quinta-feira, 14 de setembro de 2017

A IDEOLOGIA EXISTE Á DIREITA E À ESQUERDA


Os ideólogos da direita portuguesa vivem um momento de grande depressão por falta de argumentos que contrariem os agradáveis resultados obtidos com o actual Governo ancorado à esquerda. Vai daí, jogam mão dos argumentos mais falaciosos e ridículos que qualquer mente minimamente informada sabe não terem a menor correspondência com a realidade. Foi risível a recente afirmação de Cavaco, quase a espumar pela boca de raiva, segundo a qual estávamos perante uma revolução socialista. Ele não é um ingénuo, sabe muito bem o que diz e os resultados que pretende obter ainda que de forma desonesta. É, pois, completamente desonesta mas não é nova a ideia que se pretende divulgar que ideologia só existe à esquerda e que a direita do neoliberalismo radical não é ideológica mas apenas realista. Faz lembrar a propaganda salazarista, retomada mais tarde por Cavaco segundo a qual a situação trabalhava para o bem do povo enquanto a oposição fazia política.
O texto seguinte é a transcrição de um artigo de opinião assinado por Domingos Lopes no Público de hoje onde o autor desmonta com muita mestria a afirmação do pensamento único dominante segundo o qual apenas há ideologia à esquerda.
Depois do colapso da URSS tornou-se dominante um pensamento único que se alicerça no que se chamou de fim da História e do triunfo do liberalismo na sua nova versão adaptada à globalização. A própria União Europeia deixou cair a coesão social e abraçou a austeridade como programa político.
Em Portugal, Cavaco foi um arauto na defesa da troika e da política de austeridade. Deu todo o seu apoio ao governo de Passos que envenenou o país com o empobrecimento. Nessa altura defendiam que aquela política não tinha alternativa, era a única que Portugal podia seguir.
O senhor Schäuble também os abençoou na sua missão magnânima de impor aos portugueses o que ele não queria para os alemães. Todos se lembrarão dos ataques de Cavaco, Passos, Portas, Maria Luís e tutti quanti a Tsipras por querer respeitar a opinião do povo grego manifestada em eleições e que passava por rejeitar as imposições da troika.
Podia lá ser, gritavam. Irão bater no paredão da realidade, acrescentavam. Como se a realidade existente na Grécia resultante das eleições e de um referendo passasse a ser um devaneio de um povo, berço da civilização, país bem mais antigo que alguns dos que hoje capitaneiam a UE. Aquela realidade era a saída da vontade soberana e democrática da população grega. Mas não se adaptava à realidade dos ideólogos da austeridade.
Os sacerdotes do Deus único, o mercado, classificam todos os que não seguirem de olhos vendados o bezerro de oiro de padecerem de visões ideológicas irrealistas. Pretendem eternizar esta realidade de empobrecer os pobres e enriquecer os ricos. Juram a pés juntos que não têm ideologia, ao contrário de todos os que pretendem mudar a realidade, esses sim toldados por uma visão ideológica, a de que é possível mudar as coisas, como tem acontecido, pois não vivemos nem no esclavagismo, nem na Idade Média, nem como se vivia há 50 anos.
Para estes ideólogos, Portugal devia continuar a fazer reformas sem fim para o empobrecimento geral do país e enriquecimento dos mais ricos. Como se este objetivo não fosse uma ideologia. Interrompido em parte este ciclo de “reformas” lideradas por Passos, estão danados por se estar a provar que é possível viver de outro modo, restituindo rendimentos e aumentando, mesmo que poucochinho, os salários, diminuindo os impostos à maioria de população.
Continua a ser dominante, sobretudo nos media, este pensamento único que se traduz na ideia de que o mal advém dos que trabalham, que os poderosos são quem pode fazer progredir os países e os mais pobres só lhes resta “amouchar”, de que trabalhar aos sábados e domingos é absolutamente normal e quiçá um dia deixar de haver esses horríveis direitos alcançados porque algures numa ilha todos trabalham todos os dias e têm como contrapartida o sustento. E que se houver uma greve na Volkswagen aqui d’el rei que não se pode irritar uma multinacional. Como se pode falar de direitos face a uma multinacional, ainda por cima alemã? E é esta ideologia que os seus ideólogos não têm coragem de assumir e escondem-na atrás do biombo que designam como realidade.
A realidade encerra várias realidades. Uma delas é a que tem a ver com os que nela vivem. Uns, uma ínfima minoria, os que dela retiram biliões, e outros, a maioria, à custa do trabalho, os seus rendimentos, sendo que para muitos esses rendimentos ficam no limiar da pobreza. Sim, em Portugal um quarto da população vive no limiar da pobreza.
A que é dominante quer continuar a manter o seu domínio. E proclama aos quatro ventos que as tentativas de a alterar esbarram nessa mesma realidade, como se ela fosse eterna e nos fizesse regressar à eternidade do poder desejada pelos faraós egípcios ou pelos imperadores romanos ou pelos esclavagistas...
Quando Cavaco se posiciona, no que chamam Universidade de Verão da PSD, a arengar que os que pretendem um outro modo de vida esbarram na realidade, nada mais faz de diferente do que fez o império romano face ao cristianismo, tendo em conta as circunstâncias históricas, ou o que a inquisição fez a Galileu...
Estes ideólogos disfarçados de “realistas” esbarram estrondosamente na sua ideologia neoliberal ao tentar impô-la como única, quando na verdade há outras a espreitar. Bastou a constituição de um Governo diferente nos seus apoios para entrarem numa histeria apocalíptica com medo que as coisas mudem.
É isto que os move e os faz apelidar de pensamento único a um mero exercício de dois anos de um governo cuja base de apoio é outra e que, na verdade, apenas parou com aspetos mais violentos da austeridade. Ao esbarrarem nesta realidade proclamaram o fim do mundo, o qual como se prevê não está próximo, apesar da Península Coreana. 
Ficaram excitados com os pios de um dos seus ideólogos, embora muito requentado. E piam. Piam. Estão a esbarrar na geringonça com medo que ela se aguente.

Sem comentários:

Enviar um comentário