(…)
Para o Ministro [da Educação], dir-se-ia que, a haver
manifestações de professores, deveriam ser para agradecer ao governo a
excelência da sua ação.
(…)
Há uma nova vaga de protesto [dos professores] que é também
uma reação a uma dupla desvalorização sentida nas escolas.
(…)
A primeira dimensão da desvalorização tem a ver com as
carreiras e com a degradação das condições económicas e profissionais dos
professores.
(…)
Para o empobrecimento contribuem também os custos de
deslocação para fora da área de residência e a ausência de apoios perante as
rendas impossíveis para quem tem de se instalar no local da colocação.
(…)
À desvalorização da carreira por opções económicas - e também
agravado por ela - soma-se o desalento pela sobrecarga alienante das exigências
burocráticas .
(…)
A explosão da indignação aconteceu quando, utilizando a
iminência da falta de professores como pretexto, o governo abriu a porta a mais
uma machadada no concurso nacional.
(…)
Essa indignação tem razões fundas, ancoradas no dia-a-dia de
quem está nas escolas.
(…)
Não há transformação da escola sem o reconhecimento material
e simbólico dos seus profissionais.
(…)
A luta em curso é uma lição para quem estiver disponível para
aprender.
José Soeiro, “Expresso” online
Em ambos os casos [Capitólio e Brasília] tratava-se de
recusar o resultado de eleições perdidas.
(…)
Na ocupação dos palácios do Presidente, do Parlamento e do
Tribunal brasileiros se tratava unicamente de vandalizar as instalações.
(…)
Quando chefiavam os Estados que somam 500 milhões de pessoas,
[Trump e Bolsonaro] abandonaram as suas populações à pandemia (…). O resultado
foi, entre os dois países, mais de um milhão de mortos.
(…)
É difícil encontrar tamanho desprezo pelos seus povos em
algum títere contemporâneo.
(…)
Um bufão só tem a oferecer a sua incompetência, tantas vezes
caricatural como ambos fizeram questão de lembrar amiúde, como prova de
adequação para o cargo.
(…)
O bufão no poder e depois do poder passou a ser o sinónimo do
ataque à vida democrática, essa é – e vai ser – a direita do século XXI.
(…)
Trump mandou a turba e desapareceu. Bolsonaro mandou a turba
mas, prudentemente, refugiou-se numa mansão na Flórida.
Francisco Louçã, “Expresso” online
A ocupação
violenta dos edifícios do poder legislativo,
executivo e judicial [brasileiro] e dos espaços circundantes, (…) por
parte de manifestantes de extrema-direita, configuram actos de terrorismo
planeados e minuciosamente organizados pelos seus cabecilhas.
(…)
Trata-se,
pois, de um acontecimento que põe seriamente em causa a sobrevivência da
democracia brasileira e que, pelo modo como ocorreu, pode amanhã ameaçar outras
democracias no continente e no mundo.
(…)
O
movimento de extrema-direita é global e as suas acções a nível nacional
beneficiam das experiências antidemocráticas estrangeiras e muitas vezes agem
em aliança com elas.
(…)
Além das alianças, as experiências de um país servem de
referência a outro país e constituem uma
aprendizagem.
(…)
A
invasão da Praça dos Três Poderes em Brasília é um cópia “melhorada” da invasão do Capitólio em Washington, em 6 de
Janeiro de 2020, aprendeu com esta e tentou fazer melhor.
(…)
No
caso brasileiro, a invasão de Brasília foi organizada a partir de diferentes
cidades e regiões do país e em cada uma delas havia cabecilhas identificados.
(…)
O objectivo era criar o caos pela carência de produtos
essenciais.
(…)
[Em países democráticos a extrema-direita pretende] investir
fortemente nas redes sociais para ganhar as eleições com o objectivo de, se as
ganhar, não usar o poder democraticamente nem sair do poder democraticamente.
(…)
No
caso de não prever ganhar, começar desde cedo a questionar a validade das
eleições e declarar que não aceita outro resultado senão a sua vitória.
(…)
Para ter êxito, este ataque frontal à democracia necessita de
ter o apoio de aliados estratégicos, quer nacionais, quer estrangeiros.
(…)
No
caso brasileiro, é particularmente clamorosa a conivência, passividade e se não mesmo cumplicidade
das forças de segurança do Distrito Federal de Brasília e dos seus
dirigentes.
(…)
No caso
brasileiro, é também escandaloso que as Forças Armadas se tenham mantido em
silêncio, sobretudo quando era conhecido o propósito dos organizadores de criar
o caos para provocar a sua intervenção.
(…)
Neste
caso, o contraste com os EUA é gritante. Quando foi da invasão do Capitólio, os
chefes militares norte-americanos fizeram questão de vincar a sua defesa da
democracia.
(…)
O
Brasil está a pagar um preço alto por não ter punido os crimes e os criminosos
da ditadura militar (1964-1985).
(…)
Como se sabe, nestes dois países [Chile e Argentina] os
responsáveis pelos crimes da ditadura militar foram julgados e punidos.
(…)
Desta vez, os EUA estiveram do lado da democracia e isso fez
toda a diferença no caso do Brasil.
(…)
Apoiar o bolsonarismo de extrema-direita no Brasil era dar
força à extrema-direita trumpista norte-americana.
(…)
É de
prever que se pretenda criar uma situação de ingovernabilidade que dificulte ao
máximo a actuação do Presidente Lula da Silva nos próximos anos.
(…)
Para
garantir a sustentabilidade da extrema-direita é necessário ter uma base
social, dispor de financiadores-organizadores e de uma ideologia
suficientemente forte para criar uma realidade paralela.
(…)
O Brasil é uma sociedade com grande desigualdade
socio-económica agravada pela discriminação racial e sexual.
(…)
Os financiadores-organizadores parecem ser, no caso do
brasileiro, sectores do baixo capital industrial, agrário, armamentista e de
serviços .
(…)
A tentativa de golpe no Brasil é um aviso à navegação.
Os democratas brasileiros, latino-americanos, norte-americanos e, afinal, de
todo o mundo devem levar muito a sério este aviso.
Boaventura Sousa Santos, “Público”
(sem link)
Sem comentários:
Enviar um comentário