desigualdade socioeconómica não pára de se agravar.
(…)
Ninguém
se choca com o uso do “colaborador” no lugar do “trabalhador”, apagando a
identidade de classe.
(…)
No
tempo da afirmação de identidades, a de classe foi esmagada e não entra nas
preocupações da “linguagem inclusiva”.
(…)
O
privilégio económico passou a ser o mais aceitável de todos.
Daniel Oliveira, “Expresso” (sem link)
O velho passa-culpas da invocação de
crises para impor sacrifícios aos povos encontra o cenário perfeito para a sua
utilização: a conjugação dos impactos da pandemia com os do clima belicista
acelerado pela invasão e guerra na Ucrânia e os resultantes da brutal
degradação climática.
(…)
Todos reconhecem que a inflação este ano comerá
1/14 avos dos salários e pensões.
(…)
Para o Governo, a resposta ao agravamento
das condições de vida e da pobreza pode ser "garantida" por subsídios
e apoios pontuais às famílias e pessoas necessitadas.
(…)
Uns e outros [Governo e PSD] secundarizam
os salários e a necessidade da sua atualização face à inflação.
(…)
[A UE] será crescentemente secundarizada
e acantonada, aniquilando expectativas dos povos europeus nesse projeto comum,
que dava enfoque à justiça social e aos direitos humanos.
(…)
A União Europeia (UE) terá cada vez mais
"passageiros clandestinos" no seu comboio e tornar-se-á ingerível ou
antidemocrática.
(…)
O nosso modelo de sociedade estará em
causa, mesmo que o "projeto europeu" não descarrile totalmente.
(…)
O fosso remuneratório entre trabalhadores
da Administração Pública e do setor privado - para funções semelhantes - não
pára de se aprofundar.
(…)
[Também] a insistência na conceção de que
os problemas do emprego se resolvem pelo lado da oferta da formação.
(…)
Vermos uma maioria absoluta do PS e o seu
Governo arrastados na enxurrada, muito agarrados a exercícios panfletários e
incapazes de definir objetivos e planificar ação, é confrangedor.
Chegadas
a casa, no defeso do futebol, as pessoas têm televisões monotemáticas, com as imagens
“fortes” que dão audiências, seja da guerra da Ucrânia, seja dos incêndios.
(…)
Dias
inteiros de “breaking news”
não “consciencializam” ninguém, muito menos informam, mas deixam o rastro de um
mundo cruel onde não há esperança, adormecem a razão e alimentam a irritação.
(…)
Muitas
discussões revelam como o fim do mundo pacífico e relativamente fácil e
prazenteiro em que a Europa viveu nas últimas décadas suscita egoísmo e fúria.
(…)
Nestas condições, a violência da zanga cresce por todo o lado
no quotidiano das pessoas comuns.
(…)
O que
verdadeiramente me interessa é o “estado” da democracia, cuja fragilidade vem
de ser uma escolha e não uma inevitabilidade.
(…)
Claro
que eu, no meu bom, velho e ultrapassado marxismo, penso que em primeiro lugar
a zanga cresce porque as pessoas vivem pior, e, segundo, porque não têm
esperança de que possam vir a viver melhor.
(…)
A falta de esperança, que é do domínio cultural, é que é mais
perigosa para a democracia.
(…)
Mas se o “mau viver” cresce, em termos materiais e
“espirituais”, estamos mesmo muito tramados.
Pacheco Pereira, “Público” (sem link)
Já se
sabe que “envelhecer no Brasil é muito perigoso”, porque com o abandono social
e a ausência do Estado, a solidão torna-se mais pesada.
(…)
Mas
também entre os jovens está a crescer a solidão, a violência, o racismo e a
homofobia, tendo os internamentos de crianças e adolescentes por lesões
autoprovocadas crescido 34% de 2020 para 2021 e os suicídios subido 116% de
2010 a 2019.
(…)
A
pandemia obrigou ao teletrabalho, impôs a solidão a quem estava habituado ao
contacto com outros e levou a que muitos acabassem por se sentir sozinhos e
desligados do mundo.
(…)
Os
especialistas falam em dosear o teletrabalho, tudo o que seja mais de dois a
dois dias e meio em casa, afirma a investigadora [Caroline
Knight, do Instituto do Futuro do Trabaljo da Universidade Curtin], é
prejudicial.
António Rodrigues, “Público” (sem link)
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