As apregoadas boas
notícias que não só em Portugal mas por toda a Europa anunciam um suposto fim
da recessão não resolvem uma série de problemas complicados como se pode ler
num interessante texto de Gustavo Cardoso (docente do ISCTE-IUL em Lisboa e
Investigador do Centre d'Analyse et Intervention Sociologiques (CADIS) em Paris)
inserido no Público de ontem (14/8/2013). Dada a sua extensão, vamos deixar
aqui, apenas, a transcrição do artigo na parte que se refere ao desemprego, o
maior flagelo a que a recessão deu origem.
Mas, no entretanto, há outro
problema não resolvido, o do emprego. Porquê? Porque todos os analistas e
gestores financeiros sabem (embora acredite que nem todos os governantes
europeus o tenham presente) que é perfeitamente possível, no curto prazo, crescer
o lucro das empresas despedindo pessoas – ou reduzindo salários quando possível
- e que esse é o manual de gestão utilizado na maioria das grandes empresas
globais para apresentarem resultados aos seus accionistas mesmo em tempo de
recessão. E, também, deveríamos saber que produto da introdução das tecnologias
de informação e no moldar das nossas sociedades em sociedades em rede, háuma
clara transformação da relação entre emprego e geração de riqueza numa série de
actividades das nossas indústrias e dos nossos serviços - simplificando,
podemos dizer que são hoje precisas menos pessoas para garantir uma dada
rentabilidade empresarial em certas actividades. E, ainda, que o
experimentalismo europeu de e com as Troikas não fez apenas erros com
multiplicadores, errou também no grau de disrupção do know how industrial
existente, pois o downsizing/ajustamento é muito difícil de fazer com pequenas
e médias empresas e, consequentemente, leva à destruição total e não parcial do
emprego.
Ou, que todos os analistas das
estatísticas de emprego sabem que, quer na Eurozona do Sul quer na do Norte, os
períodos de férias de praia, neve ou campo geram contra-ciclos, aumentando a
criação de emprego em ciclos de crescimento económico e, em ciclos de crise,
promovem a redução da destruição de emprego.
Ficar contente, mesmo que
contente com cautela e precaução, por regressarmos, no actual contexto, à performance
das grandes empresas no pré 2008 e às taxas de crescimento de
“0.qualquercoisa%”é mau, muito mau mesmo.
É mau, porque para todos os
cidadãos e para todas as pequenas e médias empresas europeias (e espero que
para os Governos atentos também o seja) quer dizer viver num cenário onde, por
um lado, há menos riqueza para ser distribuída e, por outro, há maior
desigualdade de rendimentos para os cidadãos e redução de capacidade de
alavancagem para gerar riqueza pelas pequenas e médias empresas.
Ou seja, se nada mais fizermos (e
contentes ficarmos) com o que está a surgir no radar apenas podemos esperar que
em Portugal e na restante Eurozona, tenhamos menor capacidade de criar riqueza,
assistamos ao incrementar da tendência de concentrar a riqueza num cada vez
menor número de pessoas e de grandes empresas, diminuindo assim a capacidade de
criação de emprego e criando uma sociedade assente em cada vez maiores
desigualdades, no medo de deixar de pertencer às classes médias (cada vez mais
frágeis) e no condicionamento de facto do livre acesso ao empreendedorismo e à liberdade
empresarial.
Se acharmos que tudo está bem se
todos os que eram fiéis à crença na austeridade passarem a professar agora o
crescimento, se acharmos que os que desde sempre acreditaram no
crescimento não precisam de combater a desigualdade para conseguirem gerar
riqueza, então continuaremos, em Portugal e na Europa (incluindo na Alemanha),
cercados numa sociedade que se contenta com tentar gerar riqueza, sem perceber
que sem melhor repartir aquela, para além do 1% que a acumula actualmente, não
será possível retomar nem a riqueza de ontem, nem o emprego que os que hoje têm
40 anos conheceram no final do século XX e no início do século XXI.
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