A primeira vez em que se comemorou o Dia da
Terra foi em 22 de Abril de 1970. É por esta altura que nasce a consciência ambiental,
um pouco por todo o mundo, e que se começa a ter a noção de que há que “tomar os
impactos ambientais em conta nas decisões políticas”. Entretanto, quase 50 passaram
e pergunta (muito bem) Matilde Alvim, estudante da Escola Secundária de Palmela
e uma das organizadoras da Greve Climática Estudantil, “onde estamos agora?”.
Se tivermos em conta que desde 1970 até agora as emissões globais de gases com
efeito de estufa aumentaram 90%, não poderemos dizer que tenha havido progressos
significativos em termos ambientais, antes pelo contrário, “as
emissões continuaram a empilhar-se umas atrás das outras, as grandes
multinacionais continuaram a sentir-se à vontade para envenenar o planeta
enquanto os governos do mundo olham discretamente para o lado”. Tudo isto acontece
depois de cinco décadas de muitas lutas e de sectores crescentes da população se
encontrarem com uma consciência ambiental cada vez mais forte. A conclusão a
que se chega é que o patamar da luta tem de subir para que os cidadãos sejam
ouvidos numa questão que é de todos ou seja, a sobrevivência da espécie humana.
Aqui
fica, pois, o artigo de Matilde Alvim no “Público” de hoje, tendo como ponto de
partida a origem do Dia da Terra.
Hoje, 22 de Abril, assinala-se o Dia da
Terra, reconhecido pela ONU em 2009. As origens da celebração deste dia
coincidem com o início do florescimento do movimento ambientalista nos Estados
Unidos e no mundo. Em 1970, em plena guerra do Vietname, o movimento estudantil
continuava altamente dinâmico. Numa década marcada pelas lutas de justiça
social, protagonizadas muitas vezes pela comunidade estudantil, a proactividade
brotava do chão.
Em 1969, após a assistir a um derrame de
petróleo em Santa Bárbara, no estado da Califórnia, o senador americano
Gaylord Nelson começou a arquitectar a ideia ambiciosa de colocar as questões
climáticas na agenda política nacional. A tarefa não seria fácil:
canalizavam-se quantidades monstruosas de dinheiro para a exploração de
combustíveis fósseis; as indústrias altamente prejudiciais triunfavam num
crescimento mundial desenfreado; o cheiro a smog e a poluentes tóxicos
nas vilas e cidades era apenas sinal de prosperidade e desenvolvimento
económico. Tomar os impactos ambientais em conta nas decisões políticas era
ainda extremamente rudimentar. O céu era o limite para o crescimento económico.
Um ano depois, escolheu-se o dia 22
de Abril de 1970 para se comemorar o primeiro Dia da Terra. Uma data que
ficaria para a história da América e do mundo contemporâneo: foi a primeira vez
que se reconheceu a necessidade de se assinalar um dia específico no calendário
para celebrar a Terra e alertar para a destruição ambiental. Nelson, em
conjunto com o congressista republicano Pete McCloskey e uma equipa de 85
funcionários, coordenaram e organizaram acções, demonstrações e protestos por
todo o país. Vinte milhões de americanos saíram à rua nesse dia, alertando para
a urgência de tomar medidas contra a iminente crise climática que se
aproximava, e focando-se sobretudo nas questões de saúde pública, como água
limpa e ar respirável para todos.
A maior parte dos protestos e
demonstrações foram protagonizados por estudantes, que canalizavam a energia
usada na luta contra a guerra do Vietname para uma causa que conseguiu unir
diferentes espectros políticos e classes sociais. Muitos faltaram às
aulas para poderem participar nas demonstrações públicas; outros
organizaram-se e foram de bicicleta para a escola; outros ainda, enquanto se
manifestavam, fizeram recolhas de lixo.
Deste dia histórico, cujas
acções tiveram como principais agitadores a comunidade estudantil, do liceu ou
da universidade, saiu-se com a certeza de que estava plantada a semente para
que o movimento ambientalista pudesse florescer e dar corajosamente os
primeiros passos num mundo em que as preocupações climáticas eram
marginalizadas e ignoradas. Quase
50 anos depois, pergunto-me: onde estamos agora?
Segundo os dados da
Agência de Protecção Ambiental dos Estados Unidos (EPA, na sigla em inglês), as emissões globais aumentaram cerca de
90% desde 1970. Cinco décadas inteiras de luta, protestos,
petições, marchas, leis, relatórios, tratados e acordos, e os resultados estão
bem à vista de todos. Em meio século, as emissões continuaram a empilhar-se
umas atrás das outras, as grandes multinacionais continuaram a sentir-se à
vontade para envenenar o planeta enquanto os governos do mundo olham
discretamente para o lado.
Agora, o paradigma parece
começar a sofrer alguns abalos. Lentamente, traça-se o caminho para
descarbonizar e mudar o rumo da catástrofe ambiental. Mas estes são planos que deveriam ter sido
feitos quando a semente plantada era ainda um pequeno rebento e a crise
climática tinha ainda muita margem de manobra. Hoje, a semente
lançada pelo primeiro Dia da Terra, há 50 anos, é já uma árvore corpulenta de
respeitados movimentos ambientalistas. E sabemos algo de muito claro: ou
mudamos radicalmente agora, ou sofreremos um ponto de não retorno daqui a 12
anos.
O movimento da greve
às aulas pelo clima, impulsionado por Greta Thunberg,
parece ser o culminar destes 50 anos numa luta que demasiadas vezes se mostra
ingrata. E, por isso, neste Dia da Terra de 2019, temos a certeza de que, se em
50 anos as vozes foram quase que ignoradas e a crise climática agravada, iremos
lutar com tudo o que podemos para que os últimos 12 anos sejam, por fim, os
anos da mudança radical de paradigma. Se não agora, para quando? Decerto não
podemos dar-nos ao luxo de aguardar mais meio século.
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