segunda-feira, 6 de novembro de 2017

MAIS DINHEIRO PARA A CULTURA!



Em Portugal, como certamente em muitos países, continua a ser válida, infelizmente, a ideia de que a cultura não dá votos. Se fizermos um apelo á nossa memória, de certeza, não encontraremos a lembrança de qualquer (média) manifestação popular em defesa de um crescimento da despesa do Estado dedicada à cultura. Este tipo de reivindicações é sempre feito por sectores minoritários da nossa sociedade, onde se englobam agentes culturais diversos, mas com um reduzido poder de pressão sobre a forma com são geridos os dinheiros públicos. Como muito bem sabemos, estivéssemos nós perante poderosos agentes da finança e logo se desencantariam milhões, como que por milagre…
Não admira, pois, que uma manifestação que hoje estava marcada para Lisboa, tenha como principal reivindicação a ninharia de “1% para a cultura” no OE de 2018. Solidários com esta exigência, aqui deixamos a transcrição de um artigo de opinião assinado no “Público” de hoje por Luís Raposo, Presidente do ICOM Europa.
Está prevista para hoje uma manifestação em Lisboa que tem como uma das principais reivindicações o célebre “1% para a Cultura”. Trata-se de tomada de posição especialmente oportuna quando na Assembleia da República se inicia a discussão do OE para 2018. De tanto ter sido exigido no passado, em governos de todas as cores, começa a ouvir-se que se trata de mera utopia. Ou pior ainda: de mais uma forma de esbanjar dinheiro no curto prazo, sem pensar no futuro.
Nada de mais mistificador. No plano do histórico nacional importa recordar que chegámos durante os governos de António Guterres a estar somente a poucas décimas do objectivo acima indicado. Daí para cá recuámos tanto, tanto... que em vez de avançarmos para o 1%... recuámos para 0,2%, no caso do PIB, e 0,5%, no caso do OE.
Mas quando se fala tanto de Europa, será apropriado procurar a posição portuguesa nesse quadro. E para que nos não acusem de demagogia, será talvez útil estabelecer a comparação entre o que gastamos em Educação e em Cultura. Fizemos este exercício há quase dois anos nestas páginas (“Cultura: até que ponto mudar significa... mudar mesmo”, PÚBLICO de 8.12.2015), quando o actual Governo se começava a instalar, usando então dados de 2011. Actualizámo-los agora para os últimos que o Eurostat disponibiliza, referentes a 2015. O resultado continua a ser basicamente o mesmo... não tendo entretanto o Governo da chamada “geringonça” feito nada relevante, antes pelo contrário — no que se vai convertendo numa imensa desilusão de quem nele acreditou.
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O que nos diz, então, o Eurostat? Que em matéria de Educação nos situamos em posição muito interessante: 7.º lugar em relação ao PIB (6%), 11.º lugar em relação ao OE (12,4%). Em ambos os casos bastante acima da média da UE (que é de 4,9% e 10,3% do PIB e do OE para Educação). Ou seja, em matéria de gastos públicos com a Educação cumprimos muito razoavelmente a nossa obrigação. Exigir-se-ia mais? Talvez, mas objectivamente não temos com que nos envergonhar.
E quanto à Cultura, onde estamos? Em miserável penúltima posição, seja quanto ao PIB seja quanto ao OE. Atrás de nós só mesmo a Grécia. Aumentar a despesa da Cultura para 1% do OE significaria apenas atingir a média ponderada europeia, mas ainda assim com 18 países à nossa frente. Não se trata de “pedir a lua”, pois. E, de resto, o que ressalta das estatísticas é que o investimento em Cultura na UE não está mecanicamente relacionado com a riqueza de cada país, mas com a centralidade que, por causas diversas, a mesma ocupa no desígnio nacional. Os países bálticos são dos que mais investem em Cultura, por força da sua viva vontade de afirmação identitária. A Velha Albion, porventura por ser velha e estar em profunda crise, é uma das que menos investe agora em Cultura. Será este também o fado português?
Sim, talvez seja este o fado português, o de ser um país velho de quase nove séculos, sem vitalidade que lhe permita afirmar a centralidade da Cultura no seu projecto nacional. Será isto, pois. Não nos digam é que se trata de sequelas da troika e de mera falta de meios. E se a “geringonça” quiser realmente mudar, então nada pode justificar que, ainda nesta legislatura, não dê sinais claros de evoluir de 0,5% para 1% do OE para a Cultura. E que o mesmo valor, mas do PIB, não seja atingido em mais uma legislatura, no máximo.

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