domingo, 4 de novembro de 2012

DEMOCRACIA À AMERICANA

Todos sabemos que a regra básica, simples e clara da democracia é a da maioria. Por um voto se perde e por um voto se ganha. Ainda por estes dias aconteceu em Portugal que a eleição de um líder partidário na Madeira se cifrou por uma diferença de cerca de uma centena de votos, em vários milhares. A eleição de um presidente da República nos países com democracias estáveis e transparentes também segue a regra da maioria. Nada mais claro.

Porém, nos Estados Unidos da América, a regra básica da democracia é tão, tão sofisticada que é possível acontecer que um presidente seja eleito sem ter a maioria dos votos. A última vez que isso aconteceu foi em 2000 quando Al Gore obteve 51 milhões de votos e perdeu para George Bush que recebeu apenas 50,4 milhões.

Para as eleições presidenciais deste ano, as sondagens dão diferenças de intenções de voto favoráveis a Obama que chegam a ultrapassar os 20%, no entanto pode acontecer que o actual inquilino da Casa Branca não seja eleito… Especificidades da pátria da democracia e dos direitos humanos…

Tendo em atenção que na próxima terça-feira, ficaremos a saber qual será o vencedor, deixamos aqui a transcrição de um artigo de opinião que encontrámos no Diário de Coimbra, com o tema como pano de fundo.

 
Obama fica, ou Sa(nd)y? (*)

Estou plenamente convencido que Barak Obama vai ganhar as eleições presidenciais da próxima terça-feira, ainda que o espectro de uma derrota injusta seja considerável. Se essa tragédia se consumar, justifica-se co duas causas – o anacrónico sistema eleitoral e os erros de Obama.

As empresas de sondagens têm-se desmultiplicado, para resolverem a indefinição causada pelo empate técnico que dura, há três meses. Mas sem sucesso.

A Gallup diz que Obama tem a preferência de 50 por cento dos americanos, enquanto Romney recolhe apenas 34 por cento de boas vontades. Outra sondagem, da Ipsos para a agência Reuters alarga essa vantagem: Obama lidera com 53 por cento e Romney não vai além de 29. Estes números, em qualquer sistema eleitoral, seriam mais que suficientes para garantir a reeleição. Mas no sistema americano são problemáticos.

O princípio the winner takes all” (o vencedor leva tudo) alimenta a esperanças de Mitt Romney que, vencendo em muito menor número de estados, desde que sejam os que elegem mais grandes eleitores, pode ganhar as presidenciais. E isto, com um número de votos nominais muito inferior ao do adversário. Basta-lhe ganhar nos 11 estados mais populosos, para ser o futuro presidente. E Obama, pode ganhar em 40 estados, com maior número de votos no computo geral e perderá as eleições.

Diz a tradição que quem ganhar no Ohio, que elege apenas 18 grandes eleitores, será o futuro presidente. Isto, porque aquele estado reflete, geralmente, a “amostra nacional”. Mesmo assim, convém juntar, a esta vitória, outra, num dos estados mais populosos, por exemplo, o da Califórnia que elege 55 grandes eleitores.

E há aqui outra tradição que não é despicienda: o sistema favorece o Partido Republicano. O exemplo mais escandaloso aconteceu em 2000, quando o democrata Al Gore, com 51 milhões de votos, perdeu para George Bush, que recebeu apenas 50,4 milhões. No entanto, o republicano superou Al Gore, no estado da Califórnia, por escassos 537 votos. Curiosamente, o irmão de Bush era o governador do estado. As eleições só conheceram um vencedor quando Al Gore evitou a decisão judicial e abandonou a corrida.

Sabe-se como é difícil mexer na mais irredutível Constituição do mundo e nas leis eleitorais. Mas percebe-se mal que o sistema proporcional, em eleições deste tipo, só funcione em dois estados, uma parte ínfima do país.

Para além da complexidade do sistema, Obama cometeu alguns erros. Foi notória a sua falta de vontade para entrar nesta campanha. Mas pode admitir-se que o erro não lhe seja exclusivamente imputável e que haja aqui culpas dos eus estrategos que quiseram repetir a receita de há quatro anos. Isto é, tentaram recriar o candidato humilde, sereno, dizendo ao que ia, mas sem grandes ataques ao adversário. Foi assim que Obama venceu a estridente Hillary Clinton, nas primárias democratas e depois o republicano John McCain, na corrida para a Casa Branca.

Mas desta vez apareceu como candidato/presidente e isso conferia-lhe outro estatuto e outro tipo de responsabilidades.

No primeiro debate com Mitt Romney, Barack Obama esteve frouxo, deu todo o espaço e iniciativa ao adversário, cometendo mais um erro estratégico. A intenção seria, provavelmente, a de demonstrar que não atacava, porque não temia o adversário. Em suma, desvalorizá-lo e esperar pelas suas gafes. Isso acabou por lhe custar uma derrota que, segundo algumas sondagens, se cifrou acima dos cinco pontos percentuais. Nos dois debates seguintes, corrigiu, mas só na terça-feira se saberá se foi a tempo de salvar a candidatura. E este debate terá sido o mais importante, porque se centrou na política económica, o calcanhar de Aquiles de Obama. Nem tudo correu bem, é certo, mas trata-se também de uma área que os republicanos usaram para a falácia mais sórdida e que, por isso, merecia um debate mais animado. O presidente poderia ter aproveitado para dizer que não nacionalizou a indústria automóvel, como diz Romney. Podia ter explicado em detalhe o que herdou de George Bush, podia ter desmentido a sua intenção de socializar a economia, como os republicanos têm dito co insistência, desde que o candidato a vice-presidente, Paul Ryan, entrou na campanha.

Confesso que a possibilidade de uma vitória de Mitt Rmneey me deixa em pânico. Não só porque os aviões passarão a andar de janelas abertas, mas sobretudo, porque ele promete incendiar o mundo. Quer começar no Médio Oriente, passar daí para o Irão, acabando com a imbecil Coreia do Norte.

Promete deixar as finanças à solta e fazer regressar as políticas sociais à Idade Média. Vimos o que tudo isto deu com George Bush. Equivalem-se em inteligência mas Romney traz consigo Paul Ryan que tem uma visão paleolítica do mundo.

Só tenho uma certeza. Se Obama ganhar, os comentadores de direita vão dizer que foi beneficiado pelo Sandy.

(*) Sérgio Ferreira Borges

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