O
cidadão deficiente e em particular as crianças foram severamente atingidos
pelas políticas de austeridade levadas a cabo de forma indiscriminada pela
maioria de direita, em boa hora apeada do poder. Um sector especialmente
atingido foi o da educação cujos cortes brutais, vieram afectar as crianças com
necessidades educativas especiais (NEE). Diga-se em abono da verdade que as
políticas levadas a cabo nesta área, por Nuno Crato, foram uma continuação das
más práticas do tempo do Governo Sócrates. Foi a ministra de má memória, Maria
de Lurdes Rodrigues, quem ordenou os primeiros cortes no financiamento da educação
de alunos NEE.
Numa
altura em que acaba de tomar posse um novo Governo suportado pela esquerda, nasce
a esperança de que o sector educativo e neste o dos alunos NEE, tão esquecidos
pela maioria de direita, seja tomado em atenção pois estamos perante cidadãos com
os mesmos direitos dos restantes.
O
artigo de opinião seguinte (*) que transcrevemos do Diário de Coimbra é, ao
mesmo tempo, uma denúncia e uma chamada de atenção para a situação em que vivem
as pessoas com deficiência, particularmente na área educativa.
A
Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi aprovada no
Parlamento por todos os partidos e sem reservas, em 2009. O Estado está
obrigado a dar-lhe cumprimento.
Pela
Convenção, o Estado português reconhece “o direito das pessoas com deficiência
à educação”, “sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades”, num “sistema
de educação inclusiva a todos os níveis e numa aprendizagem ao longo da vida”,
respeitando “a diversidade humana”. Exige que “as pessoas com deficiência não sejam
excluídas do sistema geral de ensino gratuito e obrigatório”, e com as “adaptações
razoáveis em função das necessidades individuais”, com garantias de “medidas de
apoio individualizadas eficazes, com o objectivo de plena inclusão”.
Assim
determina o Artigo 24º da Convenção.
E
o que se lê nas notícias:
A
Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes (CNOD) considerou que se
registou “um verdadeiro retrocesso nos direitos das pessoas com deficiência nos
últimos quatro anos, nomeadamente ao nível da educação, saúde, emprego e
acessibilidades”.
No
que respeita à discriminação, uma mãe queixou-se de “colégio rejeitar” seu
filho com atraso cognitivo depois de lhe ter sido prometida vaga. Uma outra mãe
lamentava-se de não encontrar escola para seu filho, uma por não terem “espaço físico
adaptado”, e outras de “não terem vagas”.
A
federação Nacional dos Professores (Fenprof) considerou que a escola pública
está a ficar “perigosamente discriminatória para os alunos com necessidades
educativas especiais”. Num levantamento em 204 escolas (cerca de 25% da
totalidade do universo escolar) revelou insuficiência de apoios e “indícios de
segregação”. Em conferência de imprensa, indicou que em dezenas de escolas onde
o número de crianças com NEE aumentou, o de professores disponíveis para lhes
dar apoio se manteve ou diminuiu. Apontou como exemplo a escola das Olaias em
Lisboa, em que o número de alunos com NEE subiu de 98 para 108 e o de
professores baixou de oito para sete.
Na
mesma linha, várias “organizações que representam as pessoas com deficiência
acusaram o Ministério da Educação de fazer “gestão merceeira” das necessidades
educativas especiais.
E
o vice-presidente da Fenacerci “explicou que o que está em causa é o modo de
definição das necessidades de cada agrupamento escolar e a atribuição dos meios
respectivos pelo Ministério da Educação”.
Há
“alunos que só vão ter meia hora por semana de apoio”, porque “faltam recursos
para educação de crianças com deficiência”.
Num
agrupamento de escolas de Mangualde, um “técnico pode cuidar de 97 alunos”. Um caso
muito especial de impossibilidade de ter resultados.
“Entre
2011 e 2015, as verbas atribuídas nos orçamentos do ministério para a educação
especial tiveram uma redução de quase 60 milhões de euros”.
E
a Segurança Social “poupou” 18,6 milhões de euros nos apoios às crianças com
necessidades educativas especiais.
Perante
tantos cortes, as organizações que dão apoio especializado a milhares de
crianças com necessidades educativas especiais, ameaçaram suspender os
trabalhos por falta de financiamento. Recusam “pactuar com escola inclusiva faz
de conta”.
A Plataforma, Associações de Pais pela
Inclusão, apresentou uma petição na Assembleia da República que defendia a
revogação da Portaria nº 275-A/2012 por considerar que “constituía um
retrocesso nos desígnios de uma sociedade inclusiva, condicionando a
aprendizagem e a profissionalização de muitos dos jovens com necessidades educativas
especiais”.
E
na confirmação dos desvios veio o Observatório da Deficiência e dos Direitos
Humanos (ODDH), num estudo a pedido do Parlamento Europeu, com as recomendações
de que Portugal tem de:
-
Aumentar o número de escolas de referência para a educação de alunos cegos e
com baixa visão, e escolas de ensino bilingue de alunos surdos e intervenção precoce;
-
Reforçar os suportes materiais e humanos para a escola inclusiva e a formação de
professores e outro pessoal escolar;
-
Reforçar a dotação orçamental para os apoios à educação e intervenção precoce
de crianças com deficiência;
-
Desenvolver apoios para as pessoas com deficiência frequentarem o ensino
superior e removerem barreiras arquitectónicas;
-
Sensibilizar e informar os pais, alunos e demais profissionais das escolas para
a temática da deficiência;
-
Incluir com carácter obrigatório a temática da deficiência na informação de
todos os professores;
-
Promover a admissão de pessoas com deficiência como profissionais na escola de
modo a facilitar a socialização para a deficiência.
Como
complemento desta crónica, deixo aqui referência a um livro centrado na
temática da sociedade e da escola inclusiva e na linha da Convenção da ONU. O
título: “Autonomia para a Inclusão – A importância da educação”, editora “Lápis
de Memórias”, Coimbra.
(*) Manuel
Miranda
Sem comentários:
Enviar um comentário