Espezinhando
as lições da história recente e a investigação científica levada a cabo desde a
Grande Depressão de 1929, e, contra todas as evidências, os “fossilizados” líderes
da União Europeia (UE), cuja ilegitimidade democrática é óbvia por não terem
sido sufragados pelo voto popular, tomam as principais medidas que afectam as
vidas dos cidadãos europeus. Como se sabe, o único órgão eleito na UE, o Parlamento
Europeu, pouco peso tem nas decisões que toma, sendo as mais importantes
determinadas por gente que não sai dos seus gabinetes e está lá para defender
os interesses dos poderosos ainda que contra a vontade dos diversos povos
europeus livremente expressa através do voto. É o que se está a passar com a
imposição das famigeradas medidas de austeridade que, desde sempre, não levaram
à recuperação da crise económica, antes pelo contrário, conduziram em todos os
casos ao aumento da pobreza e da desigualdade nos países onde foram
implementadas.
É
esta a conclusão a que se chega através da leitura do seguinte excerto de um
artigo de opinião de Domingos S. Ferreira (*) que transcrevemos do Público de hoje.
“Uma
família pode decidir gastar menos e tentar ganhar mais. Mas, na economia, como
um todo, gastar e ganhar estão correlacionados, dado que o que eu gasto é o que
tu ganhas e o que tu gastas é o que eu ganho. Se todas as famílias decidirem
cortar nos gastos ao mesmo tempo não há receita, a economia pára e o desemprego
aumenta”. Pois é! Assim, afirmava Keynes nas sessões radiofónicas na BBC. E
acrescentava: “Minhas senhoras, vão às compras! Pois quanto mais gastam, mais
postos de trabalhos são criados”. Embora os falcões da ortodoxia económica
continuem teimosamente a insistir nas medidas de austeridade, estas nunca
resultarão no equilíbrio orçamental nem na atracção do investimento. A verdade
é que o resultado deste tipo de medidas revelou-se na maior espiral recessiva
mundial desde 1930. A verdade é que a investigação científica desenvolvida
desde a Grande Depressão de 1929 em dezenas de países demonstrou,
inequivocamente, que nenhum país, em nenhum lado do mundo, recuperou da crise
económica através das medidas de austeridade.
A
verdade incontestável é que a austeridade conduziu sempre a maior pobreza,
maior desigualdade, falência do sistema financeiro e destruição da economia.
Também neste sentido, o Tratado Orçamental, imposto leoninamente pela inepta
Comissão Barroso, pelo bipolar FMI, pelo BCE do desastrado Trichet e pelo
dogmatismo fossilizado de Angela Merkel e Wolfgang Schäuble, constitui o maior
disparate até hoje produzido pelo Eurogrupo, dado que tenta “vestir o mesmo
fato” a todas as economias sem ter em conta as diferentes idiossincrasias
estruturais, económicas e políticas dos Estados-membros. Deste modo,
incompetentes e cinzentos burocratas, que ninguém elegeu e nenhum povo
escolheu, impõem leoninamente as suas decisões na obscuridade dos seus
gabinetes, não só contra vontade dos líderes políticos democraticamente
eleitos, como também desfavorecendo os países mais pobres em benefício dos
países e corporações mais poderosas, como ficou patente quando fecharam os
olhos à fuga aos impostos das grandes corporações em países como a Holanda ou o
Luxemburgo ou, agora, no caso Banif. Tudo isto com o apoio de gente muito
ilustre, muito séria e sábia, com homenagens e comendas, com direito a infinito
tempo de antena em prime time onde expõem a sua ignorância como incontestadas
e sublimes verdades científicas. Contudo, grande parte desta virtuosa gente
arrasta consigo cumplicidades em políticas desastradas, em escândalos de fraude
económica, fuga aos impostos, contas escondidas em off-shores (nos quais as autoridades
não actuam firmemente), etc..
(*) Professor Associado, Director
INNOVARE - Research Center in Management, Economics and Finance, UAL
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