quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

QUEM É QUE APROVA O REGRESSO À AUSTERIDADE?

 

Depois de rejeitarem debater em plenário para que se conhecesse as posições de cada grupo, os Socialistas e o PPE aprovaram na calada da comissão um acordo para as regras da governação económica: cortar na despesa pública, tirar poder aos governos nacionais (onde já vimos isto?) A composição da maioria explica essa opacidade. O PS, representante do grupo socialista europeu nestas negociações, não teve o apoio de todo o seu grupo e aprovou o acordo com o apoio dos conservadores e dos liberais.

Vejamos por pontos no que consiste:

(1) Utilização da despesa primária líquida como variável única de ajustamento. Por este prisma, a única forma de garantir sustentabilidade da dívida e do défice é com cortes no orçamento. A lógica da austeridade regressa em força, apesar de os seus erros estarem bem documentados.

(2) Outras despesas ficam fora da equação, mas mantém-se uma fundamental: investimento público. Os países podem cortar no investimento (nos serviços públicos, na saúde, na educação) para reduzir o défice. É algo a que o governo do PS já nos vem habituando.

(3) A “trajetória técnica” passa a “trajetória de referência”, mas o problema central mantém-se: a Comissão pode impor o seu plano caso discorde da proposta apresentada pelo país, mesmo que esta cumpra todos os parâmetros.

(4) Introduz-se um desvio máximo aceite para a despesa: 1% do PIB em anos de crescimento. Quando ultrapassado, o país é considerado em “risco significativo” o que levará a um primeiro aviso da Comissão, abrindo caminho para possíveis sanções do Procedimento de Défices Excessivos.

(5) Na teoria permite-se uma pausa nessa limitação para facilitar o investimento público, mas os detalhes impedem os países de o fazer de facto: os investimentos terão de criar valor para a UE como um todo, o desvio só pode durar 5 anos e depende da avaliação positiva da Comissão

(6) É mantida a cláusula que impõe a novos governos eleitos o mesmo nível de esforço de consolidação orçamental na revisão do seu plano nacional. Um governo que queira romper com anteriores escolhas orçamentais conservadoras terá a sua ação política restringida.

(7) Os únicos pontos verdadeiramente decentes deste acordo são os novos poderes de escrutínio dados ao Parlamento Europeu e a discussão dos planos nos parlamentos nacionais respetivos. Tudo eclipsado pelos poderes monstros dados à Comissão e ao Conselho.

José Gusmão


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