“A
lei só é lei se for a mesma para todos” afirma José Vítor Malheiros (JVM) no
artigo de opinião que assina no Público de hoje. Esta expressão tem todo a pertinência
já que a percepção do cidadão comum é a de que, na prática, a lei é aplicada de
forma diferente consoante estejamos na presença de ricos e poderosos ou de
gente simples e sem poder. JVM vai buscar várias situações do conhecimento geral
como prova do que afirma, como se pode ler no seguinte excerto que retirámos do
seu artigo.
Há
algo que é fundamental para a justiça de um sistema baseado na concorrência:
regras definidas e aplicadas de forma justa. A adopção consensual de um sistema
de avaliação com as suas recompensas e as suas sanções. É por isso que, nas
democracias, consideramos fundamental o primado da lei – uma lei definida
democraticamente e aplicada com equidade, feita por todos e imposta a todos sem
excepção. A lei só é lei se for a mesma para todos. De outra forma, é apenas
arbitrariedade, abuso e opressão.
O que acontece nas nossas
sociedades democráticas de baixa intensidade, para usar a expressão feliz de
Boaventura Sousa Santos, é que não só as riquezas são distribuídas de forma
desigual, como os grandes beneficiários dessas benesses e desse poder acabam
por adquirir um estatuto de excepção que os põe ao abrigo de todas as formas de
sanção pública. Tornam-se verdadeiramente inimputáveis mesmo quando o seu
escrutínio constata algo de moralmente, tecnicamente, criminalmente ou
politicamente condenável. O FMI cometeu erros grosseiros na política que, como
membro da troika, impôs a Portugal e à
Grécia? Sim, são os próprios que o admitem. O que vai acontecer ao FMI, aos
técnicos que cometeram esses erros? Nada. Jean-Claude Juncker promoveu a fuga
ao fisco de dezenas de grandes empresas? Sim. O que lhe vai acontecer? Nada. A
Goldman Sachs cometeu um rol sem fim de actos ilegais? Sim. O que lhe vai
acontecer? Nada. A Volkswagen e outras empresas automóveis cometeram fraudes e
atentados ao ambiente? Sim. O que lhe vai acontecer? Nada. Os bancos europeus
criam um cartel para manipular as cotações do Libor? Sim. O que lhes acontece?
Nada. Nalguns casos há leves sanções, para evitar revoltas de outras
empresas cumpridoras, mas são sempre muito inferiores aos benefícios colhidos. E
certamente que não há dezenas de gestores enfiados na cadeia como aconteceria
se tivessem roubado uma mercearia. Porquê? Porque há uma lei para os cidadãos
comuns e outra para os poderosos. O primado da lei é apenas uma anedota com que
se paralisam os timoratos.
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