quinta-feira, 29 de agosto de 2013

AJUSTE DE CONTAS COM A ESCOLA PÚBLICA


Já aqui referimos que a destruição da Escola Pública se encontra em plena velocidade de cruzeiro. Todas as medidas apontam nesse sentido, a última das quais é o chamado cheque-ensino.
Infelizmente uma parte significativa da população mais pobre ainda não se apercebeu (ou não deixam que se aperceba) de que a única via para a sua ascensão social é a educação. A direita sabe que assim é e envida todos os esforços para impedir que os pobres sejam promovidos a outros patamares da sociedade. O Governo actual, representante da direita mais retrógrada, é o parceiro ideal para levar a cabo o ajuste de contas com a Escola Pública, uma das maiores conquistas de Abril no sentido da promoção de uma maior igualdade de oportunidades e onde, apesar de tudo, se verifica um menor desnivelamento entre pobres e ricos.
Para ilustrarmos esta situação nada melhor que um texto de Ana Benavente que podemos ler no Público de hoje.

Estamos na estação de todos os incêndios. Terríveis e destruidores, abrem e fecham as notícias. Uma tragédia. E a causa principal está na falta de prevenção.
Mas há um incêndio - uma tragédia - que dura desde que o Governo PSD/CDS tomou posse ao serviço da troika: a destruição da escola pública.
Medidas atrás de medidas aparecem de modo avulso e vão-se impondo. Não me interessa cada medida em si mesma, o que interessa é que todas, mas todas, fazem parte dum mesmo mandato para tornar a sociedade portuguesa mais desigual e para destruir a escola pública.
É o aumento do número de alunos por turma, é o despedimento de milhares de professores, é a precarização docente, é o regresso a um currículo empobrecido, são os exames à moda antiga em todos os graus de ensino, é o fim da educação de segunda oportunidade, são os mega-agrupamentos. Tratam-se as pessoas como números, considerando a Educação com um gasto do Estado e não como um Investimento.
O nosso país sofreu de falta de escola durante décadas. Pouca escola para muitos e muita escola para poucos. Já a Espanha de Franco tinha 10 anos de escolaridade obrigatória no final dos anos sessenta, e ainda, entre nós, se preparava, penosamente, a passagem de quatro para seis anos de escolaridade obrigatória. Chegámos a 1974 com analfabetismo e baixos níveis de literacia.
A Educação é um bem individual e colectivo. Os países com níveis de qualificação mais elevados resolvem melhor os seus problemas colectivos, constroem democracias mais participativas e as pessoas ficam muito menos facilmente prisioneiras do medo e da manipulação pelos discursos dominantes de quem governa.
Lendo o artigo 74.º da Constituição da República Portuguesa, não restam dúvidas:
"1. Todos têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar.(...)"
E seguem-se as responsabilidades do Estado, bem detalhadas.
A Educação para Todos (definida pela UNESCO e o 2.º Objectivo do Milénio da ONU) é uma obrigação dos Estados democráticos.
Aquilo a que assistimos nestes dois últimos anos é um golpe que, sob a capa da democracia formal, vai contra a Constituição, contra a democracia e contra a grande maioria dos cidadãos.
A direita odeia a ascensão social dos mais pobres através da escola.
Não é por acaso que uma das últimas bandeiras do actual Governo é o "cheque-ensino" ligado à chamada liberdade de escolha. E quem comenta cita a OCDE.
Porquê? Porque no final dos anos 2000, esta organização publicou um importante trabalho, longamente construído e participado, sobre cenários para a Escola de Amanhã. Afirmando que a manutenção da escola que herdámos, reprodutora e não adequada aos desafios dos tempos actuais, é um cenário provável mas não desejável, que a "refundação" da escola que herdámos, através de inovações graduais será um cenário difícil mas desejável e, havendo inteligência, o cenário mais provável, a OCDE afirma que aceitar que o Estado assegure uma quantia para a educação dos mais novos (cheque-ensino) e deixe de assegurar uma escola pública de qualidade, é um cenário improvável e não desejável, dado o aumento de desigualdades que provocaria. Cenário a recusar. Mas é isso que estamos a viver. Um retrocesso manhoso que, sob a capa da racionalização de meios, destrói, em pouco tempo, o trabalho de décadas de uma Educação para Todos, bem precioso que não se pode perder.
Assembleia da República, partidos, (PS, é tempo de rever as vossas posições, ultimamente tão conservadoras na área da Educação), associações, cidadãos, vamo-nos organizar para esta luta? É uma questão maior. A Educação está a arder. E é preciso intervir antes que só fiquem cinzas da escola pública.

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