quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

AS TROIKAS E O SNS

O texto seguinte é da autoria do economista Eugénio Rosa e foi publicado na edição de 6/2/2012 do “Diário As Beiras”. Como já todos sabemos, o Serviço Nacional de Saúde é e continuará a ser uma das principais vítimas das medidas de austeridade impostas pela troika estrangeira e alegremente acolhidas pela troika portuguesa (PS, PSD e CDS). Os principais atingidos serão os portugueses de menores recursos e, de um modo geral a classe média, não tenhamos quaisquer ilusões.

Governo e troika põem em perigo o SNS
A intenção de reduzir o défice orçamental numa dimensão incomportável num curto período de tempo, para além de arrastar o país para uma profunda e prolongada recessão económica está a por em perigo o funcionamento do próprio Serviço Nacional de Saúde (SNS), vital para todos os portugueses. E isto porque os cortes nas transferências em 2012 para o SNS, associados aos já verificados em 2011, assim como a aprovação de uma lei na Assembleia da República em Fevereiro deste ano que reduz ainda mais os fundos disponíveis para a saúde e que criminaliza, atingindo não apenas dirigentes e gestores mas até os próprios responsáveis pela contabilidade, por qualquer compromisso que ultrapasse os limites daqueles fundos definidos administrativamente, vai por em causa o funcionamento nomeadamente dos Hospitais EPE.
Entre 2011 e 2012, as transferências em valores nominais do OE para o SNS diminuem de 8.250 milhões de euros para 7.590,1 milhões de euros, e para o Hospitais EPE baixam de 4.510,5 milhões de euros para 4.210,5 milhões de euros. O confisco aos trabalhadores em 2012 do subsídio de férias e de Natal não é suficiente para compensar estas elevadas reduções verificadas num único ano, quando os preços e impostos (ex. IVA) sobem.
Em anos anteriores a insuficiência das transferências determinou elevados prejuízos nos Hospitais EPE e o disparar das dívidas do SNS. Desde a sua criação em 2003, os Hospitais EPE já tiveram 2.267,4 milhões de euros de prejuízos operacionais (os directamente referentes à sua actividade principal que é a prestação de serviços de saúde à população). Como consequência da insuficiência das transferências do Orçamento do Estado, e para que os serviços do SNS pudessem funcionar e prestar cuidados de saúde à população, nomeadamente hospitalares, no fim do 4.º Trimestre de 2010, as dívidas do Serviço Nacional de Saúde atingiam 2.468,4 milhões de euros e, no fim do 3.º Trimestre de 2011, já eram 2.932,4 milhões de euros, ou seja, aumentaram 464 milhões de euros (+18,8%) em apenas nove meses. Deste total, a maior parte refere-se aos Hospitais EPE cujas dívidas, em 2010, já representavam 67,2% do total da dívida tendo aumentado, no 3.º Trimestre de 2011, para 75,4% do total do endividamento do SNS.
Em 2012, a “troika estrangeira” e o governo PSD/CDS reduziram significativamente as transferências do OE para o SNS, e ao mesmo tempo, por lei, criminalizaram qualquer compromisso que ultrapasse os limites de fundos disponíveis definidos administrativamente, que correspondem a “75% da média da receita efectiva cobrada nos últimos dois anos nos períodos homólogos, deduzida dos montantes de receita com carácter pontual ou extraordinário”. Ou seja, uma redução superior a 25%, isto é um valor ainda inferior às transferências a que o SNS e os Hospitais EPE têm direito em 2012 (a redução nas transferências, entre 2011 e 2012, foi de 8,8% para o SNS e de 6,6% para os Hospitais EPE). É evidente que com esta redução de facto tão elevada e com a ameaça, se forem ultrapassados aquele limite de 75%, dos “ titulares de cargos políticos, dirigentes, gestores ou responsáveis pela contabilidade que assumam compromissos em violação do previsto na presente lei incorrem em responsabilidade civil, criminal, disciplinar e financeira, sancionatória e ou reintegratória” é previsível que muitos serviços de unidades de saúde, nomeadamente dos Hospitais EPE, fiquem impossibilitados de funcionar normalmente e que tenham de paralisar ou fechar serviços, com consequências dramáticas para a população.
A racionalização das despesas do SNS, o aumento da eficiência na utilização dos meios humanos, materiais financeiros postos ao dispor do SNS, e o combate ao desperdício e à má gestão, etc., são absolutamente necessárias e urgentes, mas isso não pode ser feito da forma cega e “economicista” e à custa da redução significativa dos serviços de saúde prestados à população, nem por meio de um aumento brutal das taxas moderadoras, como sucedeu em 2012 que subiram, em média, 100%, como está a ser feita.

Sem comentários:

Enviar um comentário