segunda-feira, 27 de março de 2017

EXTRACÇÃO DE PETRÓLEO, POÇOS DE PROBLEMAS



Para a maioria das pessoas, desconhecedoras das problemáticas relacionadas com os aspectos negativos da exploração do petróleo, o que conta mesmo são os rios de dinheiro daí provenientes, que imaginam vir a inundar Portugal. Nada mais errado, como muito bem é salientado no seguinte artigo de opinião assinado por Luísa Schmidt que transcrevemos do Expresso do passado sábado. No “caso da concessão petrolífera ao largo de Aljezur”, para “além dos riscos ambientais, expôs-se o país à vergonha política de um contrato de parvos”. Assim, as contrapartidas que nos pagarem, não só são insignificantes como apenas serão cobradas num prazo que pode chegar a duas décadas, após a amortização de “todos os custos do investimento” levados a cabo pelas empresas petrolíferas. Se a informação sobre estes custos de investimento for fornecida por estas empresas, então, podemos esperar sentados… até que cheguem os pagamentos das contrapartidas.
Entretanto, devemos ainda salientar outros aspectos não menos importantes: 1) Todo o petróleo extraído pertence exclusivamente às concessionárias; 2) Portugal vai continuar a comprar o petróleo de que necessita nos mercados internacionais, aos preços em vigor; 3) Toda a limpeza do lixo produzido pela extracção do petróleo fica a cargo do nosso país, com as nefastas consequências que irá ter na actividade turística; 4) Em termos de futuro a linha a seguir deve continuar a ser a aposta nas energias renováveis.
Mas, o melhor, é lermos com atenção e na íntegra o texto de Luísa Schmidt.
Em qualquer discussão sobre um empreendimento, dever-se-ia pôr uma série de perguntas, para poder discernir se o mesmo levará a um desenvolvimento verdadeiramente integral e consistente: Para que fim? Por que motivo? Onde? Quando? De que maneira? A quem ajuda? Quais são os riscos? A que preço? Quem paga as despesas e como o fará?”
Não, não é uma interpelação ao Governo. É uma citação da encíclica “Laudato Si” do Papa Francisco. Calha bem que venha a Fátima no próximo dia 13 de maio. Pode ser que assim alguém ouça aquilo que vários movimentos cívicos em Portugal têm tentado, em vão, perguntar sobre a extração de combustíveis fósseis.
O caso da concessão petrolífera ao largo de Aljezur não podia ilustrar melhor a condição deplorável a que se chegou. Além dos riscos ambientais, expôs-se o país à vergonha política de um contrato de parvos.
Parvos porque se trata de contratos em que o Estado aceita receber quase nada, com rendas de superfície irrisórias e contrapartidas de 5% a 9% das receitas e a cobrar só daqui a 12, 15 ou 20 anos, depois de amortizados todos os custos do investimento. O resultado será uma ninharia sem qualquer impacto nas contas públicas. Em contrapartida, se houver algum percalço — fugas ou acidentes — cá estarão os mesmos parvos do costume para pagar a limpeza com os nossos impostos.
Parvos porque nos deixam entender que este petróleo está para Portugal como o vinho do Porto, sabendo que muita gente interpreta isto como uma sorte que vai pôr a gasolina ao preço da uva mijona. Nada disso. O petróleo, se o houver, pertencerá à italiana Eni (70%) e à Galp (30%) e o petróleo não tem pátria: entra no negócio internacional e vamos comprá-lo sempre nos mercados internacionais ao preço internacional. Não há petróleo caseiro como o vinho ou a chouriça.
O petróleo entra no negócio internacional e vamos comprá-lo sempre nos mercados internacionais ao preço internacional. Não há petróleo caseiro como o vinho ou a chouriça
Parvos porque, para pouca e incerta renda, põem em cheque as grandes, seguras e bem mais diversificadas indústrias do turismo e das pescas, e valores biológicos marinhos com grande potencial. E tudo isto em cima do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina e da própria Reserva Marinha.
E ainda nos tomam por parvos, dificultando informação e chegando ao ponto de ignorar a maior participação gerada por uma consulta pública em Portugal: 42 mil cartas a contestar este caso, contra apenas quatro cartas favoráveis.
Parvos também, porque o país investiu numa estratégia de energias renováveis com uma visão de futuro limpo e esperançoso, e deveria continuar por esse caminho para, aí sim, reduzir a sua dependência energética e tornar a economia mais verde e sustentável.
Todos sabemos que o petróleo vai continuar a ser preciso nos próximos anos para muitas outras coisas como plásticos e indústria farmacêutica, e não apenas para combustível de carros. Mas tão certo como isso, será a progressiva redução do seu consumo e, para este, serão utilizadas reservas já em exploração cuja extração é muito mais barata do que o petróleo do fundo do mar. Esta história da extração de petróleo em Portugal, por vezes, mais parece ser uma história de cotações de bolsa das respetivas empresas do que fonte primária de energia.
Não é, pois, preciso fazer mais perguntas do que aquelas que o Papa Francisco faz para perceber nas respostas gagas e nas não-respostas que qualquer coisa suspeita tomou por nós decisões erradas.
Acaba de ser lançada, e ainda bem, a Fundação Oceano Azul, mas com decisões destas corremos o risco de vir a ter uma ‘afundação’ no Oceano Preto.

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