A imagem acima é mais uma (com 6 a 7 décadas) das que retratam a
vida dos portugueses no tempo da ditadura de Salazar. Provavelmente, crianças
numa escola, vestidas de uma forma andrajosa e, a maior parte delas descalças
ou usando sapatos em deplorável estado de conservação. Nesse tempo, a miséria
grassava “com exceção de uma ínfima parte da população, os ricos” como afirma
Clara Ferreira Alves numa das suas crónicas semanais na Revista do semanário “Expresso”,
da qual retirámos o seguinte excerto.
“Tão felizes
que nós éramos”
Anda por aí
gente com saudades da velha portugalidade. Saudades do nacionalismo, da
fronteira, da ditadura, da guerra, da PIDE, de Caxias e do Tarrafal, das cheias
do Tejo e do Douro, da tuberculose infantil, das mulheres mortas no parto, dos
soldados com madrinhas de guerra, da guerra com padrinhos políticos, dos
caramelos espanhóis, do telefone e da televisão como privilégio, do serviço
militar obrigatório, do queres fiado toma, dos denunciantes e informadores e,
claro, dessa relíquia estimada que é um aparelho de segurança. Eu não ponho
flores neste cemitério. Nesse Portugal toda a gente era pobre com exceção de
uma ínfima parte da população, os ricos. No meio havia meia dúzia de burgueses
esclarecidos, exilados ou educados no estrangeiro, alguns com apelidos que os
protegem, e havia uma classe indistinta constituída por remediados.
Uma pequena burguesia sem poder aquisitivo nem filiação ideológica a rasar o que hoje chamamos linha da pobreza. Neste filme a preto e branco, pintado de cinzento para dar cor, podia observar-se o mundo português continental a partir de uma rua. O resto do mundo não existia, estávamos orgulhosamente sós. Numa rua de cidade havia uma mercearia e uma taberna. Às vezes uma carvoaria ou uma capelista. A mercearia vendia açúcar e farinha fiados. E o bacalhau. Os clientes pagavam os géneros a prestações e quando recebiam o ordenado. Bifes, peixe fino e fruta eram um luxo.
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