O
conhecimento da história do século XX, nomeadamente a da sua primeira metade,
que levou ao poder o nazismo com as terríveis consequências que todos sabemos é
fundamental nos tempos que correm, com a ascensão ao poder por todo o lado de
forças de extrema-direita xenófobas e racistas.
No
texto seguinte que transcrevemos do Público de hoje, com o sugestivo título Uma lição muito actual da história, a
autora (*) descreve, ainda que de forma resumida, a forma como Hitler e o
nazismo tomaram o poder na Alemanha perante a fragilidade e desunião das forças
democráticas. É bom que os cidadãos europeus e, particularmente, os políticos não
esqueçam essa lição de temerosa realidade.
A
ausência de uma visão integrada da situação política e social, a falta de
sentido de responsabilidade pelo bem comum, a cedência cómoda perante
argumentos manipulativos e demagógicos, combinadas com imoderados interesses
parcelares e um radicalismo mesquinho no seguimento desses interesses podem
decidir o destino de um país, de um continente, podem mudar a face da terra. Os
conflitos dramáticos actuais e as encruzilhadas previsíveis a nível nacional e
internacional convidam a um olhar para a história.
Alemanha,
república de Weimar, Primavera de 1930. O chanceler é do SPD
(socialistas/trabalhistas, na terminologia portuguesa actual) que governa em
grande coligação com partidos à direita do SPD. Milhões de desempregados,
reparações pesadas a pagar aos vencedores da 1ª guerra mundial, repercussões
graves da crise económica mundial após o grande crash da bolsa de New York em
1929. No entanto, com uma maioria confortável no parlamento (289 dos 450
lugares no Reichstag; o partido nazi ocupa 12), o governo tem as ferramentas na
mão para atenuar a crise e conduzir o barco para águas mais calmas. Conflito
entre os parceiros de governação acerca das taxas para a segurança social
(seguros para os desempregados). Ordem de grandeza em disputa: em torno dos
0,25%. Todos os partidos dispostos a chegar a um consenso. Sob pressão dos
sindicatos, o ministro do trabalho impede o acordo. O governo demite-se. Foi o
último (!!!) governo a basear-se numa maioria parlamentar até à tomada de poder
de Hitler.
Seguem-se
governos minoritários que governam com decretos de emergência, desenrola-se uma
novela de intrigas, de tráfico de influências, de lobbying, de traições e de
subornos, sucedem-se demissões e eleições em que os nazis (revelador o nome:
NSDAP = Partido Trabalhista Alemão Nacional Socialista), vão subindo em flecha,
juntando o terror das suas tropas paramilitares à demagogia “social” (a que não
é alheia o seu discurso de anti-semitismo contra os “sanguessugas do povo,
detentores do poder financeiro”). Em Novembro de 1932, nas últimas eleições com
a constituição em vigor, o NSDAP desce para 33,1% (dos 37,4% anteriores).
Hitler aceita agora o que dantes recusara: uma coligação apenas com 3 ministros
seus, a saber: Göring (sem pasta = para tudo), Frick (assuntos internos = polícia),
Goebbels (propaganda). Convocadas novas eleições (sem dúvida para colher os
frutos do novo poder propagandístico) para 5 de Março de 1933, poucos dias
antes o Reichstag está em chamas. Pouco importa se foram os próprios nazis ou
se foi obra de um indivíduo louco, o incêndio serve os propósitos de Hitler. Um
dia depois, ele suspende a constituição de Weimar (até 1945), acusando os
comunistas de preparação de uma insurreição.
É
nestas circunstâncias que o NSDAP se torna em 1933 o partido mais votado, mas
mesmo assim não consegue a maioria absoluta. Obtém 288 dos então 647 lugares no
Reichstag. Alia-se ao partido nacionalista e obtém desta forma uma maioria de
340 lugares contra 307 lugares da oposição. Hitler, não contente com a sua
maioria de coligação, solicita ao Reichstag uma lei que lhe permite governar
durante 4 anos sem parlamento. Para esta lei Hitler precisa de uma maioria de
2/3 dos deputados. Para eterna vergonha dos partidos do centro burguês e da
direita na oposição, o inconcebível acontece: O parlamento, voluntariamente,
autodecapita-se, aprovando a lei. Apenas os 94 deputados dos socialistas votam
contra, os comunistas já estão ilegalizados, os seus funcionários presos, a sua
imprensa reprimida. O destino toma o seu curso trágico.
É
um lugar-comum que a história não se repete. E é verdade que os contextos e
condicionalismos mudam e variam. Mas não é líquido concluir daí que não se
possa e não se deva aprender com a história. Serão julgados pela posteridade os
que só conseguem ver as árvores e não a floresta, os que brincam com o fogo por
causa de questões secundárias, os que põem o seu interesse pessoal ou de
“coutada” acima de tudo, os manipuladores e os que se deixam manipular.
(*) Bárbara
Tengarrinha, Professora
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